Meses de preparação, centenas de horas dedicadas aos estudos e, por fim, o resultado merecido: a aprovação. Parece o resumo de uma história com final feliz. Mas se engana quem pensa que as preocupações com o ingresso na universidade acabam com o fim do vestibular. O início da vida adulta, as dificuldades financeiras e a mudança de cidade – e às vezes de estado – são obstáculos para muitos jovens em busca da tão sonhada formação em uma universidade pública. “Não havia uma instituição de ensino superior pública e gratuita próxima da minha cidade, então qualquer universidade que escolhesse seria longe. Como eu sempre tive a UFMG como referência em excelência, sobretudo no ensino, decidi arriscar e vir para cá", conta o mato-grossense. Além de nunca ter pisado em Belo Horizonte, Wilson não conhecia ninguém que pudesse hospedá-lo e não dispunha de muitos recursos para se instalar. O planejamento do estudante, no entanto, fez toda a diferença na nova fase. Antes de se inscrever no Sisu, Wilson fez uma avaliação minuciosa de todas as instituições de ensino superior que ofereciam vagas para seu curso: “Não usei como critério a distância da minha casa, e sim a qualidade da universidade em diversos aspectos, inclusive da assistência estudantil. Então, antes mesmo de me candidatar à UFMG, já sabia de todos os programas da Fump”. Já instalado em uma república na capital mineira, ele se cadastrou no Programa Permanente de Moradia da Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump), responsável pela assistência estudantil da UFMG. Algumas semanas depois, recebeu uma ligação informando que havia sido contemplado com uma vaga. As primeiras impressões do novo lar foram as melhores possíveis. “Achei tudo muito organizado, limpo e bonito. Recebi todas as informações necessárias por parte da administração e fui muito bem recepcionado. A hospitalidade dos outros moradores foi o que houve de melhor", avalia Wilson. Perguntado se recomendaria a estudantes de fora vir para a UFMG mesmo sem garantia de vaga na moradia, ele garante: “Eu cheguei sem garantia alguma, mesmo não tendo condições de continuar o curso caso não conseguisse a vaga. Acredito que com planejamento tudo dá certo”. Pesou no bolso Amanda chegou a arrumar dois empregos para ter uma renda própria, mas, com receio de o trabalho atrapalhar os estudos, decidiu recorrer à Fump. A assistência foi rápida: em menos de dois meses, ela estava classificada como aluna de baixa renda e ingressava na moradia. Hoje, adaptada à cidade e com uma condição mais tranquila, ela fala com carinho da nova casa. “A moradia cresce a cada dia e temos muito orgulho de dizer que lá somos uma família. Nós não só moramos no mesmo lugar, compartilhamos uma fase de nossas vidas. Vivemos bem, mas estamos sempre na luta para garantir nossos direitos como estudantes e também trabalhando para tornar a moradia um lugar mais aconchegante”. Ciente de que muitos alunos passam pelas mesmas dificuldades financeiras e que nem todos conseguem receber auxílio, ela afirma: “Eu não sei a realidade de cada um, então é difícil recomendar pessoas de baixa renda a vir para a UFMG. A entrada na moradia não é imediata, eles provavelmente irão passar por dificuldades até conseguir a vaga. Mas de uma coisa eu tenho certeza: tem muita gente aqui disposta a ajudar”. Por conta própria Morando numa pequena república com outras 20 pessoas, Mourão também se sentia prejudicado pela rotina agitada da casa. “O pessoal era muito bacana e me acolheu melhor que minha própria família, mas era impossível me dedicar aos estudos lá”. Com a ajuda de um colega, ele descobriu as moradias universitárias e decidiu se inscrever no programa. O esforço deu certo, e o jovem foi contemplado com uma vaga mais rapidamente do que esperava. “Acho que a minha situação era ruim, e isso acabou facilitando a minha entrada na moradia”, argumenta. Mais que um auxílio, Thiago hoje vê a moradia como um lugar de formação: “Se tiver vontade, você pode aprender muito convivendo com as pessoas e, se não quiser, pode viver a sua vidinha tranquila. É bom ter essa chance de escolher, mas as pessoas nem sempre escolhem bem. Conviver proporciona muitos ensinamentos”, analisa ele, que aconselha outros jovens a correrem atrás de seus sonhos sem tirar o pé da realidade. “Para quem sonha ter uma formação acadêmica, a UFMG é uma boa opção. Mas nem tudo é garantido, então é preciso ter força de vontade”. Perseverança Diferentemente dos outros colegas retratados nesta reportagem, Bruno esperou mais tempo para conseguir sua vaga na moradia. Foi um ano de muita expectativa, em que várias vezes