Busca no site da UFMG

Nº 1522 - Ano 32
16.03.2006

A notícia no front de batalha

Dissertação da Letras examina as táticas da mídia na cobertura da Guerra do Iraque

Maíra Rodrigues

ma revista brasileira, em colisão com a tão propalada imparcialidade noticiosa, que se posiciona contra a invasão do Iraque, e uma revista norte-americana, sob pressões governamentais e populares, que se torna divulgadora e analista racional dos acontecimentos. Essas publicações e o papel por elas desenvolvido no conflito do Iraque são o tema da dissertação defendida no final de 2005, pelo jornalista e pesquisador Juliano Pires.

Em Uma guerra periódica: estratégias discursivas na construção da informação sobre o conflito no Iraque, o jornalista analisa as “manobras” adotadas pelas revistas Carta Capital e Newsweek na veiculação das reportagens do conflito. Segundo o autor da pesquisa, numa guerra é preciso mudar as estratégias de acordo com os acontecimentos. Insistir em táticas inadequadas pode arranhar a credibilidade da publicação e reduzir as vendas. Para Juliano Pires, apesar de priorizar focos diversos, as estratégias textuais utilizadas pelas revistas são muito parecidas, como a busca de legitimidade e a captação de seu público. “A principal diferença é o posicionamento dos periódicos em relação ao conflito”, afirma.

Segundo o jornalista, por meio da observação dos discursos construídos pelas publicações brasileira e norte-americana, é possível perceber que o papel desempenhado pelos periódicos no conflito no Iraque foi bastante distinto. “Carta Capital buscou descredibilizar a guerra e mostrar que ela era ilegítima, não passava de uma invasão”, diz Juliano Pires. Já a Newsweek, acrescenta o jornalista, encarou o conflito como uma guerra convencional, tentando transmitir uma idéia de imparcialidade. Além disso, a Newsweek “busca a admiração do leitor, colocando-se como parte da guerra, lutando pela verdade no campo de batalha, mesmo que isso acarretasse perigo ao seus repórteres”, afirma o jornalista.

De acordo Pires, nada fez a publicação brasileira alterar sua posição: do início ao fim do conflito, a Carta Capital manteve as críticas contra a guerra. Já a posição da Newsweek é mais oscilante: critica o conflito quando as armas de destruição em massa não são encontradas e volta a apoiá-lo com a prisão de Saddam Hussein. As notícias examinadas foram publicadas entre março de 2003, data de início da guerra, e junho de 2004, quando foram veiculadas as primeiras matérias sobre o escândalo das torturas de prisioneiros iraquianos em Abu Ghraib, no Iraque.

As escolhas
Segundo Juliano Pires, a Carta Capital foi escolhida por ser uma revista semanal nova, que se propõe a fazer um jornalismo crítico, deixando clara a sua posição sobre o conflito. A publicação norte-americana foi escolhida por ser considerada a principal revista de informação dos Estados Unidos.
Para o jornalista, as diferenças de atitude obervadas nas publicações são determinadas, principalmente, pelos objetivos dos periódicos e pelo contexto social em que estão inseridos. “A Carta Capital é uma revista nacional e não sofre a pressão do Estado e da sociedade. Já a Newsweek é pressionada por um governo e por um público favoráveis à guerra”, justifica Juliano Pires.

O autor da pesquisa destaca, ainda, que a visão da mídia como manipuladora dos acontecimentos é frágil, uma vez que sofre inúmeras restrições, como a concorrência. Essas limitações obrigam os periódicos a veicular todos os acontecimentos relevantes, deixando-os apenas com uma margem estratégica de manobras. O jornalista afirma que não buscou uma conclusão definitiva sobre a participação da mídia na Guerra do Iraque e espera despertar o interesse por novas investigações. “O jornalismo não é feito só por um lado, tem que haver uma interatividade. E esse relacionamento não é oculto, o tempo todo ele está à mostra”, conclui Juliano.


Dissertação: Uma guerra periódica: estratégias discursivas na construção da informação sobre o conflito no Iraque
Autor: Juliano Pires
Defesa: novembro de 2005
Orientador: Renato de Mello