Universidade Federal de Minas Gerais

Fotos de Foca Lisboa/UFMG
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Magna Inácio: força do Legislativo é demonstrada pela necessidade dos presidentes de formar maiorias

‘O problema não está no presidencialismo de coalizão, mas nas coalizões que são formadas’, diz pesquisadora da Ciência Política

quinta-feira, 13 de novembro de 2014, às 10h03

A campanha eleitoral foi marcada por críticas ao presidencialismo de coalizão. Esse é um aspecto pouco discutido no Brasil, de acordo com a professora Magna Inácio, do Departamento de Ciência Política. “É como se o presidencialismo de coalizão fosse algo meramente fisiológico, uma arquitetura do clientelismo no país. Mas não é só isso, essas práticas podem ser mais ou menos intensas dependendo de quais coalizões são formadas e de como o presidente gerencia essa coalizão”, afirma a coordenadora do Centro de Estudos Legislativos (CEL), em entrevista ao Portal UFMG.

O Centro realiza, a partir de hoje (e até a próxima sexta), no auditório da Face, campus Pampulha, a 2ª Conferência Internacional sobre Estudos Presidenciais Comparados e Presidencialismo. A professora Magna Inácio vai participar de painel sobre Presidencialismo e governo de coalizão, que será realizado nesta quinta, às 16h15. Ela adiantou, nesta entrevista, resultados dos estudos realizados pelo CEL e as peculiaridades do caso brasileiro em relação aos países da América Latina e Estados Unidos.

Para a pesquisadora, as discussões teóricas apontam o presidencialismo, principalmente o brasileiro, como paradigmático na América Latina. “Existem teses muito fortes e muito aceitas de que, de fato, o presidencialismo brasileiro pós-1988 garantiu mais poderes ao presidente e isso contribuiu de forma significativa para a estabilidade democrática. Anteriormente, argumentava-se que o presidencialismo levaria a crises insolúveis, a golpes, ao fim da democracia. Mas a partir dos anos 90, vários estudos começaram a mostrar que nos países onde o presidente tinha mais poderes ele conseguia equilibrar o jogo com o Congresso, obtendo mais negociação, mais cooperação. É o caso do Brasil e do Chile, especialmente.”

Mas a professora admite que esse campo de estudo ainda desconhece o verdadeiro funcionamento do Poder Executivo. “Conhecemos a relação dele com o Congresso, mas sabemos muito pouco como é a relação com os outros partidos dentro dos ministérios, qual a real capacidade de os partidos influírem sobre a agenda legislativa. Num sistema de coalizão, como o nosso, os problemas de coordenação se tornam mais intensos e graves a depender do perfil da coalizão formada”, explica Magna Inácio.

Nos governos Lula e Dilma, por exemplo, na avaliação da pesquisadora, os argumentos são de que “as coalizões são sempre mais custosas, porque têm mais partidos e partidos mais distantes ideologicamente. Então, convencer todos a andarem numa mesma direção não é um trabalho fácil”, observa.

Tentar entender como os presidentes têm usado os recursos disponíveis dessa estrutura é o foco do evento, que apresenta o Brasil como caso de destaque na América Latina. Assim como nos Estados Unidos, onde a Casa Branca é uma estrutura considerada complexa e profissional, o Brasil tem fortalecido a Presidência como instituição, já considerada não só complexa, mas equilibrada pelas áreas que a compõem. Segue a íntegra da entrevista.

A senhora poderia apontar a peculiaridade do presidencialismo brasileiro em relação aos países da América Latina e Estados Unidos?
A diferença básica entre o nosso presidencialismo e os dos Estados Unidos e de outros países da América Latina é que o chefe do Executivo, o presidente, tem muito mais poderes institucionais. São poderes para legislar, para controlar a própria estrutura do Executivo via orçamento, poderes para nomear e demitir livremente ministros. Mas, principalmente, os poderes legislativos é que fazem com que o presidente seja um agente fundamental na definição da agenda discutida pelo Congresso. Muitas vezes, o presidente atua controlando o próprio ritmo e a própria natureza das propostas que são analisadas. Então, isso faz com que ele tenha poder de negociação, de barganha, com os partidos e com os legisladores muito maior do que presidentes de outros países.

Esses poderes na mão do presidente definem presidência institucional?
Não. Na presidência institucional o foco recai na organização que dá suporte direto ao presidente. Hoje, no Brasil, por exemplo, essa organização é composta pela Secretaria Geral, Casa Civil, Secretaria de Direitos de Promoção da Igualdade Racial, de Direitos Humanos, Políticas para as Mulheres. Chamamos essa estrutura de organização presidencial ou de escritório do presidente. O que estamos argumentando é que ela é um outro recurso que os presidentes podem mobilizar para fortalecer a sua capacidade de coordenação e negociação.

