Zezinha (Maria José Gomes da Silva)
Conheci a Zezinha em meio a um ritual de descoberta e encantamento com o Vale do Jequitinhonha. Era outubro de 2012, fomos recebidos por ela e Ulisses em sua casa, numa noite regada a singeleza e boa acolhida.
O sorriso nos lábios em tudo parecia com aqueles aos quais ela dá vida no oleiro. Como a grande maioria das ceramistas do Vale, Zezinha começou sua arte fazendo peças utilitárias, em um aprendizado que é, fundamentalmente, feminino.
Zezinha começou o trabalho cedo, pois é a primeira de uma família de 10 filhos. Naquela época, o artesanato era a única opção para conseguir o “pão de cada dia”. Ela conta que a profissionalização da atividade foi incentivada nos anos 1970, com o apoio da Codevale, na forma de cursos, oficinas e escoamento da produção.
A qualidade dos trabalhos melhorou, assim como foi ampliada a esperança das mulheres da região em poder, um dia, viver do artesanato. A lida continuou grande, pois era preciso produzir as peças durante a semana, embalar cuidadosamente e ir para o ponto de encontro dos artesãos com as peças na cabeça, na esperança de vendê-las.
Quando completou vinte anos, pensou que o céu estava próximo, pois se casaria e, quem sabe, sairia daquela vida difícil.
Depois de casada, Zezinha pensou em deixar o barro, mas o dia ficava grande demais, principalmente quando o Ulisses, seu companheiro, foi trabalhar nas usinas de cana.
Quando vejo o capricho com que as suas noivas são adornadas, dá bem para entender o caráter salvífico que o casamento representava para as mulheres do Vale. A riqueza de detalhes dos vestidos, o sorriso e a esperança de uma vida menos sofrida saltam aos olhos nessas bonecas-mulheres.
A criação das condições para se viver do artesanato é projeto de vida construído pelo casal. Segundo eles, no princípio, nem tudo eram flores. Hoje em dia, dá gosto de se ver a beleza e a dignidade que marcam a vida e a obra dessa artista singular.
Fonte: MOURA, Maria Aparecida. Zezinha e os encantos das bonecas-mulheres.
