Foca Lisboa |
Dirigentes de algumas das entidades mais representativas ligadas à ciência e tecnologia no Brasil, reunidos esta manhã na UFMG, reivindicaram que a produção de pesquisa seja regulada por leis flexíveis e defenderam o papel de fundações de apoio e outras organizações que, segundo eles, têm tido papel fundamental para viabilizar o trabalho de universidades e institutos de pesquisa. Estiveram reunidos em torno do tema A dinâmica da ciência, tecnologia, inovação e a legislação brasileira os presidentes da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Marco Antonio Raupp, da Associação Brasileira de Ciência (ABC), Jacob Palis, e o diretor da Coppe/UFRJ, Luiz Pinguelli Rosa. O encontro foi mediado pelo reitor da UFMG, Ronaldo Tadêu Pena, e contou com a presença da vice-reitora da Universidade, Heloísa Starling, de pró-reitores e pesquisadores. Esteve presente também o ex-professor da UFMG e ex-ministro de Ciência e Tecnologia José Israel Vargas. Marco Antonio Raupp afirmou, em sua exposição, que a comunidade está satisfeita com o aporte de recursos para ciência e tecnologia e com a destinação de um papel relevante do setor para o desenvolvimento da produção e do comércio exterior. Mas salientou que o marco legal ainda é considerado inadequado para a execução plena das atividades. “Nossa visão é de que as atividades não podem ser de responsabilidade integral do Estado, que deve fomentar o trabalho inclusive de instituições privadas”, ele disse. O presidente da SBPC, que reúne 86 entidades científicas, defendeu a inclusão do terceiro setor nas políticas públicas de ciência e tecnologia. “A colaboração das organizações traz eficiência, economia e torna as relações mais democráticas, pois significa a participação da sociedade”, explicou Raupp. Ele criticou o “questionamento político-ideológico” das organizações sociais e interpretações variadas da lei, “que geram insegurança jurídica e prejudicam a gestão de ciência e tecnologia”. ‘Terrorismo jurídico’ “É claro que temos que ser fiscalizados, mas que a ação seja baseada em princípios e rigor na apuração, e que se punam os culpados”, disse Pinguelli Rosa, alertando que não se devem imobilizar as universidades em função do risco de “irregularidades que podem acontecer mas que são inocentes e não têm nada a ver com roubalheira”. O diretor da Coppe contou que tem defendido que um modelo novo pode ser criado sem a necessidade de interromper o que está em funcionamento. Ele manifestou solidariedade à UFMG em sua “batalha corajosa” no Supremo Tribunal Federal contra o acórdão 2.731 do Tribunal de Contas da União, cujas determinações afetariam o desenvolvimento institucional da UFMG a autonomia universitária. “Quem não deve não teme”, disse Pinguelli Rosa, denunciando um “terrorismo jurídico que atormenta pessoas honestas e impedindo o funcionamento do serviço público”. Aliança pela flexibilidade Ex-diretor do Impa – Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada, Palis lembrou que a transformação da instituição em Organização Social possibilitou iniciativas como a contratação, sem necessidade de aguardar concurso público, de um jovem brasileiro que ocupa posição de destaque na França e passou a trabalhar para o Impa durante metade do ano. “Foi uma contratação extremamente valiosa para o Instituto e que não teria sido possível pelo regime anterior”, ressaltou. Na opinião de Palis, o Brasil tem muito a perder com regras que possam cercear as atividades de ciência e tecnologia. E defendeu o fim das confusões na esfera jurídica, “que são o caminho mais fácil para a corrupção”. Ao final da fase de apresentações, o reitor da UFMG, Ronaldo Pena mostrou slides contendo trechos de leis e do acórdão do Tribunal de Contas, para demonstrar as razões que levaram a Universidade a questionar no STF as determinações do TCU. Ele explicou, entre outros pontos, que ao contrário do que diz o acórdão, obras de infraestrutura são previstas na legislação em vigor como atividades de desenvolvimento institucional, e podem, portanto, ser geridas pela Fundep, a fundação de apoio à UFMG. “Sempre construímos nossos prédios, faz parte da história da UFMG”, disse o reitor. “E o próprio TCU já atestou que nossas obras são 20% mais baratas, como foi o caso do prédio da Faculdade de Ciências Econômicas, no campus Pampulha, inaugurado no ano passado.” Ciclo
O diretor da Coppe, Luiz Pinguelli Rosa, concentrou sua fala no tema das fundações de apoio a centros de pesquisa. Lembrou que a Fundação Coppetec, ligada ao centro que dirige, existe como parte dele e obedece a ele, gerindo recursos de empresas privadas. Afirmou não entender a resistência às fundações e a lógica de se querer proibir o ingresso de recursos privados no serviço público.
Jacob Palis, da ABC, citou o exemplo do Instituto Pasteur, que vive de contratos com empresas privadas e com o governo francês, para defender o apoio das fundações, por exemplo, às universidades. Destacou a aliança da ABC com a SBPC e convocou também a Andifes para lutar pela flexibilidade na gestão de ciência e tecnologia, “fundamental para que possamos expandir as fronteiras, com benefícios para toda a sociedade”.
O evento foi a primeira edição do Ciclo de Conferências ABC/UFMG/Fapemig. Segundo Francisco César de Sá Barreto, ex-reitor da UFMG e vice-presidente da ABC para Minas Gerais e o Centro-Oeste, a iniciativa deve permanecer independentemente das mudanças de direção nas instituições. Ele anunciou alguns temas para os próximos eventos: a crise da água e o desenvolvimento nacional; Charles Darwin e Carlos Chagas; a crise mundial e novos caminhos para as nações; e as fronteiras da ciência e os limites do pesquisador.