O direito à luta social: movimento estudantil e democracia
No Dia do Estudante, Rádio UFMG Educativa lança reportagem especial sobre a relação do grupo com o campo democrático
Por Ruleandson do Carmo
O movimento estudantil brasileiro é, historicamente, um espaço de formação política e cidadania. Ao longo das décadas, estudantes estiveram na linha de frente de lutas sociais e democráticas, enfrentando regimes autoritários, denunciando atos de repressões e reivindicando direitos. Das manifestações contra a ditadura militar às pautas atuais por mais investimentos em educação, essa mobilização segue sendo parte essencial da história política do país.
A trajetória do advogado aposentado José Afonso Alencar, que iniciou sua militância na UFMG, em 1963, um ano antes do golpe militar, se confunde com a própria história dessa luta. A data de 11 de agosto, Dia do Estudante, também remete à origem de entidades históricas como a União Nacional dos Estudantes (UNE), protagonista em diversos momentos de resistência.
Ditadura e luta estudantil
A UNE, criada em 1937, ganhou centralidade durante a ditadura militar, quando sua sede no Rio de Janeiro foi incendiada logo no primeiro dia do golpe. “O movimento estudantil já denunciava forças que ameaçavam o golpe”, relembra Sara Puerta, assessora de comunicação da entidade. Lançada na ilegalidade, a UNE seguiu atuando de forma clandestina, organizando protestos, debates e mobilizações. Muitos estudantes foram presos, torturados ou mortos por defender liberdade de expressão e eleições diretas.
José Afonso Alencar, então presidente do Centro Acadêmico Afonso Pena, foi um desses presos políticos. “Apanhei muito, saí bem machucado”, relata, relembrando os 90 dias de isolamento e agressões. Para a pesquisadora da Universidade Estadual de Ponta Grossa Aldimara Boutin, não há como separar democracia e participação estudantil: “Dentro dos grêmios estudantis, os alunos vivenciam experiências democráticas. Eles elegem representantes, expressam suas opiniões e garantem que suas demandas sejam ouvidas.”
O movimento também busca reparação histórica. Caso emblemático foi a reconstrução da sede da UNE, projetada por Oscar Niemeyer, com espaços de memória e cultura. Para Aldimara, essa reparação vai além das indenizações: “É preciso preservar a memória dos que lutaram pela democracia e garantir que novas gerações conheçam essa história.”
Críticas e movimento estudantil hoje
Atualmente, o movimento estudantil segue mobilizado por políticas públicas que ampliem o acesso e a permanência nos estudos, defendendo mais investimentos em educação e a destinação de 10% do PIB ao setor. “Democracia nas universidades e participação dos estudantes na construção dessas instituições” também estão entre as principais pautas, aponta Sara Puerta.
Apesar de sua importância histórica, parte da sociedade trata o movimento como desocupação. Aldimara contesta: “Longe de serem meros passatempos, essas atividades exigem dedicação, capacidade de organização, argumentação e negociação. São habilidades que complementam a formação acadêmica e preparam para a vida em sociedade.”
Para a pesquisadora, a história da educação e do país mostra que o movimento estudantil foi decisivo em avanços como o acesso de mais pessoas ao ensino superior e políticas públicas inclusivas. Em tempos de ameaças à soberania e de discursos contrários aos direitos humanos, a memória das lutas passadas serve de lição: esses estudantes deram a cara limpa ou pintada a tapas por um bem maior, pagando às vezes com a vida e seguindo em frente, mesmo com a ingratidão e a represália. Mesmo diante de um contexto sem inimigos armados, como à época da ditadura militar, pessoas estudantes ainda lotam as ruas em defesa dos direitos trabalhistas, estudantis, sociais e humanos, compondo, muitas vezes, a maioria das pessoas presentes nas mais recentes manifestações por justiça social no Brasil.
Reportagem em áudio
A Rádio UFMG Educativa publica a reportagem completa, produzida pelo jornalista Ruleandson do Carmo e com sonoplastia de Cláudio Zazá, em áudio, nas principais plataformas sonoras, como Spotify e SoundCloud.
Ficha técnica
Produção e reportagem: Ruleandson do Carmo
Edição de texto e de conteúdo: Ruleandson do Carmo
Sonoplastia e edição de áudio: Cláudio Zazá
Pessoas entrevistadas: Sara Puerta (UNE), José Afonso Alencar (aposentado), Aldimara Boutin (UEPG)
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