Os presidentes brasileiros usam essa estrutura para se fortalecerem ou é por causa dessa estrutura que eles obtêm todo esse poder?
O argumento que eu faço é esse, que isso é contingente. Não necessariamente o presidente usa isso o tempo todo. Ele usa quando é necessário fortalecer a sua posição dentro do executivo, não só na relação com o Congresso, mas também para coordenar os partidos dentro do Executivo – o que a gente chama de executivo coordenado. Depende da capacidade de se fazer essa articulação interna, de fazer a ação de um órgão reforçar a ação de outro. Então, esse é um recurso adicional de que os presidentes podem lançar mão. Com o poder de propor leis, no caso brasileiro, o presidente pode mudar a administração pública, até por um decreto, e mexer nas competências, nas responsabilidades dos órgãos para criar uma estrutura que vai lhe dar suporte direto.

O que estamos investigando é se isso está ocorrendo em todos os países, sob quais condições um presidente prefere ter uma presidência forte ou uma estrutura mais enxuta. Essa estrutura, que é mais complexa, mais profissional e que reúne mais especialistas, é o que chamamos presidência institucional.

Isso também, de certa forma, gera custos?
Gera custos e gera um problema que talvez seja mais sério, que é de responsabilidade. Porque, no caso dos ministérios, nós acompanhamos, as ações são mais visíveis. Mas e no caso da presidência, onde esses assessores respondem diretamente ao presidente?

Quando falamos de presidencialismo no Brasil, a definição básica de que “o legislativo faz as leis e o executivo as executa” não é tão exata. Todo esse poder do Executivo sempre foi uma característica do presidencialismo brasileiro, ou aumentou após a Constituição de 1988?
Alguns desses poderes foram criados durante o período militar e foram mantidos com modificações importantes, é preciso ressaltar isso, não é a mesma coisa do período militar. Essa concentração de poderes na mão do presidente manteve continuidade com esse período de exceção. De 1945 a 1964, vários desses poderes não existiam, e a posição mais frágil, as crises políticas ocorridas nesse período, a gente atribui a essa fragilidade institucional do presidente. Estamos muito longe dessa imagem de que o Legislativo legisla e o Executivo executa. Muito pelo contrário, 85% das leis sancionadas no Brasil têm origem no Executivo. Ele é o principal agenda setter, o principal ator com capacidade de legislar no Brasil.


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Esse poder concentrado é um perigo para a democracia, significa fracasso do Legislativo? No Brasil, o Legislativo tem capacidade de refrear a ação do Executivo, e a gente tem visto isso. O fato de o presidente ter poderes muito fortes não significa que ele não precise formar maioria, muito pelo contrário. Ele precisa formar essa maioria legislativa de forma sistemática. Os presidentes têm optado em formar essa maioria por meio de coalizões, do compartilhamento do ministério, o que mostra que o Legislativo tem muita força.

Agora, é lógico que essa questão da responsabilidade tem que ser posta em discussão. Em que medida o custo de governar se torna muito mais alto quando você tem uma estrutura como essa? Dois pesquisadores presentes no evento, o Timothy Power e a Svitlana Chernykh, acabaram de conduzir uma pesquisa comparada, e uma das principais preocupações foi avaliar também essa dimensão da responsabilização dos presidentes.

Se o Legislativo tem essa força, por que parece às vezes que o Supremo Tribunal Federal é tão preponderante?
O STF age dentro dos limites, apenas em caso de inconstitucionalidade, ou seja, em ações muito pontuais. Ele não age espontaneamente, ainda que haja ativismo, ele tem que ser provocado pela sociedade, partidos, algum agente mobilizador. O Legislativo brasileiro, se tem alguma fragilidade diante do Executivo, isso passa por uma avaliação de que ele prefere negociar com o executivo.

A coalizão seria um dos principais fatores responsáveis pela estabilidade política brasileira?
Sim, pela produção de governos relativamente estáveis. Mas nós temos deparado nos últimos anos com algum grau de instabilidade política em decorrência de conflitos que envolvem problemas de coordenação interna, muitas vezes na forma do chamado “fogo amigo”.

Como acontece com a participação do PMDB...
Exatamente. Isso mostra os problemas de coordenação da coalizão, que vão reverberar, vão se tornar explícitos no Legislativo, que é onde esses partidos têm a possibilidade de pressionar o presidente.

Mesmo assim a senhora acha que as coalizões são necessárias para a democracia?
Uma questão pouco discutida no Brasil é que o problema não está no presidencialismo de coalizão. O problema está em quais coalizões são formadas. E isso depende de estratégias dos presidentes e dos partidos, cuja dimensão é estritamente política. O presidente pode formar uma coalizão que seja mais compacta, com partidos que são mais parecidos. Às vezes, isso significa ter um grande partido lá dentro, que vai fazer frente ao partido do presidente. Então ele prefere fragmentar, fazer coalizões com partidos menores, aumentar o número de partidos mas manter controle dentro da coalizão, o que envolve estratégias.

Esse aspecto é pouco discutido no Brasil e, nesse período eleitoral, ouvimos muita crítica, como se o presidencialismo de coalizão fosse algo meramente fisiológico, uma arquitetura do clientelismo no país. Mas não é só isso, essas práticas podem ser mais ou menos intensas dependendo de quais coalizões são formadas e de como o presidente gerencia essa coalizão.

