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Nº 1577 - Ano 33
14.5.2007

Foca Lisboa
Rochel Lago

Com o pé na estrada

Inova UFMG gradua sete empresas e prepara-se para receber 16 novos empreendimentos

Ana Maria Vieira

A

partir de julho, um peculiar grupo de candidatos ingressa na Universidade. Trata-se de empresas de base tecnológica fundadas por pesquisadores e alunos, que deverão ocupar vagas abertas com a graduação de empreendimentos desenvolvidos, nos últimos três anos, na incubadora Inova UFMG. A seleção está em curso desde abril, com a participação de 54 projetos de diversas instituições mineiras de ensino e pesquisa.

“O volume de propostas impressiona, pois é bastante superior ao de qualquer outra chamada já realizada pelas 25 incubadoras existentes no Estado”, observa o professor Rochel Lago, diretor da Inova. Ele credita o aumento do interesse ao potencial empreendedor que se encontrava latente entre pesquisadores e cientistas.

A variedade de temas dos projetos apresentados é outro indicador da maior adesão da comunidade ao universo do empreendedorismo. Eles abarcam desde à análise de toxicidade em cosméticos e a identificação de organismos geneticamente modificados nos alimentos, até propostas de habitação e desenvolvimento de veículos, softwares, sistemas eletrônicos e produtos alimentícios. Na área de saúde, chama atenção proposta para elaboração de produtos e protocolos clínicos para a utilização da própolis no tratamento do câncer de boca.

O processo de seleção vai acolher seis projetos para incubação e dez para préincubação. Enquanto o primeiro apresenta produto melhor estruturado e em condições de entrar no mercado, o outro ainda demanda avaliação global do empreendimento. Nas duas situações, no entanto, a maioria dos autores dos projetos não possui formação para avaliar sua inserção no mercado e definir estratégias para a gestão do negócio. “Essa modalidade de empresa é liderada por pesquisadores e alunos que, apesar do elevado nível de qualificação em sua área de conhecimento, não têm experiência gerencial e mercadológica”, avalia Ana Maria Serrão, gerente administrativa da incubadora.

Para preencher essa lacuna, a Inova oferece uma série de incentivos, como laboratórios especializados da UFMG, infra-estrutura para o trabalho dos grupos, assistência jurídica e consultoria empresarial, mercadológica e financeira. O objetivo é permitir que os empreendedores adquiram competência necessária à sua expansão e consolidação no mercado.

Tempo de mercado

“Ao aprender a lidar com o universo empresarial, tivemos a oportunidade de difundir experimentos acadêmicos e industrializar um importante produto para o segmento de nutrição animal, fruto de pesquisa na pós-graduação”, destaca Eloísa Saliba, professora da Escola de Veterinária. Com outros dois colegas da UFMG, ela fundou a empresa P2S2, para manufaturar substância química que atua como indicador de digestibilidade e quantidade de alimentos consumidos por animais.

“Identificar esses padrões permite melhorar a criação e a dieta de qualquer tipo de animal”, explica a pesquisadora. Denominado Lip, o produto foi patenteado no país e aguarda resultado de processo internacional. “Nova Zelândia, Argentina e Cuba já estão utilizando a substância em diversas investigações científicas”, diz. Indústrias de sais minerais e de ração, além de universidades e institutos de pesquisa, são os principais nichos da empresa.

Incubada desde 2005, a P2S2 é um dos sete empreendimentos que a Inova gradua em julho e que já estão produzindo repercussões positivas no mercado. Seus próximos passos poderão ser vislumbrados pela lente da experiência do primeiro grupo de oito empresas, lançado pela incubadora, no período de 2003 a 2006. Metade fundiu-se ou negociou sua tecnologia com outras empresas. O restante permanece no mercado e sua performance no período de incubação é bastante expressiva: com receita bruta anual estimada em R$ 1,8 milhão, o grupo gerou, no mesmo período, R$ 400 mil em impostos.

Uma das histórias de sucesso dessa “leva” é representada pela Comunip. Graduada em 2004, a empresa, especializada em software de transmissão de voz pela Web, foi escolhida para fornecer seu know-how ao IG, braço da Internet da Brasil Telecom. Recentemente, em parceria com o Inatel e o laboratório Cefala do Departamento de Engenharia Elétrica da UFMG, o grupo obteve aprovação da Finep para projeto de TV por Internet. O diferencial de sua trajetória comercial reside, contudo, no aporte de capital-semente feito pelo Fundo Novarum, em 2004. “O negócio foi viabilizado a partir de avaliação de consultores do MIT”, diz Erik Magela, um dos quatro sócios da empresa, aberta em 2001, quando cursava Engenharia Elétrica na Universidade.

