Os 30 anos da Lei de Anistia e os 70 de fundação da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich) foram comemorados hoje, no campus Pampulha, com audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Realizada por solicitação do Diretório Acadêmico da Fafich, a reunião contou com a presença de parlamentares que integram a Comissão e de convidados, como a vice-reitora Heloísa Starling e o ex-ministro dos Direitos Humanos Nilmário Miranda. “A democracia é um processo inacabado e inacabável”, afirmou o ex-ministro ao citar o recente exemplo de Honduras, em contradição com o cenário de democratização da América Latina. “Quando celebramos 30 anos da anistia, nossa preocupação é com o presente e com o futuro”, disse. Para Nilmário Miranda, o que falta no Brasil para completar o processo de anistia é a condenação dos torturadores. “A impunidade é um câncer que contamina a democracia”, afirmou. Papel da Fafich O presidente do Diretório Acadêmico, Estevão Cruz, explicou que a audiência pública, com o tema A Fafich e a resistência à ditadura militar, abre um ciclo de atividades que incluirá sessão comentada de filmes sobre a anistia e a resistência à ditadura militar, oficinas com grupos de pesquisa e de intervenção cultural, outros debates sobre o movimento estudantil e a universidade e eventos culturais. As atividades têm continuidade na noite de hoje, 19h, no auditório Sônia Viegas, com a presença do ministro Patrus Ananias, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, que fará intervenção sobre Os novos caminhos da democracia no Brasil. A vice-reitora da UFMG, professora Heloísa Starling, falou sobre a importância histórica da Fafich, especialmente na luta pela anistia, e lembrou que foi nessa unidade acadêmica – ainda na antiga sede, à rua Carangola – que a bandeira da União Nacional dos Estudantes (UNE) foi hasteada, pela primeira vez nos anos 70, desafiando a ditadura militar. “Faz todo o sentido ser a Fafich a chamar essa discussão. E hoje pertence a esta Faculdade um acervo de mais de 14 mil imagens sobre a ditadura militar”, lembrou a vice-reitora, que coordena o Projeto República. “Precisamos continuar a luta pela anistia, ao abrir os arquivos, punir os torturadores e entregar os corpos às famílias”, completou. O diretor da Fafich, professor João Pinto Furtado, destacou a forte carga emotiva do evento. “É extremamente auspicioso o fato de a nova geração ter tomado essa iniciativa, continuando o legado de uma luta política que não tem fim, porque a agenda se atualiza”, disse. História O ex-ministro dos Direitos Humanos apontou as falhas do processo de anistia, como a exclusão dos que pegaram em armas. “Sempre me refiro a 79 como um processo inconcluso”, disse, ao fazer referência às 479 pessoas assassinadas, das quais 163 desaparecidas; aos cerca de 30 mil brasileiros detidos e levados a locais de tortura; às demissões dos melhores cientistas do país; a milhares de pessoas afastadas das forças armadas e do setor público. “Mas o lado mais perverso da anistia foi o perdão aos torturadores, pois o conceito de anistia refere-se a uma reparação a vítimas do Estado, e o Brasil inventou a autoanistia”, disse. Nilmário Miranda relembrou o reconhecimento pelo Estado dos desaparecidos políticos, em 1995. “Foi uma segunda anistia, e a terceira só ocorreu em 2002, abrangendo o que não foi coberto pelas outras duas, sobretudo ao devolver o vínculo laboral em todas as áreas”, informou. Segundo ele, foi no âmbito desta última que foi gerado o acordo com a UFMG para a instalação do Memorial da Anistia, que vai tornar disponíveis, para consulta pública, entre diversos materiais, os mais de 64 mil processos recebidos pela Comissão de Anistia, alguns com documentos inéditos. Além do objetivo de preservar e difundir a memória política do país, resgatando a importância da luta pela democracia, o Memorial será um centro nacional de pesquisas sobre o tema. Ao final do evento, a Comissão de Participação Popular da ALMG entregou à Universidade placa comemorativa.
Ao abrir os trabalhos da Comissão, o deputado André Quintão destacou o papel da UFMG para Minas Gerais e ressaltou a importância da Fafich como referência na luta política e na formação de “bons profissionais e bons cidadãos”.
Nilmário Miranda afirmou que em 28 de agosto de 1979 o Brasil se emocionou com a Lei de Anistia, “embora ela não tenha sido nem ampla, nem geral, nem irrestrita, porque foi um acordo de elites, feito durante a ditadura”. Mesmo assim, lembrou, “ela foi comemorada, e a cada um que voltava do exílio era uma festa”.