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Nš 1493 - Ano 31
28.07.2005



Memórias de JK e dos bailes de Curralinho

Alunos de teatro visitam lugarejo na região de Diamantina freqüentado pelo presidente

Carlos Jáuregui

fama de "pé de valsa" de Juscelino Kubitschek é conhecida por todos. Idealizador e freqüentador da Casa do Baile, em Belo Horizonte, e das serestas de Diamantina, o ex-presidente era presença constante nos bailes de sua época. Entretanto, outro salão freqüentado por JK e quase esquecido na história foi a pensão do João Francisco, em Extração, distrito de Diamantina. Mais conhecido como Curralinho, o povoado, de poucas casas com paredes avermelhadas pela terra, já foi um movimentado ponto comercial e garimpeiro, além de pouso para tropeiros que viajavam pelo Vale do Jequitinhonha.

Na última quarta-feira, 27, um grupo de alunos-atores do curso de teatro da UFMG viajou até Curralinho para passar uma manhã junto à comunidade local e reviver as lembranças dos bailes dos anos 40 e 50. Os estudantes estavam em Diamantina para se apresentar no Festival de Inverno com o espetáculo Hoje tem baile, montagem teatral resultante de uma pesquisa sobre o tema.
Eduardo Fonseca

João, Merino e Maria das Mercês: histórias de outros tempos

"Ficamos sabendo dos bailes que aconteciam em Curralinho e tivemos a idéia de conhecer essas histórias", explica Bya Braga, diretora do espetáculo e professora da Escola de Belas-Artes. "Como o Festival tem por tema os diálogos possíveis, quis promover para os alunos-atores alguns contatos para além da simples apresentação nesse lugar onde realmente acontecia um movimento dançante", afirma Bya.

Os atores foram recebidos no vilarejo por João Geraldo de Oliveira, o atual morador da antiga pensão freqüentada por JK. Em 1945, o avô de João Geraldo adquiriu a casa onde sua família fixou residência desde então. Pouco depois chegaram à casa mais três convidados: "seu" João Pascoal Borges, 82 anos, ex-garimpeiro e agricultor, "seu" Merino de Oliveira, 79, ex-garimpeiro e sapateiro e dona Maria das Mercês Cruz, de 78.

Lembranças dos bailes

Sentados no chão de velhas tábuas de madeira, ao redor dos três contadores de histórias, os atores ouviram atentamente as lembranças daqueles tempos: casos de garimpo, de baile, de namoro, de brigas por causa de mulheres e de assombrações. "Os rapazes ficavam de um lado da sala e as moças, do outro lado, esperando que eles nos tirassem para dançar", lembra Maria das Mercês. "Nós dançávamos valsa, tango e forró. Não tinha hora para acabar", completa. Ao ser perguntada sobre os dons de galanteador de JK, a senhora responde: "Ele só vinha aqui para dançar".

Merino falou de seu namoro com a falecida mulher e dos passeios com ela nos dias de festa. João Pascoal, por sua vez, adverte: "Namorar duas moças? Só se elas morassem em ruas diferentes". Merino também contou de quando, voltando de um forró, com um revólver na mão para o caso de uma possível emboscada, acabou por atirar em um tamanduá que andava por lá. O relato fez João relembrar do caso de um outro tamanduá que, depois de receber 12 tiros, teve de ser morto a pauladas.

Os contadores de história tampouco se esquecem dos tempos de fartura de Curralinho. "Aqui tinha muito diamante, cinema, farmácia e até rádio", descreve João. Após a manhã de conversa, os atores da UFMG fizeram rápida intervenção com uma das cenas de Hoje tem baile, na qual, ao som de Elvira Escuta, seresta de José Marcelo de Andrade, dois jovens apaixonados dançam, enquanto outro, ciumento, os observa. "Foi muito emocionante. Quando Merino falava de sua esposa, os olhos dele brilhavam", diz o ator e estudante Daniel Carfa, que participa da peça.

Histórias como a de "seu" João, "seu" Merino e dona Maria das Mercês estão sendo registradas por alunos e professores do projeto de extensão Resgate cultural do distrito de Extração, da Fundação Educacional do Vale do Jequitinhonha. Os casos serão reunidos em livro, que contará com o histórico de Curralinho. O projeto ainda vai produzir um folder com os atrativos turísticos do povoado.