A filósofa Marilena Chauí, professora da Universidade de São Paulo (USP), afirmou hoje, em palestra no campus Pampulha da UFMG, que está se perdendo a noção de espaço público, na medida em que a política está submetida à lógica do marketing do consumo e do espetáculo. Segundo ela, o que se chama hoje de opinião pública não passa de manifestação de gostos, preferências e sentimentos individuais, em vez de expressar e discutir os interesses da comunidade. A palestra de Marilena Chauí abriu o seminário Reflexão sobre Assistência Estudantil, que se realiza durante todo o dia de hoje e integra a Semana de Conhecimento e Cultura da Universidade. Segundo a pensadora, o fenômeno se verifica com clareza nos meios de comunicação de massa, em que surgiram as figuras do formador de opinião e de “alguém autorizado” a falar de determinado assunto. “Os meios de comunicação tornaram irrelevantes as categorias de verdade e de falsidade, substituídas pelas noções de credibilidade e plausibilidade”, ela disse. As pessoas são convidadas a dizer o que sentem e não o que acham. “Esta é uma das formas de se destruir o espaço público”, afirmou Marilena. A professora da USP falou sobre o surgimento da democracia e da república, voltando à Grécia e à Roma antigas, da separação entre o público e o privado representada pela tragédia grega, e das questões de ética e moral em Espinosa, no século 17. Nesse ponto, destacou que o funcionamento pleno das instituições tem o poder de impedir que os interesses dos governantes se sobreponham aos direitos dos governados. “A corrupção é gerada pela má qualidade das instituições, entendidas como espaço de discussão dos assuntos de interesse geral. O bem-estar e a prosperidade são conquistados pelo ordenamento institucional e pela crítica cívica”, definiu. Ações afirmativas Ainda na fase de respostas ao público presente, a professora criticou, no âmbito da USP, as fundações “que se apropriam do bem público para lucrar com serviços prestados aos alunos”. E afirmou que não entende as desconfianças sobre queda da qualidade nas universidades federais com a ampliação das vagas provocada pelo Reuni. Ela considera que só as universidades públicas são dignas desse nome no Brasil, além de casos raros exceções entre as privadas. “As instituições públicas se preocupam com formação, e não com adestramento, com pesquisa, e não com sondagens, e com extensão de verdade. E vão continuar fazendo isso”, declarou. O seminário continua esta tarde com debate sobre o Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) e relatos de experiências em outras universidades.
Questionada sobre a questão das ações afirmativas no Brasil, Marilena Chauí lembrou que sociedade está polarizada entre carências e privilégios, e “por bolsões de miséria e opulência criados pela política neoliberal”. De acordo com ela, esses movimentos tornam visível a exclusão, que a ideologia dominante não admite, e tentam quebrar a carência e a opulência. “Isso ameaça a classe dominante e deixa a classe média, que aspira à opulência, apavorada, já que ela aceita a caridade mas não a igualdade”, disse Marilena. Para ela, as ações afirmativas “estão inventando a cidadania e cumprindo uma revolução, mas isso não vai sem luta”.