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Nº 1644 - Ano 35
16.3.2009

Gestão para a solidariedade

Engenharia de Produção oferece técnicas que dão suporte
a unidade de reciclagem de plástico pertencente a
cooperativa de catadores

Sílvia Amélia

Filipe Chaves
Francisco
Francisco Lima: processos mais eficientes

Uma aparente contradição caracteriza a Unidade Industrial de Processamento de Plástico, na região de Venda Nova, em Belo Horizonte. Ao contrário das outras fábricas que buscam matéria-prima a custos baixos, esta unidade se desdobra para desembolsar o maior preço possível pelo material reciclável coletado na região metropolitana e municípios vizinhos. Essa “anti-indústria” é a face mais vistosa do trabalho da Cataunidos, cooperativa formada por nove associações que reúnem mais de 500 catadores de material reciclável.

A gestão da fábrica é apoiada pelos conhecimentos técnicos de um grupo de alunos coordenado pelo professor Francisco de Paula Lima, do Departamento de Engenharia de Produção da UFMG. Em conjunto com os catadores, a equipe elabora soluções para os problemas enfrentados tanto na fábrica quanto nas associações que recolhem os materiais. Projeto técnico, leiaute, logística, comercialização e capacitação dos catadores já foram implantados com o suporte da UFMG. Está em andamento a elaboração de um programa de controle de produção, de projeto de um posto de triagem e de plano de logística da coleta do material pelas associações.

Em vez de pagar R$ 0,65, em média, por quilo de plástico – preço praticado por intermediários –, a fábrica da Cataunidos compra os materiais por valores que variam de R$ 0,80 a R$ 1,50, dependendo do tipo de plástico. O mais barato é o PET (usado em garrafas de refrigerante) e o mais caro é o PP (empregado em garrafas de água mineral). A fábrica vende o plástico limpo e moído e também o ‘estrudado’ – aquecido e transformado em pellet, material com aparência de espaguete. O quilo do primeiro custa, em média, R$ 2 e o do segundo, R$ 3.

Em contrapartida, os catadores foram treinados para entregar o material limpo, sem rótulos e tampinhas e separado por cores, o que facilita o trabalho na fábrica. “Parece simples, mas não é. Às vezes, é preciso designar alguém só para essa tarefa, o que, numa associação pequena, pesa bastante”, exemplifica Francisco Lima. “O nosso objetivo é entrar com engenharia e gestão para melhorar a eficiência dos projetos. Juntamos a técnica com a solidariedade”, sentencia o professor. Com exceção da Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Material Reciclável (Asmare), em que cada catador ganha pelo que recolhe, as demais associações trabalham segundo uma lógica diferente. O montante é dividido por todos, independentemente do volume coletado individualmente, permitindo a inclusão, no rateio, de grávidas e pessoas idosas e com deficiência.

Segundo Fabiana Goulart, psicóloga e mestranda em Engenharia de Produção, as ações são planejadas em conjunto. “Nosso grupo se adequa às demandas dos catadores. Percebemos que eles estão cansados de pesquisas, das pessoas que vão lá e se portam como se detivessem todo o saber. Vamos lá para ouvir, entender e pensar junto”, afirma Fabiana, para quem as associações menores foram as que mais se beneficiaram com a criação da Cataunidos. “Algumas dobraram seu faturamento, pois não tinham condições de pressionar o mercado e vendiam para um único atravessador”, argumenta.

Um dos grupos beneficiados pelo trabalho da UFMG é a Coopert, associação dos catadores de Itaúna, município localizado a 76 quilômetros da capital mineira. Segundo a sua coordenadora, Madalena Rodrigues, um novo galpão, projetado pela equipe da Engenharia de Produção, começará a ser construído no mês que vem. “A capacitação dada por eles acrescentou muito, aprendi bastante, vi que a triagem feita por nós não era suficiente”, afirma Madalena.

Eficiência

A equipe do professor Francisco Lima percebeu, por exemplo, que os funcionários da fábrica desligavam a máquina de moagem para ajudarem a descarregar o caminhão. Além disso, as lâminas perdiam a afiação devido à sujeira do material. Hoje, a máquina funciona sem parar durante um turno. Os alunos também criaram uma etiqueta para identificar o peso e a procedência do material que chega à fábrica. O procedimento ajuda no controle da quantidade de rejeitos, permitindo que eles entrem mais limpos. “Agora descontamos da associação que manda mais de 5% do material com rejeitos. Sem o sistema, não teríamos como fazer esse controle”, comenta o administrador da fábrica, Vinícius Leite Chucre.

Embora pague um preço acima do mercado pelo material que adquire, a unidade industrial da Cataunidos planeja se estruturar para ter lucro – hoje, a receita garante apenas a sua manutenção. Com isso, ela espera ter sobra de recursos para distribuir diretamente entre os catadores e financiar projetos sociais das associações. A iniciativa é apoiada pela Petrobras, Fundação Banco do Brasil e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).