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Nº 1610 - Ano 34
16.05.2008

Patrimônio do paladar

Queijo artesanal de Minas deverá ser o primeiro bem de natureza imaterial do Estado registrado no Iphan


Foca Lisboa
Newton
José Newton Meneses: queijo artesanal é mais rico do ponto de vista nutricional

Feira de Caruaru, acarajé das baianas, samba do Rio e frevo são alguns dos doze bens de patrimônio imaterial já registrados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A lista está ganhando novo integrante: o queijo artesanal de Minas. O queijo foi estudado pelo historiador e professor da Escola de Veterinária da UFMG, José Newton Coelho Meneses, contratado para elaborar um dossiê interpretativo que compõe o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) do Iphan, a partir do qual é feita a avaliação dos pedidos de registro de bens de patrimônio de natureza imaterial.

A elaboração do dossiê interpretativo sobre o queijo artesanal de Minas durou dois anos. O professor visitou as regiões do Serro, Canastra e Alto Paranaíba, que se destacam na produção da iguaria. Em todo o Estado, há cerca de 25 mil produtores. “Cada região possui sua tipologia específica de produção do queijo, mas há características comuns que permitem identificar um modo de fazer queijo artesanal”, explica. De acordo com Meneses, outras regiões podem ser incorporadas ao dossiê, à medida que forem feitos levantamentos técnicos que constatem a prática desse modo de fazer queijo. A Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater/MG) já concluiu a pesquisa em Araxá, no Alto Paranaíba, que deverá ser incluída no registro do Iphan. A produção do Sul e Norte de Minas também está sendo estudada pela Emater.

O modo de fazer queijo artesanal tem origem na colonização portuguesa. O produto possui características específicas de cor, consistência, gosto e conteúdo de bactérias lácteas. É preparado com leite cru, diferentemente do método industrial, que utiliza processos mecanizados de produção, além de pasteurizar o leite e matar todas as bactérias. O queijo artesanal é mais rico do ponto de vista nutricional, porque é um produto vivo, que mantém a reprodução das bactérias, chamada de maturação ou “cura”. “Um produto artesanal que aumenta sua composição nutricional a cada dia é melhor que o industrial, pasteurizado e cheio de conservantes”, destaca Meneses.

A produção com leite cru chegou a ser condenada pelo Ministério da Agricultura por questões de segurança alimentar. Entretanto, o professor da Veterinária assegura que não há riscos se o gado for vacinado contra a tuberculose e brucelose e se a fonte de água utilizada na produção do queijo for de boa qualidade.

Identidade

O queijo artesanal de Minas deverá ser o primeiro bem de natureza imaterial do Estado registrado pelo Iphan. O modo de fazer queijo é reconhecido pelo Instituto Estadual de Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) desde 2002, quando a Associação de Produtores Artesanais do Queijo do Serro (Apaqs) solicitou o registro no órgão do Estado. O pedido de reconhecimento nacional é de autoria do Iepha. Após o aval do conselho consultivo do Iphan, a homolocação é feita pelo ministro da Cultura, Gilberto Gil.

O registro nacional do modo artesanal de fazer queijo gera o reconhecimento do bem como elemento identitário da cultura mineira e brasileira. “Quem produz se sente orgulhoso do ofício e preserva o modo de fazer”, completa Meneses. Hoje, o queijo é bastante consumido nas regiões produtoras e em Belo Horizonte. Após o registro, a tendência é que o mercado consumidor se amplie e se torne cada vez mais exigente quanto à qualidade do produto. "Para assegurar a autenticidade do queijo artesanal, há associações de produtores que já pensam em adquirir o selo de Denominação de Origem Controlada (DOC), usado nos vinhos e nos queijos italianos”, conta o professor.

A presença do queijo na cultura mineira vai além do amplo consumo. Há uma série de produtos derivados do queijo, como o pão de queijo, e também modos de falar que resgatam a força identitária do produto. É o caso da expressão “um abraço, um beijo e um pedaço de queijo”. Esses aspectos foram considerados na pesquisa feita pelo professor José Newton Meneses.

Após o registro do bem de natureza imaterial no Iphan, um kit – composto de livro e documentário – será distribuído gratuitamente a bibliotecas de todo o país, com o objetivo de promover o reconhecimento público do queijo como elemento identitário. Como os modos de fazer são dinâmicos, a cada dez anos o registro dos bens imateriais é revisto, para verificar se continua sendo preservado pelas comunidades guardiãs da tradição.

Passo-a-passo da fabricação do queijo