De inquietações e sonhos

Ricardo Takahashi*

Esta edição do BOLETIM circula no momento de se dar as boas-vindas aos novos estudantes, calouros de todos os cursos, que chegam interessados em conhecer esta Universidade, o que ela oferece e como se deve proceder para tirar o máximo proveito dos próximos anos que aqui serão vividos. Dirigimos algumas palavras a você, calouro, e aos que aqui já se encontram há algum tempo, mas não exatamente para trazer respostas a essas inquietações: queremos antes plantar perguntas – prováveis sementes de escolhas autônomas e pessoalmente significativas – que trazer informações minuciosas.

Nosso assunto são as escolhas. Falemos primeiro das escolhas individuais – aquelas que precisam existir para que o caminho percorrido expresse o que somos, dando sentido à noção de liberdade.

A sua escolha de vir para a UFMG certamente foi motivada pelo grande reconhecimento que nossa instituição tem na sociedade. Nesta Universidade de classe internacional, você já sabe que pode ter a expectativa de adquirir uma forte empregabilidade, podendo se candidatar aos melhores postos de trabalho no país e no exterior. Você também já ouviu falar que aqui se pode optar por uma carreira acadêmico-científica iniciada em laboratórios que desenvolvem pesquisas nas fronteiras do conhecimento, ou pode aprender a construir e a gerir o seu próprio negócio. Certamente você não tem dúvidas quanto ao fato de que a concretização dessas expectativas, aqui tornadas possíveis, depende essencialmente de seu esforço e de sua perseverança no decorrer dos próximos anos.

A primeira dúvida que queremos lançar neste momento é: será que basta assistir a todas as aulas, estudar para as provas, tirar boas notas? Por mais evidente que seja essa necessidade, será que a isso se resume a preparação dos futuros cientistas que mudarão o rumo de seus campos do conhecimento, ou dos futuros empresários cujas empresas inovadoras criarão novos mercados, ou ainda dos futuros profissionais, de todos os saberes, que serão capazes de compreender a disfuncionalidade sempre existente nas técnicas atuais de abordagem dos problemas de nossa sociedade, ousando então inventar os procedimentos e as técnicas que farão parte do repertório das profissões na sociedade de amanhã?

A UFMG lhe oferece, sim, a opção de passar os próximos anos apenas dentro das salas de aula. Ao fim, não se preocupe: você sairá um profissional capacitado a executar as tarefas-padrão de sua profissão. Mas exatamente por acreditar que isso é insuficiente numa trajetória acadêmica, a UFMG proporciona a opção de uma aprendizagem vinculada à pesquisa: acompanhando o nascimento do conhecimento novo, o estudante pode compreender suas condições de geração, tornando-se capaz de entender suas limitações, para então expandi-lo. A Universidade também favorece o aprendizado ligado à extensão: é no confronto com os problemas do mundo real que se constrói o significado de todo o saber e se desenvolve a sensibilidade para as questões urgentes da nossa realidade social. Por fim, ainda lhe possibilita o aprendizado na própria atividade de ensino: o estudante que auxilia o professor na transmissão do conhecimento às turmas posteriores tem acesso a uma perspectiva mais ampla e aprofundada sobre esse conhecimento, algo que somente se consegue talhar na interação com o outro.

Outras dúvidas também são tão preciosas quanto recorrentes. Será que basta morar e viver em Minas Gerais e para sempre aqui ficar? Ou um tempo de estudo e vivência com outras culturas, conhecendo outros povos e outras línguas, não será fundamental até para refletir sobre nós mesmos?

Será que basta o treinamento em uma profissão de nível superior para prover os meios intelectuais para alguém se situar e se movimentar na cultura contemporânea e na sociedade em transformação? Ou o acesso a uma cidadania cultural plena estaria reservado àqueles que buscaram se formar considerando também conteúdos transversais às áreas do conhecimento? Será que basta o diploma de graduação para concluir toda a formação necessária para alguém exercer sua profissão vida afora? Ou será às vezes conveniente, ou mesmo necessária, uma formação em nível de pós-graduação? É possível já planejar, desde o início de um curso de graduação, uma trajetória orientada para a obtenção de uma pós-graduação?

Essas são perguntas que a UFMG o estimula a responder na escolha do seu caminho.

Além das opções individuais, as grandes escolhas seguem sendo aquelas forjadas no debate das questões fundamentais do país e da humanidade, em que cidadãos livres optam pelo tipo de sociedade na qual querem viver, afirmando essa escolha nas atitudes que decidem adotar. Questões que constituem a pauta da construção de uma sociedade igualitária têm de fazer parte da agenda de uma Universidade. Aqui e agora, são desafios cuidar dos direitos humanos, da igualdade étnico-racial, da igualdade de gênero, assim como combater toda intolerância e preconceito. A adesão a esses valores é uma escolha de cada um – às vezes difícil, na medida em que envolve deixar para trás velhas crenças, trazidas do berço, para abraçar a ideia de um mundo novo, até aqui apenas esboçado.

Esperamos que sua passagem pela UFMG lhe proporcione a oportunidade de querer se posicionar nesse debate – assim exercitando a modalidade de liberdade reservada somente àqueles que optam por assumir o protagonismo da história.

Aqui nos importa dizer que, acima de tudo, cabe à UFMG garantir que cada um possa fazer suas escolhas, provendo as opções compatíveis com o tamanho do sonho de cada um. Fica o convite para você ­sonhar além.

*Pró-reitor de Graduação da UFMG