A revista PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America) veicula, em sua edição de 27 de julho, artigo de pesquisa sobre dengue coordenada por Mauro Teixeira, professor do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG. A publicação possui elevado fator de impacto no meio científico. O trabalho, intitulado Essential role of platelet-activating factor receptor in the pathogenesis of dengue virus infection, mostra os resultados de investigação sobre o papel do antagonista do Fator Ativador de Plaquetas (PAF, na sigla em inglês) na inibição dos sintomas da denge. O PAF é um mediador químico reponsável pelo recrutamento de leucócitos nas respostas inflamatórias de defesa do corpo. O trabalho do grupo consistiu em utilizar fármaco existente no mercado (mas não disponível em drogarias) que atua como antagonista ao PAF - ou seja, impede que essa molécula realize sua função - em experimentos animais. A estratégia inibiu todas as manifestações clínicias da doença. “A terapia que desenvolvemos não impede a infecção pelo vírus, mas atua como antidoença, revertendo todos os sintomas e evitando a evolução do quadro clínico típico da dengue”, declarou Mauro Teixeira ao Boletim UFMG, cuja edição 1604, de abril de 2008, veiculou reportagem sobre a pesquisa. Com a publicação pelo PNAS, o trabalho alcança novo patamar de reconhecimento na comunidade internacional (leia abaixo resumo do artigo). Em entrevista concedida ao site da UFMG, o professor esclarece que o grupo aguarda, no momento, a aprovação pelo Conselho Nacional de Saúde (Conep) do ensaio clínico que vai avaliar a segurança do uso do antagonista PAFr em seres humanos e realizar estudos de sua eficácia. As investigações envolvem, além de pesquisadores da UFMG, outros da Universidade de São Paulo (USP) e dos russos Tarasevich State Institute of Standards and Control e State Research Center of Virology and Biotechnology “Vector”. Conheça os comentários de Teixeira sobre o trabalho: Sinteticamente, qual a tese central proposta no estudo publicado e quais os resultados obtidos com experimentos animais? Há muitos grupos de pesquisa ao redor do mundo trabalhando na mesma linha do seu, relativamente à dengue/imunologia? A partir da publicação do artigo, quais perspectivas se abrem para uma nova proposta terapêutica para a dengue? ARTIGO AUTORES Fernando Q. Cunha Eugenij Bukin; Alena Atrasheuskaya George Ignatyev RESUMO
Existem dois achados mais importantes. O primeiro é específico ao trabalho publicado e sugere que a molecula PAF [sigla em inglês para Fator Ativador de Plaqueta], agindo no seu receptor (PAFr), participa de forma importante na fisiopatologia da dengue experimental. Quer dizer, o PAFr é fundamental para a doença dengue se manifestar nos camundongos. Extrapolando estes dados, de forma importante, nossos estudos sugerem que uma resposta inflamatória exacerbada parece explicar a gravidade da doença dengue em camundongos. Extrapolando também para seres humanos, parece que a resposta inflamatória que se segue à infecção é importante para a existência de vários sintomas e a morte causada pela dengue grave. Por inferência, é possível que possa se tratar a dengue grave ao se impedir o desenvolvimento desta resposta inflamatória grave. O PAFr pode ser um dos alvos (pelo menos experimentalmente), o que precisa ser confirmado em seres humanos.
Existem vários grupos trabalhando no tema, mas ainda é uma área pouco explorada. Atualmente há maior interesse nessa modalidade de investigação por causa da frequência da doença e gravidade dela. Nosso grupo é pioneiro no estudo da resposta inflamatória e na identificação da importância desta na infecção pelo vírus da dengue.
Além do que já mencionei, na prática, estamos agora, no âmbito do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) em Dengue [coordenado por Mauro Teixeira] fazendo a síntese de um antagonista do PAFr em condições especiais - para uso em seres humanos - e aguardando a aprovação pelo Conselho Nacional de Saúde (Conep) do ensaio clínico para avaliar a segurança de seu uso em seres humanos e realizar estudos iniciais de eficácia.
Essential role of platelet-activating factor receptor in the pathogenesis of Dengue virus infection
Danielle G. Souza; Caio T. Fagundes; Lirlandia P. Sousa; Flavio A. Amaral; Rafael S. Souza; Adriano L. Souza; Daniela Sachs; Mauro M. Teixeira; Erna G. Kroon
Universidade Federal de Minas Gerais
Universidade de São Paulo
State Research Center of Virology and Biotechnology “Vector”
Tarasevich State Institute of Standards and Control
Severe dengue infection in humans causes a disease characterized by thrombocytopenia, increased levels of cytokines, increased vascular permeability, hemorrhage, and shock. Treatment is supportive. Activation of platelet-activating factor (PAF) receptor (PAFR) on endothelial cells and leukocytes induces increase in vascular permeability, hypotension, and production of cytokines. We hypothesized that activation of PAFR could account for the major systemic manifestations of dengue infection. Inoculation of adult mice with an adapted strain of Dengue virus caused a systemic disease, with several features of the infection in humans. In PAFR/ mice, there was decreased thrombocytopenia, hemoconcentration, decreased systemic levels of cytokines, and delay of lethality, when compared with WT infected mice. Treatment with U.K.-74,505, an orally active PAFR antagonist, prevented the above-mentioned manifestations, as well as hypotension and increased vascular permeability, and decreased lethality, even when started 5 days after virus inoculation. Similar results were obtained with a distinct PAFR antagonist, PCA-4246. Despite decreased disease manifestation, viral loads were similar (PAFR/) or lower (PAFR antagonist) than in WT mice. Thus, activation of PAFR plays a major role in the pathogenesis of experimental dengue infection, and its blockade prevents more severe disease manifestation after infection with no increase in systemic viral titers, suggesting that there is no interference in the ability of the murine host to deal with the infection. PAFR antagonists are diseasemodifying agents in experimental dengue infection.