Saiba mais sobre a importância das leis de incentivo, em nível federal, estadual e municipal
01 de outubro de 2024
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As Leis de Incentivo à Cultura no Brasil surgiram como uma resposta às crescentes demandas pelo financiamento de atividades culturais, em um cenário no qual recursos públicos se mostravam insuficientes em relação ao número de manifestações artístico-culturais. Na década de 1990, com a promulgação da Lei Rouanet (Lei nº 8.313/1991), o governo brasileiro estabeleceu um marco histórico ao criar mecanismos que permitiam a captação de recursos privados por meio de incentivos fiscais. As Leis de Incentivo foram uma importante ferramenta uma vez que, naquele momento, não se pensava a união entre o Estado e o mercado para o financiamento de projetos culturais.
Atual logo da Lei Federal de Incentivo à Cultura. (Créditos: Ministério da Cultura).
Na década de 1990, o Brasil passava por um período de profundas transformações políticas, econômicas e sociais, marcadas pelo processo de redemocratização, após o fim da ditadura militar, e pela abertura econômica. Esse contexto exigia novas políticas públicas que atendessem às demandas sociais reprimidas, incluindo o campo cultural. A promulgação da Lei Rouanet (Lei nº 8.313/1991) se deu em um momento de reorganização das instituições democráticas e de busca pela modernização das políticas culturais. O governo buscava formas de incentivar o setor cultural sem sobrecarregar os cofres públicos, e a criação de mecanismos de captação de recursos privados por meio de incentivos fiscais foi uma resposta inovadora. Essa legislação foi essencial para impulsionar o financiamento da cultura, permitindo que empresas e indivíduos apoiassem projetos artísticos, e refletia o novo papel do Estado como facilitador, em vez de único provedor, dos recursos para o desenvolvimento cultural. A Lei Rouanet foi um marco que se inseriu em um cenário de maior participação civil, liberdade de expressão e reconhecimento da cultura como um direito fundamental em uma sociedade que estava se reestruturando democraticamente.
Com isso, o Estado, ao instituir leis de incentivo à cultura, reconheceu a importância das manifestações culturais e assumiu o papel de facilitador, criando um ambiente favorável para que recursos privados sejam investidos no setor cultural. Com isso, foi possível observar a ampliação do acesso aos recursos financeiros para uma diversidade de projetos culturais, que vão desde criações, produções, itinerâncias, pesquisas, reformas e demais outras categorias. Com essa atuação em conjunto, o estímulo à inovação artística ampliou o alcance das produções culturais a diferentes públicos, contribuindo significativamente para a democratização da cultura e o fortalecimento da identidade cultural do país.
Além da lei federal, diversos estados e municípios brasileiros também instituíram suas próprias leis de incentivo à cultura, ampliando ainda mais as possibilidades de financiamento para projetos culturais. Essas legislações locais complementam os mecanismos federais, oferecendo oportunidades adicionais para artistas e produtores culturais acessarem recursos e implementarem suas próprias iniciativas. As leis de incentivo estaduais e municipais funcionam de maneira similar às leis federais, permitindo que empresas e indivíduos direcionem parte dos seus impostos devidos para projetos culturais aprovados. Por exemplo, a Lei do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) Cultural, existente em múltiplos estados, permite que parte do imposto devido ao estado seja investida em atividades culturais. Da mesma forma, em muitas cidades, há leis que permitem a utilização de parte do ISS (Imposto sobre Serviços) para fins culturais.
A importância dessa junção entre o Estado e o mercado no custeio de atividades culturais é ainda mais evidente quando consideramos essas iniciativas locais. As leis de incentivo estaduais e municipais potencializam os recursos disponíveis, fomentando uma produção cultural mais descentralizada e diversificada. Com isso, não apenas grandes centros urbanos, mas também cidades menores e regiões mais afastadas podem se inscrever nessas leis, promovendo a inclusão cultural e a valorização das manifestações artísticas locais.
Carnaval do Rio de Janeiro – Imperatriz Leopoldinense. Diversas atividades do carnaval são viabilizadas por meio das Leis de Incentivo à Cultura. (Créditos: Fr Santos Arantes).
As leis de incentivo à cultura, tanto em nível federal quanto estadual e municipal, têm gerado impactos significativos no cenário cultural brasileiro. Essas legislações desempenham um papel importante na democratização do acesso à cultura, no fortalecimento da identidade cultural e no estímulo à economia criativa. Isso permite que mais pessoas tenham acesso a eventos culturais, exposições, espetáculos e outras manifestações artísticas, promovendo a inclusão cultural e o acesso à cultura. As categorias são amplamente abrangentes, contemplando diversas vertentes de fomento que vão além da produção artística. Esses mecanismos de incentivo são voltados para atividades em áreas como música, dança, gastronomia, teatro, e artes visuais, além de possibilitarem a realização de festivais, intervenções e eventos culturais de grande impacto. As leis também apoiam pesquisas no campo cultural, contribuindo para a investigação e preservação de saberes, tradições e patrimônios.
