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Nº 1588 - Ano 34
30.10.2007
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Itamar Rigueira Jr.
O problema é o seguinte: em 2030, serão 9 bilhões de habitantes num mundo cada vez mais urbano – este ano, a população das cidades superou pela primeira vez a das áreas rurais do planeta. O que propõem os estudantes de arquitetura e urbanismo espalhados pelos cinco continentes para tornar as cidades habitáveis?
A questão foi posta pela International Federation for Housing and Planning (IFHP), uma das entidades mais respeitadas do mundo na área de arquitetura e urbanismo, em concurso para estudantes. Cinco alunos da Escola de Arquitetura da UFMG apresentaram sua proposta de solução. O objeto do trabalho foi a ocupação de encostas, onde se formam as favelas, fenômeno comum no Brasil e em diversos outros países. Eles imaginaram uma forma de transformar esse tipo de assentamento a partir de seus próprios problemas, criando maior número de residências e, ao mesmo tempo, mais áreas verdes e espaços públicos. E mais: a favela do futuro seria melhor servida por transporte urbano e produziria alimentos, energia e empregos.
Resultado: Bernardo Araujo, Éder Andrés, Isabel Brant, Mateus Andreatta e Thiago Campos, orientados pela professora Maria Lúcia Malard, foram finalistas do concurso. Eles estiveram no congresso da IFHP em Copenhague, na Dinamarca, em setembro, e receberam menção honrosa da entidade pelo projeto Uma microcomunidade resolvendo problemas globais. O objeto do estudo foi o Aglomerado da Serra, comunidade de 50 mil habitantes na região centro-sul de Belo Horizonte.
De acordo com Isabel Brant, do 8º período, a favela foi escolhida porque é um ambiente com enorme quantidade de problemas. “Se é possível resolver as questões das favelas, que já são caóticas e têm tudo que se imagina para os grandes aglomerados do futuro, será mais fácil atuar em outros tipos de povoamento”, afirma.
“Nossa idéia é viável”, garante Bernardo Araujo, colega de turma de Isabel. O projeto baseia-se apenas em tecnologias existentes. Sua concretização, na opinião dos estudantes, não é ímpossível. “Depende de vontade política e do entendimento de diversos agentes da sociedade”, receita Bernardo.
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Maquetes do projeto Uma microcomunidade resolvendo problemas globais |
Os estudantes resolveram seguir à risca a ênfase dada pelo concurso à questão do aumento populacional. No caso de Belo Horizonte, as projeções apontam 1 milhão de habitantes a mais em 20 anos – a população atual beira 2,5 milhões de pessoas. “Acompanhamos essa tendência e tratamos do que já existe, locais já habitados e que vão crescer inevitavelmente”, explica Thiago Campos, aluno do 9º período.
O projeto pretende reunir qualidades da habitação horizontal e da vertical, além de aproveitar as características das encostas. Os alunos planejaram a implantação de três tipos de construção, em metal ou concreto (ou ambos, sempre dependendo do custo). A primeira delas, destinada às moradias, ganhou o apelido de “grelha de habitação”.
Essa estrutura acompanha a inclinação do morro e cria vilas suspensas que, por sua vez, dão origem ao que a equipe chama de “lotes aéreos”, onde seriam construídas as casas. A ocupação das vilas seria ordenada e uma parcela significativa desses lotes, composta de praças, espaços gramados, quadras esportivas e outros locais de convivência social e cultural. Ali poderiam ser instalados também edifícios públicos como postos de saúde e delegacias de polícia.
“O projeto estimula a vida coletiva e se inspira em uma das grandes qualidades dessas ocupações, o sentimento de identidade entre os moradores, que se alia à vocação para a vida em grupo e a solidariedade”, conta Isabel. A estrutura da grelha seria dotada de poderosos sistemas de coleta e reutilização de água da chuva, geração de energia solar e reciclagem de lixo, além de garantir a circulação de ar e entrada de luz, através dos lotes sem construção destinados ao lazer e à convivência.
O segundo tipo de construção previsto pelo projeto seria a base de uma nova estrutura de transporte no Aglomerado. Ali ficaria a estação central de bondinhos para servir os moradores internamente, ligando as partes altas da favela e o sistema de integração ao metrô. Esse prédio, igualmente capaz de aproveitar a energia do sol e captar água para reciclagem, também teria função comercial, centralizando o funcionamento de lojas e outros serviços nem sempre encontrados nas favelas.
O Aglomerado que emerge da prancheta dos estudantes da UFMG também reserva espaço para a produção de alimentos. O projeto propõe prédios verticais que concentrariam a atividade, tendo a suinocultura como carro-chefe e a geração de energia (biogás) como subproduto. A produção de derivados de suínos já existe nesse tipo de ocupação urbana, mas é dispersa e ineficiente. “O produto ficaria mais acessível ao consumidor final e empregos seriam criados dentro da própria comunidade”, explica Thiago Campos.
Em seu modelo de favela do futuro, os jovens da UFMG sugerem sistemas de produção de energia – de várias fontes e não-agressiva – que gerariam excedentes, transformando a comunidade em vendedora de energia. A nova realidade aproximaria o aglomerado da sustentabilidade, além de ajudar na incorporação harmoniosa da favela à vida da cidade.
A professora Maria Lúcia Malard, orientadora dos estudantes, exalta o pragmatismo do trabalho. “A idéia contempla a necessidade de uma ocupação racional, que melhore as condições de habitação do local sem deslocar as populações”, diz Maria Lúcia. Ela recomenda que as soluções do projeto sejam implantadas a partir da formação de cooperativas de moradores, talvez com apoio do poder público.
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Estudantes estiveram em Copenhague, onde apresentaram soluções para as vilas da Serra |
Bernardo, Éder, Isabel, Mateus e Thiago receberam a menção honrosa nos dias 24 e 25 de setembro, em Copenhague, capital da Dinamarca. O concurso promovido pela International Federation for Housing and Planning (IFHP) – organização criada em 1913 pelo arquiteto e urbanista inglês Ebenezer Howard, que criou o conceito de cidade-jardim – é um dos mais importantes em âmbito mundial. A edição de 2007 fez parte do 51º congresso da organização e recebeu a inscrição de 193 equipes de todo o mundo.
Os Futuros da Cidade foi o tema do concurso, que pretendia estimular a discussão em torno de possíveis soluções. As propostas e intervenções tinham total liberdade de espaços, escalas e públicos e precisavam atender a pelo menos uma das quatro categorias propostas: planejamento urbano, qualidade urbana, edificação e habitação. Submetidas a um júri internacional, 11 equipes foram escolhidas como finalistas e convidadas a participar do congresso de estudantes e da cerimônia de premiação.
O júri destacou que um dos méritos do projeto mineiro foi a abordagem do desenvolvimento urbano das favelas, áreas comuns em grandes cidades do mundo inteiro, levando em conta o estado precário em que essas populações vivem atualmente. O adensamento aliado a novas possibilidades de lazer e produção foi também mencionado, além da apresentação clara e organizada. O trabalho foi desenvolvido no âmbito da disciplina optativa Tópicos em Projeto, ministrada pela professora Maria Lúcia Malard.