Em sessão pública e solene, no auditório da Reitoria, o Conselho Universitário da UFMG concedeu esta noite ao cineasta português Manoel de Oliveira o título de Doutor Honoris Causa. Às vésperas de completar 101 anos, com mais de 50 filmes realizados, Oliveira agradeceu ao definir-se como “um aluno do cinema” e declarar-se “honrado por uma nomeação que faz desse aluno um doutor”. Manoel de Oliveira foi apresentado pelo professor César Guimarães, do Departamento de Comunicação Social da Fafich, como “um mestre do pensamento e exemplo de vigor e resistência do gesto de criação cinematográfica”. O reitor da UFMG, Ronaldo Tadeu Pena, fez uma analogia entre o cinema e a universidade, que são, segundo ele, “um resumo do mundo e de como este é sentido, com saberes, dramas, paisagens e humores e afetos”. Lembrou que Manoel de Oliveira, também assim como a universidade, mistura a utopia e o real, e agradeceu ao cineasta “por nos projetar além de nós mesmos”. Além do reitor, do homenageado e do professor César Guimarães, compuseram a mesa da sessão do Conselho a vice-reitora da UFMG, Heloisa Starling, o diretor da Fafich, João Pinto Furtado, o chefe do Departamento de Comunicação Social, Carlos Magno Mendonça, o cônsul-geral de Portugal, André de Melo Bandeira, e o professor Aniello Avella, professor da Universidade de Roma Tor Vergata, um dos responsáveis pela vinda de Manoel de Oliveira. Um novo cinema Ao agradecer pelo “acolhimento” (“talvez pela minha idade e não só pelo meu trabalho”), Manoel de Oliveira deu a primeira mostra de humor afiado. Falar não é fácil, e ainda é mais difícil numa universidade”, ele completou. O cineasta definiu o cinema como “espelho da vida” e “síntese de todas as artes”, mas ressaltou que ele tem limites, e que não tem a riqueza da literatura, “a expressão mais forte e de maior riqueza do ser humano”. As respostas às questões dos companheiros de mesa e da plateia, marcadas pela fala pausada e pequenos lapsos de memória, abordaram temas como o Padre Antônio Vieira, referência frequente em sua obra (“um homem extraordinário, interessado antes na confraternização que na conquista”), da importância do Brasil para a força da língua portuguesa e do respeito dos índios pela natureza (“nós somos um desastre”, ele disse). Perguntado sobre a concepção de sua obra, Manoel de Oliveira afirmou que se deveu em grande parte ao acaso. “Não tive verdadeiramente consciência”, ele disse. Sobre sua relação com a tecnologia, o cineasta nascido 13 anos depois da primeira sessão de cinema declarou: “Sinto-me bem com as coisas artísticas, e a parte técnica pertence à ciência. A arte é a expressão da vida, da imaginação”. Segundo Oliveira, a vida não é representável, o que se representa são as convenções. “A vida está cheia delas. Por meio das convenções, o cinema exprime a vida.” Para Manoel de Oliveira, o cinema é o mesmo desde sempre, o que evoluiu foi a técnica. “E essa evolução às vezes foi para o bem, outras para o mal”, ele disse. (Leia mais sobre Manoel de Oliveira e o título de Doutor Honoris Causa da UFMG na edição desta semana do Boletim UFMG.)
A solenidade foi precedida por mesa-redonda em que Manoel de Oliveira respondeu a perguntas de César Guimarães, Aniello Avella e Mateus Araújo, filósofo com doutorado pela UFMG e professor de cinema na França. Araújo afirmou que o cineasta português redefiniu a relação entre a imagem e a palavra, que com ele ganhou autonomia. “Sua obra da velhice inventou um novo cinema de forma soberana. Ele confere à câmera uma imobilidade desconcertante e faz de seus filmes uma visita guiada à História e à literatura”, ele disse.
Oliveira: o cinema é a síntese de todas as artes, mas tem limites