A defesa de uma política de fomento à diversidade cultural, do potencial da cultura para incrementar a economia local e dos investimentos que devem ser feitos para incentivar a produção artística foram aspectos destacados na manhã de ontem, quinta-feira (3/12/09), durante a 2a Conferência Estadual de Cultura, no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Iniciado na última quarta (2) à noite, o evento será concluído nesta sexta (4), com a eleição de delegados e a apresentação de propostas à conferência nacional, marcada para março de 2010, em Brasília. Ontem, grupos de trabalho discutiram as propostas que serão levadas à plenária final. Diretor de Ação Cultural da UFMG e integrante do Conselho Estadual de Patrimônio da Secretaria de Estado de Cultura, o professor Maurício Laguardia Campomori, que falou sobre Cultura e desenvolvimento sustentável, defendeu a necessidade de priorizar a universalização do acesso à cultura e de valorizar a produção cultural própria de cada povo. Campomori afirmou que é necessário se contrapor à tendência atual de tratar a cultura como mercadoria, sem cair no erro de instrumentalizá-la politicamente ou de forma assistencialista. "A cultura não pode ter outra função além da que lhe é própria, de dignificar a vida humana", disse o professor. "Não dá para cobrir buracos de políticas sociais com políticas culturais", concluiu. Especialista na área de Gestão Cultural, Campomori também destacou dados que indicam a força econômica da cultura. Ele afirmou que a produção cultural é responsável por 7% do PIB mundial e 4% dos empregos nos Estados Unidos e no Brasil. Algumas empresas, como a Cemig, transformaram seus investimentos culturais em uma ferramenta eficiente de valorização de suas ações em bolsa. Isso reflete, justamente, o conceito de desenvolvimento sustentável, que valoriza investimentos e iniciativas ecologicamente corretos, economicamente viáveis, socialmente justos e culturalmente aceitos. Na conclusão do evento, Campomori alertou ainda para o perigo de os projetos culturais se tornarem um fim em si mesmos, em uma prestação de contas meramente contábil ou burocrática, perdendo de vista a promoção da diversidade e acesso culturais. Cidades criativas A pesquisadora sugeriu caminhos para desenvolver as chamadas "cidades criativas", a exemplo do que ocorreu em Londres na década de 90. Lá, foram detectadas quais as vantagens comparativas, em termos econômicos, que fariam com que a cidade se tornasse um local de geração de emprego e renda. Os setores apontados foram a comunicação e a publicidade, o design e a arquitetura. A partir daí, foram implementadas várias políticas para que o espaço londrino fosse cedido a profissionais dessas áreas, reconstruindo-se o polo criativo. Ana Flávia lembrou que, no Brasil, há "cidades criativas" planejadas para tal, mas outras que enveredaram por esse caminho a partir da intuição de alguns empreendedores. Ela sugeriu que, para fomentá-las, é preciso recuperar o patrimônio histórico-cultural; levar artistas para áreas não ocupadas do espaço urbano; atrair talentos; identificar a particularidade local que pode alavancar o crescimento econômico; e capacitar os gestores públicos para planejar os polos criativos. Consumo Cidades e cidadania Segundo ele, há estudiosos que chegam a afirmar que as cidades não existem mais, que hoje o que se tem são "pós-cidades". E acrescentou que as cidades se fundam a partir das fraquezas e necessidades individuais, enquanto a cultura de hoje é a do "super-homem", da valorização do individualismo. "Fica em xeque o espaço das trocas, das diferenças", afirmou. Carlos Antônio Brandão também observou que a cultura da permanência está sendo substituída por uma cidade de eventos efêmeros que não constroem nada. "As cidades e culturas sobreviveriam a esse tempo de efemeridade, do gozo do consumo, do compromisso com o presente eterno e do individualismo em detrimento do coletivo?", questionou. Para ele, é o momento de optar pela existência ou desconstrução das cidades. Sobre a necessidade de valorização da cultura das minorias, Brandão afirmou que uma estratégia interessante é criar espaços que dêem visibilidade e coloquem essas manifestações em pé de igualdade com outras culturas dominantes. (Com assessoria de comunicação da ALMG)
Também abordando a força econômica da cultura, a economista Ana Flávia Machado, do Cedeplar-UFMG, apresentou estudos que mostram como o setor pode multiplicar a economia local, gerando emprego e renda, e enfatizou que o produto artístico-cultural depende do Estado como agente financiador. "Devido ao grau de incerteza do setor, não é possível pensá-lo sem a presença do Estado", alertou, mostrando que o aumento de 1% nos investimentos em cultura equivale a uma elevação de 6% no rendimento médio do trabalhador da área. Ela falou sobre "Cultura e economia criativa".
A economista destacou as perspectivas da indústria criativa, que abrange setores como a propaganda, as artes plásticas, a moda, o artesanato, a música, a edição de livros, o rádio, a TV e o cinema. Segundo ela, há uma tendência para o aumento do consumo do produto cultural, pois a expectativa de vida tem aumentado, bem como o tempo das pessoas para o lazer. Além disso, a partir do momento em que a cultura passa a fazer parte da chamada "cesta de consumo", não há limite de saciedade. "Com isso, estão abertas perspectivas enormes em termos de mercado consumidor", projetou.
Para o arquiteto e professor da UFMG Carlos Antônio Leite Brandão, que falou sobre Cultura, cidade e cidadania, o momento é de crise para os três temas. "Perdemos a ideia de que a cultura e a cidade são os veículos para transmissão daquilo que permanece", afirmou. O professor argumentou que a cidade, por definição, é o lugar do acúmulo de culturas e da interação entre elas, e que cultura é a construção de sentido. No entanto, de acordo com Brandão, os muros que separavam as primeiras cidades do meio natural foram trazidos para dentro, com a formação de guetos, tribos e gangues.