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Nº 1729 - Ano 37
10.03.2011

opiniao

A GENTE não quer só COMIDA

Maurício José Laguardia Campomori* e Seme Gebara Neto**

Uma estrutura formada por três pontos de apoio pode ser utilizada como ilustração de um equilíbrio perfeito. O motivo é que quaisquer três pontos não alinhados estão em um mesmo plano, o que em outras palavras significa estabilidade. Mas a estabilidade necessita de sustentação. Se um tripé é suporte de uma câmera, apoiado em superfície escorregadia, precisa de borrachinhas a encaparem seus pés, para que não deslizem. E não fossem as travessas amarrando as três pernas de um banquinho, ele se desmontaria imediatamente sob o peso de qualquer um de nós.

A tríade que sustenta a Universidade contemporânea – ensino, pesquisa e extensão – é tão consolidada e estável que é possível que muitos de nós não nos preocupemos em refletir sobre sua sustentação. Na UFMG, assim como em algumas outras universidades brasileiras, a formação acadêmica dos estudantes é de excelência. Mas quais elementos complementam e dão apoio a essa excelência? O que a universidade provê aos seus discentes, que extrapole a técnica, mas que seja considerado igualmente fundamental para que sua formação como ser humano e como cidadão esteja mais próxima de uma formação completa?

Acreditamos que a assistência estudantil e a cultura são peças de sustentação desse tripé. É certo que a garantia de condições de permanência permite que certo grupo de estudantes tenha tranquilidade para buscar sua formação plena. Mas permanece ainda a pergunta: é suficiente? Quais programas devem complementar os básicos, como os de moradia, alimentação, transporte e assistência à saúde?

Nas ações culturais residem respostas, independentemente do contexto. Faz parte do instinto humano a procura de significados para suas ações. A possibilidade de interagir com outras pessoas, assistindo a bandas, grupos de teatro e dança, visitando exposições, lendo, ouvindo histórias, traz à nossa vida um diferencial. Oficinas como as organizadas pelos festivais de Inverno e de Verão da UFMG, mostras e espetáculos, como os que vemos no Conservatório e no Centro Cultural UFMG, oferecem à comunidade universitária cores e tons indispensáveis à sua constituição como grupo em estágio de evolução superior ao do Homo lattes.

O que se tem tentado na UFMG é consolidar a percepção de que, além das tarefas tradicionais da educação formal, a Universidade pode e deve desempenhar papel de formação para a vida de seus alunos e da cidade, através da articulação mais intensa e efetiva da educação com a cultura, da ciência com a arte, do inteligível com o sensível. Se fosse possível resumir, diríamos que a ideia é dar sentido ao conhecimento. Assim, torna-se fundamental para a Universidade superar a imagem de instituição que historicamente apenas fala para a sociedade, passando também a ouvir e aprender com as mais diversas experiências, competências e sensibilidades externas. Em jogo, a possibilidade de interação com o mundo e com as pessoas, a capacidade de fazer sentido em sua vida.

A assistência estudantil brasileira, por sua vez, reconhece há tempos o valor da inclusão cultural em suas ações. Em 2001, quando da apresentação, pelo Fórum de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace), do documento de diretrizes, que posteriormente seria publicado pela Andifes, já havia sido realizada uma pesquisa (1997) sobre o perfil socioeconômico e cultural das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes). No momento de sua publicação, em 2007, existia outra coleta de dados (2004) completada. Nos questionários, perguntas sobre diversas manifestações culturais, como envolvimento com questões políticas, prática de esportes, lazer, leitura de livros e jornais, ecologia, religião, movimentos sociais, atividades artísticas e sociedades científicas.

E o documento conclui ser fundamental que as universidades propiciem aos seus estudantes oportunidades de vivência cultural. O Programa Nacional de Assistência Estudantil, que financia quase todas as ações do gênero nas Ifes, indica expressamente a cultura como uma das áreas em que deve haver investimento. A palavra “deve” é uma interpretação nossa, dado que princípios do Programa como “democratizar as condições de permanência dos jovens na educação superior pública federal”, “minimizar os efeitos das desigualdades sociais e regionais na permanência e conclusão da educação superior” e “considerar a necessidade de viabilizar igualdade de oportunidades” seriam inatingíveis sem iniciativas na área cultural.

Voltando à metáfora do banquinho com três pontos de apoio, que a UFMG sempre teve o cuidado de manter muito bem equilibrado, vale a pena informar que agora ele pode ficar ainda mais firme. É que para 2011, providenciamos outro reforço: o Quarta Doze e Trinta, programa que existe há 30 anos e alimenta o horário do almoço com diversão e arte, é agora uma parceria entre as áreas cultural e estudantil da nossa Universidade.

*Professor do Departamento de Projetos da Escola de Arquitetura e Diretor de Ação Cultural (DAC) da UFMG

**Professor do Departamento de Matemática do ICEx e presidente da Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump)

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