Enfermeira graduada pela UFMG e médica pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), onde aposentou-se como professora de obstetrícia, Calina Guimarães, aos 80 anos, foi homenageada nesta sexta-feira, 4, pelo Centro de Memória da Medicina da UFMG (Cememor). Ela proferiu, como convidada, uma das aulas do curso de História da Medicina mantido naquela faculdade pelo Cememor - que habitualmente convida médicos veteranos para falarem às novas gerações sobre sua prática profissional. A palestra, no entanto, não foi exclusivamente sobre temas médicos. Prima do escritor João Guimarães Rosa, Calina falou também sobre a convivência com Rosa - médico formado pela UFMG - que se tornou célebre como autor de algumas das mais importantes obras da literatura brasileira e universal. Ela relatou ainda seu trabalho junto ao Museu Casa de Guimarães Rosa , em Cordisburgo, e ao grupo de contadores de histórias Miguilins, daquela cidade, criado por ela. Isso aconteceu depois que, aposentada pela compulsória há dez anos, Calina voltou à terra natal, onde desde então mantém intensa atividade como divulgadora da memória e da obra do escritor mineiro. Humanismo A prima de Rosa, que conviveu com ele na sua juventude, relatou fatos pitorescos sobre a personalidade do médico-escritor, que segundo ela conversava pouco, mas era capaz de conduzir uma conversação para que o interlocutor falasse e ele apenas ouvisse. "Tinha uma memória prodigiosa, mas anotava todos os fatos interessantes que, assim recolhidos, utilizava depois em sua literatura", acrescentou. Aos jovens médicos, depois de tecer considerações sobre algumas das experiências marcantes de sua vida profissional, Calina Guimarães recomendou que "leiam muito, principalmente os bons escritores brasileiros, seja Guimarães Rosa ou José de Alencar, pois o convívio com a literatura é capaz de enriquecer espiritual e intelectualmente o médico". Ela disse também que, por ser uma atividade em constante evolução, a medicina exige que o médico estude sempre. "Quando ele não se sentir mais capaz de atualizar-se, deve parar. Eu nunca quis ser uma médica velha e ultrapassada, por isso, quando percebi que minhas mãos tremiam durante as cirurgias, comecei a planejar minha saída. E deixar a profissão é tão difícil como começar", arrematou ela. A palestra de Calina Guimarães no curso de História da Medicina do Cememor foi ilustrada por textos de Guimarães Rosa narrados pelas contadoras de estórias Dôra Guimarãe e Elisa Almeida e pelos contadores-mirins do grupo Miguilins, de Cordisburgo, Tiago e Magda.
"Foi uma das melhores reuniões que já tivemos no Cememor. Ela é um exemplo de vida para os jovens que estão começando e abriu para eles as portas de uma nova compreensão da profissão médica. Foi como se lhes tirasse uma venda dos olhos", avalia o coordenador do curso de História da Medicina, professor Valênio Perez França. Para o porofessor, "a medicina é uma área muito técnica e às vezes o médico esquece o lado humano de sua atividade, que está contido esplendidamente na obra de Guimarães Rosa".