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Nº 1918 - Ano 42
02.11.2015

Radiografia da docência

Condições de vida e trabalho de professores da educação básica em oito estados brasileiros são mapeadas em diagnóstico preparado por grupo da FaE

Ana Rita Araújo

Pesquisa desenvolvida em oito estados brasileiros com docentes da educação básica mostrou que, apesar de 84% possuírem formação em nível superior, os salários recebidos se concentram na faixa de dois a três salários mínimos, e 47% dos respondentes estatutários informaram não estar integrados a nenhum plano de cargos e salários. Além disso, 37% atuam em duas unidades, e 10% desse universo trabalham em três ou mais unidades educacionais. Esses e outros resultados da pesquisa Trabalho docente na educação básica no Brasil foram discutidos em seminário internacional realizado na Faculdade de Educação, na última semana.

Entre as dificuldades relatadas pelos docentes em sua prática profissional também estão o excessivo número de alunos por turma e o hábito de levar atividades para casa. A análise dos dados sobre a situação funcional desse grupo profissional indica “um cenário preocupante em que urgem medidas que possam garantir as condições necessárias ao pleno desenvolvimento da docência”, comenta a professora Lívia Fraga, uma das coordenadoras da pesquisa. Em série de livros, publicada pelos organizadores do estudo, os resultados dos estados são analisados separadamente e em conjunto. O levantamento gerou dois bancos de dados – que já subsidiaram dissertações e teses –, que podem ser acessados por pesquisadores de todo o país.

Indicadores

Realizado de 2009 a 2015 pelo Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho Docente (Gestrado), da FaE, o estudo utilizou métodos quantitativos e qualitativos para conhecer, de forma mais aprofundada, as condições de vida e de trabalho desse grupo profissional, com o objetivo de subsidiar a formulação de políticas públicas. Lívia Fraga explica que a principal ferramenta no país para avaliar a qualidade da educação é o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), baseado no desempenho dos alunos na Prova Brasil e em índices de aprovação e de evasão revelados pelo censo escolar.

“Não temos indicadores sobre o trabalho nas escolas, em que condições ele se dá e em que aspectos poderia melhorar para se alcançar uma educação mais democrática e inclusiva”, argumenta a pesquisadora. “É fundamental ressaltar indicadores como a satisfação, que está diretamente relacionada a fatores como carreira, formação e remuneração, além das próprias condições da unidade educacional, com destaque para a quantidade de alunos nas turmas”, acrescenta a professora Dalila Andrade Oliveira, coordenadora da pesquisa e do Gestrado. Em sua opinião, o Brasil precisa desenvolver outras referências para pensar a qualidade da educação que não se fundamentem unicamente no desempenho dos alunos nos testes de larga escala.

Os indicadores desenvolvidos no âmbito dessa pesquisa relacionam-se à inserção na carreira, ao desenvolvimento do trabalho coletivo e colaborativo, ao controle e autonomia no exercício profissional, à satisfação profissional e às condições do local de atuação (sala de aula e unidade educacional). O levantamento ocorreu em duas fases: na primeira, foram aplicados questionários aos docentes da educação infantil, do ensino fundamental e médio das redes públicas municipais e estaduais em oito estados: Minas Gerais, Pará, Paraná, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, Espírito Santo, Goiás e Pernambuco; na segunda, foram formados 42 grupos focais envolvendo 380 docentes e realizadas entrevistas com diretores de escolas e observações em 25 unidades educacionais.

Com os dados obtidos, foi possível traçar perfil socioeconômico e cultural, mapear aspectos como divisão técnica do trabalho na escola, emergência de postos, cargos e funções derivados de novas exigências e atribuições e as atividades desenvolvidas. A pesquisa também revelou as condições de trabalho dos docentes – meios físicos, recursos pedagógicos, acesso à formação continuada, à literatura específica, às tecnologias e a outros bens culturais para o desenvolvimento de seu trabalho –, formas de contratação, condições salariais e de carreira em diferentes redes de ensino e necessidades de formação continuada.

A metodologia e os resultados da pesquisa foram discutidos, na última semana, na Faculdade de Educação (FaE), por pesquisadores brasileiros e estrangeiros, no seminário internacional Trabalho docente para uma educação democrática e inclusiva. A pesquisa contou com o apoio da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).

Gestrado

Criado em 2002, no âmbito da FaE, o Gestrado congrega professores de três programas de pós-graduação da UFMG: em Educação, em Ciências Sociais e em Saúde Pública. Conta com equipe de 30 pesquisadores de distintos níveis de atuação, incluindo os de outras instituições, além de alunos de graduação, mestrado e doutorado. O Grupo, recenseado na Plataforma Lattes do CNPq, é vinculado à Rede Latino-Americana de Estudos sobre Trabalho Docente (RedEstrado).