Busca no site da UFMG

Nº 1638 - Ano 35
15.12.2008

Fôlego renovado

Institutos nacionais de ciência e tecnologia ampliam
horizontes para grupos de pesquisa da UFMG

Ana Maria Vieira e Flávio de Almeida

A canalização de recursos extras – em torno de R$ 48,4 milhões – e a liderança assumida na condução de redes nacionais de pesquisa em diferentes áreas do conhecimento abrem perspectivas positivas para a UFMG nos próximos três anos. Essa avaliação decorre da aprovação de propostas apresentadas por grupos de pesquisas da Universidade, anunciada no final de novembro pelo Ministério de Ciência e Tecnologia. Os projetos integram programa nacional de formação de institutos de ciência e tecnologia, que assumirão papel de proa na prospecção de conhecimentos, de tecnologias de ponta e de transferência de know-how. A UFMG sedia oito dos doze institutos instalados em Minas Gerais. Em todo o país, foram selecionados 101 institutos, que receberão cerca de R$ 523 milhões.

Nanomateriais de carbono; tecnologia e desenvolvimento de vacinas, dengue; recursos minerais, água e biodiversidade; medicina molecular; nanobiofarmacêutica, redes complexas da Web e informação genético-sanitária da pecuária são os temas das redes capitaneadas pela UFMG. A criação dos institutos conta com parceria da Capes, das fundações de amparo à pesquisa de diversos estados, incluindo a Fapemig, do Ministério da Saúde, da Petrobras e do BNDES.

Segundo o pró-reitor de Pesquisa, Carlos Alberto Pereira Tavares, a participação da UFMG se estende a outros institutos. Devido à estrutura de rede do programa, diversos professores participam de grupos coordenados por outras universidades. “Além de gerar expressivo financiamento, os institutos vão criar demanda por maior planejamento das atividades na área, o que trará tranqüilidade e garantia para a realização das pesquisas”, comentou.

Dentro do eixo

Uma meta ambiciosa, mas realista, projeta-se nos planos de trabalho do recém-criado Instituto Nacional de Pesquisa da Web – Redes Complexas na Web (INPWeb): edificá-lo também como espaço físico, em parceria com a indústria nacional, de modo a tornar Belo Horizonte pólo de geração dessa modalidade de tecnologia para o país. “Queremos criar uma marca que se torne referência em Web fora da Europa e dos Estados Unidos”, diz o professor do Departamento de Ciência da Computação do ICEx Virgílio Almeida, coordenador do Instituto. Fruto de trabalho colaborativo entre pesquisadores da área de computação de quatro instituições – Cefet-MG, UFMG, UFRGS e Ufam (Amazonas) –, o INPWeb nasce capacitado para alçar vôos maiores: dos 27 pesquisadores, 25 são doutores, todos com história de estreita interação com o setor produtivo. Colaboradores estrangeiros e pesquisadores de outras áreas da UFMG completam a equipe.

As propostas de trabalho são consideradas tão promissoras que gigantes da área, como Google, Yahoo e UOL, não hesitaram em apoiar sua criação.“Essa é uma oportunidade muito interessante para alavancar a agenda de pesquisa na Web (...). Estamos entusiasmados com o projeto por causa da história da UFMG”, registra trecho de carta de apoio da Google.

O grupo montou seu trabalho a partir de três desafios relativos à Web: identificação, caracterização e modelagem de interesses e padrões de comportamento das pessoas e das redes estabelecidas; tratamento da informação que circula pelas diversas redes; entrega da informação de forma satisfatória, independentemente de tempo e lugar.

Os recursos aprovados pelo CNPq alcançam cerca de R$ 2,4 milhões. Eles serão destinados a bolsas, gastos em manutenção e aquisição de 600 computadores para montagem de um centro de testes.

Uma rede contra a dengue

Paulo Cerqueira
Mauro
Mauro Teixeira: controle de
doença emergente

Citando classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS), o professor do Departamento de Bioquímica e Imunologia do ICB Mauro Teixeira lembra que a dengue – um problema global, que afeta pelo menos 50 milhões de pessoas anualmente em cerca de 100 países – é caracterizada como uma doença classe I. Isso significa que ela integra o rol de enfermidades emergentes ou descontroladas, para as quais não há tratamento eficaz aprovado. “As investigações em conjunto podem fornecer conhecimento e instrumentos para o Brasil encarar a dengue de forma efetiva”, diz o professor, ao explicar o posicionamento do Instituto Nacional em Pesquisa da Dengue (Inpede), coordenado por ele. “Nosso objetivo é desenvolver pesquisas científicas para fornecer tecnologia e conhecimento aplicado e básico necessários ao tratamento da dengue e ao controle de seu vetor no Brasil”, sintetiza.

O CNPq destinará cerca de R$ 4,8 milhões ao Inpede. A rede, sediada pelo ICB, vai integrar 11 pesquisadores da UFMG (ICB, Medicina e Farmácia) e diversos outros do Centro de Pesquisas René Rachou, Funep-Unesp, UFRJ, USP, UFCE, UFMA e UFPE. Inicialmente, sete temas de pesquisa serão priorizados: modelos experimentais de dengue; interação vírus-células humanas; dengue clínica, biomarcadores e ensaios clínicos; epidemiologia molecular da dengue; ensaios diagnósticos para dengue; busca de novos antivirais na flora brasileira; biologia do vetor e controle vetorial com técnicas avançadas de monitoramento.