Magela considera que o apoio recebido na Inova foi importante para estruturar o projeto, mas ressalta a necessidade de a incubadora oferecer maior suporte às empresas no ambiente comercial. “É preciso que ela constitua pool de oportunidades e network para canalizar investimentos aos novos empreendimentos”, sugere.

“Academia e mercado falam linguagem diferentes, e a incubadora deve trabalhar para melhorar a gestão, os produtos, o acesso a financiamento e aproximar-se do mercado de suas empresas. Caso contrário, as novas tecnologais não terão efetividade”, reforça Felipe Matos, ex-aluno do Coltec que, em 2000, aos 16 anos, fundou com outros colegas a empresa Girando, responsável pela criação do primeiro portal acessado por celular, na América Latina. O sucesso foi imediato e, em 2001, após receber investimentos de R$ 1 milhão, a empresa fundiu-se com o grupo TecNet.

Inovação versus resistência

A mobilização de pesquisadores empreendedores em torno do edital da UFMG ocorre num momento de expansão de investimentos na área. “Vivemos uma situação parecida com a dos Estados Unidos, há 20 anos”, diz Rochel Lago, ao citar iniciativas como a instituição da Lei da Inovação e a melhoria da infra-estrutura para pesquisa, além de mudanças ocorridas na mentalidade da comunidade acadêmica e na conjuntura econômica e social. “Temos de aproveitar esse movimento para fortalecer a cultura de inovação”, reflete.

Uma de suas apostas é a criação de curso de formação complementar em empreendedorismo e inovação tecnológica na Universidade. Sua expectativa é de que a Pró-Reitoria de Graduação o aprove em junho.

Apesar desses fatores, Rochel observa que essa linha de trabalho ainda enfrenta resistências na UFMG. “A área não compete por recursos, o problema é cultural. Muitos contrapõem a pesquisa aplicada à básica e não aceitam que o conhecimento possa se transformar em empreendimento”, diz. “Como somos uma instituição pública, questiona-se, ainda, a legitimidade de lucros obtidos com conhecimentos que deveriam ser disponibilizados sem ônus para a sociedade”, complementa.

Na avaliação de Rochel, tais argumentos desconsideram que a inovação tecnológica desencadeada por empresas nascidas nas universidades beneficiam toda a comunidade. “Elas geram empregos, riqueza, impostos, desenvolvimento local e estimulam novas pesquisas, pois se sustentam em conhecimento intensivo”, pondera.

Felipe Zig
Inova - HPE
Pesquisador testa equipamento nas instalações da HPE, que atua no segmento de energia

Hora da colheita

Fernanda Cristo

Antes mesmo de serem graduados, alguns empreendimentos incubados pela Inova já começam a colher frutos. É o caso da Paradigma Intelligent Applications, cujo faturamento anual já alcança a cifra de R$800 mil.

Para o diretor comercial da Paradigma, André Bax, a principal vantagem do vínculo com a Inova está na proximidade física com as atividades acadêmicas da UFMG. “Ela colabora para o nosso processo de recrutamento no campus. Além disso, a marca UFMG é uma espécie de selo de qualidade”, comenta.

A empresa desenvolve produtos em três segmentos estratégicos valendo-se de linguagens avançadas da computação para organizar e gerenciar informações de outras empresas. Na área de outsourcing – desenvolvimento de softwares específicos de acordo com a necessidade do cliente – os principais consumidores são pequenas e médias empresas norte-americanas e européias.

Sem apagão

Outra empresa com futuro promissor no mercado de geração de produtos de alta tecnologia é a High Power Engineering (HPE), que investe em soluções na área de energia elétrica. Um de seus produtos é usado pela Petrobras. “A idéia de criar a empresa surgiu no laboratório de pesquisa da Universidade”, comenta um dos sócios fundadores da HPE, Braz de Jesus Cardoso Filho, professor do departamento de Engenharia Elétrica da UFMG.

A partir de julho, quando será graduada, a HPE deixará de usar espaços da UFMG para desenvolvimento de produtos. “Uma vantagem da eletrônica é poder trabalhar com produtos que exigem pouca infra-estrutura. Nossa idéia é aperfeiçoar o desenvolvimento de hardwares, a parte mais sofisticada da produção, e terceirizar a parte mais pesada”, explica Braz. O professor acredita que o principal desafio nesta nova fase será aumentar o mercado consumidor. “Por enquanto, a HPE apenas atende às demandas que surgem. Queremos estruturar um departamento de vendas e passar a oferecer mais opções aos clientes”, completa.