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Nº 1387 - Ano 29 - 13.03.2003

 

 

Campus Pampulha: espaço vivo ou caduco?

Eduardo Fajardo Soares*
 

A questão do Plano Diretor do campus Pampulha está na ordem
do dia. Não só por causa das exigências impostas pelo cotidiano da Cidade Universitária, como pela discussão, no âmbito do Conselho Universitário, da proposta em estudo pela Reitoria. O assunto foi, inclusive, tema de entrevista concedida a este BOLETIM pela coordenadora do projeto e publicada na edição de 16 de janeiro último.

Como profissinal da área de planejamento físico da UFMG e representante dos servidores técnicos e administrativos no Conselho Universitário, não poderia furtar-me de tecer alguns comentários sobre tal proposta e seu processo de planejamento.

Lamento que assunto de tamanho interesse público ainda esteja confinado à semiclandestinidade, pois não se tem notícia de que o projeto tenha sido apresentado ou debatido com a comunidade diretamente interessada, nem mesmo com suas entidades representativas.

Obviamente, a principal conseqüência dessa ausência de interlocução com a comunidade é a inexistência de uma análise crítica e histórica do planejamento físico da Cidade Universitária, desde os seus primórdios. Como o território universitário deve se estruturar fisicamente e qual resultado espacial essa estrutura deve favorecer, incrementar e produzir?

1) Um espaço plural, efervescente, capaz de estimular sua ocupação. Ou seja, um espaço vivo e, conseqüentemente, seguro.

2) Um espaço limitado às atividades acadêmicas, uma redoma do saber, que não estimule sua plena e variada ocupação. Enfim, um espaço morto, caduco e, por isso mesmo, inseguro.

É evidente que as dimensões do campus Pampulha são equivalentes ou superiores à maioria das cidades de médio porte do país. Tanto que a primeira denominação do campus é Cidade Universitária. Até por isso, esse território deveria concentrar todos os equipamentos e instalações necessários não apenas às atividades didático-científicas, mas também àquelas que estimulam o convívio social. Além das salas de aula, auditórios, anfiteatro e laboratórios, o campus deveria abrigar serviços de moradia, lazer, cultura e comércio, de modo a romper com a indesejável homogeneidade.

No final de 2000, um jornal de Belo Horizonte publicou o artigo Campus UFMG, um lugar caduco, escrito por uma profissional da área de arquitetura e urbanismo. No texto, a autora defendia a tese de que o campus Pampulha representava um modelo falido e condenado ao fracasso enquanto lugar onde pudessem ser desenvolvidas as relações didáticas, científicas, humanas e profissionais. Isso porque ele foi projetado para existir isolado da cidade e de sua população.

Embora concordasse com boa parte de suas considerações, encaminhei ao mesmo jornal um artigo - felizmente publicado logo depois - em que divergia de dois pontos fundamentais da análise feita pela arquiteta.

1- É verdade que os campi universitários, principalmente os criados na Era Vargas e durante o regime militar, foram concebidos para funcionarem afastados da concentração urbana, para que não fossem influenciados pela "pulsação social". Mas o "tiro saiu pela culatra": com o crescimento das cidades, os campi foram logo envolvidos pela malha urbana e obrigados a interagir com a população. Além disso, a atividade de Extensão forçou a efetiva abertura dos campi para as cidades.

2- Além das ofertas de cursos e das atividades de atendimentos social, psicológico e médico, tipicamente extensionistas, os campi passaram informalmente a abrigar outras atividades afinadas com a diversidade: moradias universitárias, comércio, serviços, bares, restaurantes, museus, áreas de lazer, espaços para eventos culturais e esportivos, cineclubes e até sedes de entidades sindicais e de assistência aos segmentos da comunidade universitária.

O campus Pampulha, apesar de medidas conservadoras que excluíram de seu território equipamentos como a Moradia Universitária, também foi afetado pela heterogeneidade do cotidiano urbano. Ele abrigou, inclusive, um dos mais importantes eventos musicais e artísticos da universidade brasileira, o "saudoso" Rosas de Abril. Graças ao Rosas, as comunidades _ interna e externa _ deleitaram-se com memoráveis apresentações dos grupos Corpo e Galpão e shows de Paulinho da Viola, Alceu Valença e MPB-4, no gramado em frente à Reitoria.

Diante dessa exposição, gostaria de finalizar com a seguinte reflexão: está em discussão um plano diretor para o campus, que não aborda nenhuma das questões aqui levantadas, como a importância de abri-lo para a sociedade. Sua maior novidade reside na cobrança de taxas de estacionamentos. A proposta simplesmente não contempla boa parte de nossos problemas e, principalmente, não se dá conta de que vivemos num cenário de insegurança e violência e não numa "ilha de sossego", como algumas pessoas ainda querem crer.


* Arquiteto do DPFO/DM e representante dos técnicos e administrativos no Conselho Universitário