Como a senhora avalia a relação do governo Dilma com o PMDB? É uma escolha da presidenta?
Vai depender de qual posição o PMDB vai ter dentro do governo. Hoje o PMDB tem cinco ministérios e toda essa pressão passa por aumentar a participação no governo, inclusive assumir ministérios mais estratégicos. É uma luta por espaços dentro do gabinete. Mas o presidente dispõe de vários mecanismos para controlar o governo, incluindo a via orçamentária.

Às vezes, os presidentes cedem os ministérios de “porteira fechada” – todos os cargos serão ocupados por representantes de determinado partido –, e há situações como as criadas pelo Lula, em que a cúpula do ministério fica com um partido e para cargos hierarquicamente inferiores, ou de empresas estatais vinculadas, são nomeadas pessoas de outros partidos. O objetivo é que um vigie o outro, mas há o risco de, nesse processo, haver paralisia e até mesmo sabotagem.

O que a gente tem visto é que o fortalecimento da presidência pode funcionar para melhorar a capacidade do presidente em antecipar esses problemas, porque tem uma questão que é informacional. Esse é um ponto fundamental, várias teorias já estão trabalhando isso: o que o presidente deve saber? Ele não vai saber tudo, mas tem certos aspectos da gestão do governo que ele precisa saber, inclusive para antecipar conflitos. A famosa imagem da Dilma com aquele bilhete para Ideli (Salvatti), na negociação do Código Florestal, em que ela escreveu “por que eu não sabia?” sintetiza isso. Se o presidente tem uma estrutura de apoio direta que permita um fluxo de informação mais dinâmico, que realmente se estenda até as pontas dos ministérios, ele terá capacidade muito maior de tomar decisões do ponto de vista da coordenação.

Essas falhas de comunicação são comuns a todos os governos?
A gestão Fernando Henrique (Cardoso) investiu menos nessa estrutura da Presidência. Ela funcionou mais como círculo íntimo, com pessoas muito próximas a ele, mais técnicos. Já a presidência do governo Lula foi mais politizada, mais partidarizada. O Fernando Henrique usou muito mais os ministérios da área econômica para fazer essa coordenação via orçamento. E tinha o conselho de governo, formado por câmaras técnicas, uma estrutura que o apoiou muito na definição de agendas estratégicas. Temos outra conformação com o governo Lula.
Acho que esse é um aspecto muito importante: devem-se responsabilizar presidentes e partidos pelas coalizões que eles formam. Eles têm escolhas, a questão é saber fazê-las.

A senhora acha que o Brasil precisa mesmo de uma reforma política? Em que bases ela se daria?
Eu sou bastante cética em relação às chances de se fazer uma reforma política que produza os resultados esperados. Essa ideia de que a reforma política vai resolver tudo é equivocada, porque temos várias regras que, no conjunto, estão produzindo os resultados. E, principalmente, porque toda a discussão se concentra nas regras eleitorais e na organização partidária. E o aspecto fundamental em nosso sistema, que tem a ver com os poderes do presidente, não é tocado. Sabemos que parte dos problemas que vivenciamos tem a ver com reações ou respostas que o Legislativo dá a essa presidência tão fortalecida. Por que não colocar isso também em discussão?

Parte do que muitas vezes é visto como negativo, como o comportamento dos partidos e dos parlamentares no Congresso, tem um componente que é a relação com o executivo. E essa relação está pautada hoje nos poderes de que o Executivo dispõe. Não adianta a gente mexer em partes da engrenagem. É importante considerar todos esses aspectos.

O que acha do recurso ao plebiscito para a decisão sobre a reforma política?
A discussão da reforma tem que ser feita via Congresso. Não vejo que seja interessante via plebiscito, pois o assunto envolve decisões complexas, com especificidades, e é muito difícil reduzi-las a escolhas dicotômicas como “a favor ou contra”, “sim ou não”. Não é apenas uma regra: a do financiamento das campanhas. Essa regra produz certos efeitos a depender de como os partidos estão organizados, se há primárias dentro dos partidos, como se dá a escolha de candidatos e como eles funcionam dentro do Legislativo.

A senhora mencionou o financiamento das campanhas. Como vê essa questão?
Existem outras formas de se tratar o problema do desequilíbrio que o dinheiro traz para a disputa. Acho que não é possível se pensar no financiamento público exclusivo, por exemplo, isolado de outras regras. Pois, se o financiamento público exclusivo é aprovado, os recursos serão alocados para os partidos. E quem vai decidir a alocação desses recursos dentro dos partidos? Isso nos remete a regras de organização partidária. Não dá para fatiar essa realidade, o que produziria um verdadeiro “monstrengo”, de consequências imprevisíveis. Acho que mudanças mais pontuais nas próprias regras podem produzir efeitos interessantes. É preciso discutir com a sociedade. Não existe mágica, democracia é isso.

(Teresa Sanches)

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