ele foi tomado pelo desânimo: “Cada vez que eu não era selecionado, parecia ser mais difícil continuar no curso. Mas a minha família sempre acreditou e insistiu para que eu continuasse tentando”. As primeiras impressões em relação à moradia foram as melhores: “Eu passei a morar em um lugar onde meu custo de vida diminuiu e que me permitia ter dedicação integral aos estudos”. Em intercâmbio nos Estados Unidos e com vaga garantida na moradia para quando retornar, Bruno acredita que os prós e contras devem ser levados em consideração na escolha de faculdade. “A UFMG é uma excelente universidade, que lhe oferece todas as condições para ter sucesso profissional. Mas as dificuldades a serem enfrentadas também devem pesar nessa escolha. A UFMG busca melhorar as condições de permanência dos estudantes de baixa renda, com a ampliação das moradias e o aumento dos valores das bolsas estudantis. A inclusão social, no entanto, é um problema nacional que só será solucionado a longo prazo”, finaliza Bruno. O Programa Para ter acesso ao programa e a outros benefícios da Fump, os estudantes passam por uma avaliação socioeconômica em que são classificados de acordo com o nível de renda. Alunos nível I, II e III podem concorrer às vagas da moradia, que tem entradas semestrais. Mais informações estão disponíveis no site da Fump. O processo de avaliação das condições socioeconômicas para concessão de assistência estudantil está mais ágil, como destaca o pró-reitor de Graduação, professor Ricardo Takahashi, em entrevista ao Portal UFMG: “No mesmo dia do registro acadêmico, os estudantes apresentam a documentação comprobatória da sua situação e já saem sabendo a que tipo de auxílio fazem jus”, explica. Raphael Mattos/UFMG (Bruna Moreira)
É o caso de Wilson Ferreira, aluno do segundo período de Direito. Com uma boa nota no Enem, ele foi convocado em primeira chamada pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e se viu frente a um novo desafio: deixar para trás a vida que levava com a família em Confresa, município no interior de Mato Grosso com pouco mais de 25 mil habitantes, e se mudar sozinho para Belo Horizonte, uma das maiores cidades do país.
Planejamento também foi o trunfo de Amanda Barbosa, aluna do 4º período de Letras. Natural de São Joaquim da Barra, no interior de São Paulo, ela desembarcou em BH movida pelo sonho de estudar em uma universidade federal. Antes de se mudar de vez, negociou uma vaga em república e trouxe a mãe para conhecer o apartamento e ter certeza de que o local era adequado e seguro. Porém, todo o cuidado não foi suficiente para oferecer a tranquilidade de que necessitava, já que as despesas com sua manutenção começaram a pesar no orçamento da família: “Eu gastava cerca de R$700 por mês – o que era muito pra minha família. Às vezes o dinheiro acabava e não tinha coragem de falar porque sabia que eles não teriam como ajudar e ficariam preocupados”.
Falta de dinheiro também foi o maior problema de Thiago Mourão, do 3º período de Educação Física, no início de sua vida acadêmica. Natural de Vitória (ES), ele é um dos muitos estudantes que não recebem ajuda da família ou de conhecidos e precisam se virar para garantir o próprio sustento. “É muito difícil pra um jovem sem muita experiência profissional e sem referências pessoais conseguir um emprego com uma jornada que permita sobrar tempo para os estudos”.
Força de vontade não faltou para Bruno Pena, do 6º período de Engenharia Aeroespacial. O estudante é natural de Belém, no Pará, onde vivia com a mãe e a irmã. Quando veio para Belo Horizonte, deixou pra trás uma família esperançosa quanto ao futuro do jovem. A chegada à capital mineira, entretanto, não foi nada fácil, principalmente por causa do alto custo dos aluguéis. “Eu pagava caro por uma vaga em república, e o valor aumentava a cada semestre. Como a minha família tinha poucas condições para me ajudar, foi um período em que tive de conciliar estudos e trabalho”, lembra.
O Programa Permanente de Moradia Universitária foi instituído em 1997 para oferecer habitação de qualidade a estudantes provenientes de outras localidades e acolher intercambistas, professores, funcionários e visitantes de outras instituições. São oferecidas 740 vagas: 108 no Bairro Universitário, em Montes Claros, e 632 em duas unidades no Bairro Ouro Preto, em Belo Horizonte. Está sendo construída ainda uma quarta unidade, também no Ouro Preto, que deverá abrigar 386 novos moradores. A conclusão da obra está prevista para dezembro deste ano.
Prédio da Moradia Universitária, em Belo Horizonte: trunfo da assistência estudantil oferecida pela UFMG