CURA Amazônia 2024. A iniciativa propõe intervenções em prédios da cidade, alterando a paisagem urbana. O projeto foi viabilizado mediante Lei Federal de Incentivo à Cultura. (Créditos: Instagram @cura.art).
Os projetos culturais aprovados por meio dessas leis oferecem contrapartidas socioculturais que beneficiem tanto a comunidade quanto a cadeia produtiva da cultura ao fomentar a formação de novos públicos, capacitar profissionais do setor e gerar oportunidades de trabalho em diversas etapas de produção e realização de eventos culturais. Essas contrapartidas podem incluir a realização de atividades gratuitas ou a preços populares, como oficinas, palestras, exposições e apresentações artísticas, especialmente em áreas de vulnerabilidade social. Essas ações não apenas ampliam o alcance e o impacto dos projetos, mas também fortalecem o vínculo entre a cultura e a sociedade, promovendo a educação, a cidadania e o desenvolvimento social através da arte e da cultura.
A programação da Virada Cultural de Belo Horizonte em 2024 contou com diversos projetos que foram incentivados mediante a Lei Municipal de Incentivo à Cultura (LMIC) e que realizaram ações de contrapartida no evento. (Créditos: Instagram @fmcbh).
Além das contrapartidas, as medidas de acessibilidade nos projetos culturais financiados pelas leis de incentivo são fundamentais para garantir que todas as pessoas, independentemente de suas condições físicas ou sensoriais, possam desfrutar e participar ativamente das atividades. Essas medidas incluem a adaptação de espaços físicos para a mobilidade reduzida, a disponibilização de recursos como legendas, intérpretes de libras e audiodescrição, além de materiais informativos em formatos acessíveis. Ao incorporar a acessibilidade como um critério obrigatório, os projetos não só promovem a inclusão social e a igualdade de oportunidades, mas também ampliam seu alcance e impacto, democratizando a experiência cultural para um público mais diversificado e contribuindo para uma sociedade mais participativa e conexa.
Exposição “MetropoliTRAMAS”, localizada no segundo andar do Espaço do Conhecimento UFMG. A exposição conta com o apoio da Lei Municipal e Federal de Incentivo à Cultura e possui diversas ações de acessibilidade, como a interpretação em Libras. (Créditos: Maria Theresa Ianni).
Assim, é perceptível que as leis de incentivo à cultura têm uma importância política, social e econômica crucial para produtores e artistas. Politicamente, elas representam um compromisso do Estado com o desenvolvimento e difusão cultural, reconhecendo a arte e a cultura como pilares fundamentais da identidade nacional e do bem-estar social. Socialmente, essas leis promovem a inclusão e a diversidade, permitindo que diferentes artes e manifestações culturais sejam ouvidas e valorizadas. Economicamente, as leis de incentivo proporcionam um cenário para o surgimento e a sustentabilidade de atividades culturais, promovendo a geração de renda e estimulando a economia criativa. Desse modo, esses incentivos são fundamentais para produtores e artistas, uma vez que fornecem os recursos necessários para transformar ideias em projetos concretos, ampliando o acesso à cultura e contribuindo para a democratização e diversificação cultural.
A cultura, enquanto expressão fundamental da identidade e diversidade humana, atua como garantidora de diversos outros direitos essenciais à cidadania e ao desenvolvimento social. Dessa forma, democratizar o acesso aos recursos e demais oportunidades de fomento não apenas beneficia o artista, mas sim toda a comunidade.
[Texto de autoria de Maria Theresa Ramos do Carmo Ianni, estudante do curso de Ciências do Estado e bolsista de extensão do Núcleo de Ações Educativas e Acessibilidade]
Referências
MOISÉS, J. A. (1998) “Os efeitos das leis de incentivo”. In: Weffort, Francisco & Souza, Márcio (orgs.). Um olhar sobre a cultura brasileira, Brasília, Ministério da Cultura.
Teixeira, L. C., Silva Xavier, W. ., & Rodrigues de Faria, E. . (2023). Aspectos Democráticos da Lei de Incentivo à Cultura e sua relação com a promoção do Pluralismo Cultural. Administração Pública E Gestão Social, 15(3). https://doi.org/10.21118/apgs.v15i3.14234