Água e sustentabilidade

Como compatibilizar desenvolvimento industrial e conservação dos recursos hídricos? Em torno desse problema, 27 pesquisadores articularam extensa rede internacional de colaboradores, empresas, agências e órgãos governamentais para a montagem do Instituto Nacional – Recursos Minerais, Água e Biodiversidade, com sede na UFMG.

“O maior diferencial do Instituto reside na articulação e no alinhamento de grupos de diferentes instituições de pesquisa e de empresas para, através de uma abordagem sistêmica, transdisciplinar, simultânea e integrada, encontrar soluções para essa questão de relevância mundial”, salienta a professora Virgínia Ciminelli, do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Escola de Engenharia, responsável pela sua coordenação. A rede, que receberá cerca de R$ 7 milhões para os três primeiros anos de funcionamento, vai abrigar inicialmente cinco linhas de pesquisas sobre os seguintes temas: caracterização, monitoramento da qualidade da água/ambiental e recuperação de áreas degradadas pela indústria mineral, incluindo a recuperação de metais de resíduos e de efluentes industriais; oxidação de sulfetos aplicada ao controle de drenagem ácida e à extração de metais; modelagem e simulação de processos de separação hidrometalúrgicos; materiais naturais e sintéticos para a separação, imobilização ou encapsulamento de espécies químicas na indústria de base mineral; avaliação da água/qualidade ambiental de áreas mineradoras representativas das bacias dos rios São Francisco e Doce (em MG), e da região dos Carajás, no Pará, utilizando bioindicadores; avaliação da biodiversidade aquática em áreas de mineração com o objetivo de propor medidas de recuperação, manejo e conservação.

Saúde em escala nano

Foca Lisboa
Robson Santos
Robson Santos: novos fármacos

A partir de março, o ICB abre as portas de seu primeiro curso de mestrado profissional em Inovação Biofarmacêutica (leia mais na página 7). De perfil multidisciplinar, a iniciativa integra as ações do Instituto Nacional em Nanobiofarmacêutica, destinado a incrementar a produção de conhecimentos e tecnologias na área de fármacos – com destaque para os anti-hipertensivos –, favorecendo a capacitação de recursos humanos e a interação universidade-empresa. O coração da rede é o Laboratório de Desenvolvimento Farmacêutico (Labfar), do Departamento de Fisiologia e Biofísica do ICB.

O grupo receberá R$ 6,3 milhões, destinados a pagamento de bolsa, compra de equipamentos, material de consumo e reforma de laboratórios. O objetivo da proposta de trabalho, conforme assinala seu coordenador, o professor Robson dos Santos, é “ampliar os horizontes” na área de nanotecnologia e biotecnologia aplicada. Os trabalhos reúnem instituições da Alemanha, Áustria, Canadá e Estados Unidos, além das universidades federais de Uberlândia (UFU), de Alagoas (Ufal) e de Ouro Preto (Ufop).
Algumas das linhas de ação envolvem as seguintes questões: educação para a ciência; plataforma tecnológica para novos fármacos, estudos e tratamento de doenças cardiovasculares; formulações nanoestruturadas para o tratamento de leishmanioses e doenças cardiovasculares; sistemas de liberação controlada de fármacos no organismo; produção de animais geneticamente modificados na modelagem de doenças e experimentação biológica; criação de escritório de propriedade intelectual para prestação de serviços; transferência de tecnologia.

Saúde animal

Foca Lisboa
Rômulo e Denise
Rômulo e Denise: informação genética

“Estamos iniciando um projeto para o futuro”, observa o professor Rômulo Cerqueira Leite, do Departamento de Veterinária Preventiva da Escola de Veterinária, ao relatar a extensão e os impactos das atividades de pesquisa e de formação de recursos humanos propostas pelo Instituto Nacional de Informação Genético-Sanitário da Pecuária, coordenado por ele. O trabalho do grupo, composto por mais de 20 pesquisadores, toca em ponto crucial da política sanitária brasileira: a capacitação de fiscais e a ausência de informações certificadas sobre doenças e microorganismos que afetam animais de interesse comercial e zootécnico. Atualmente, amostras encontram-se dispersas em laboratórios diversos. O fato cria obstáculos para a pesquisa acadêmica e põe em risco a segurança sanitária. Com a constituição da rede – que abrange UnB, UFPA, UFRGS, Unesp Jaboticabal, UFV, UFU, Ufla, PUC Betim e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento –, os pesquisadores pretendem constituir o Banco de Microorganismos (composto de amostras de vírus, bactérias, fungos e parasitas), que ficaria sob a guarda do Ministério e, a partir dele, gerar conhecimento sobre doenças e genética das populações animais de interesse zootécnico. “Nossa intenção é fazer o levantamento das doenças que existem no país, de sua distribuição em municípios e regiões e do modelo pecuário local”, relata a professora da Escola de Veterinária Denise Aparecida Andrade de Oliveira, que integra o Instituto. Outra vertente decorrente desse passo será o desenvolvimento de processos diagnósticos. O Instituto receberá R$ 6,9 milhões.

Em busca da fronteira

Foca Lisboa
Marcos Pimenta
Marcos Pimenta: aplicações para o grafeno

“Ele pode ser usado em sensores de gases, capazes de detectar uma única molécula. Além disso, é o único sistema de matéria condensada conhecido em que se podem estudar efeitos básicos relacionados à eletrodinâmica quântica e ainda não observados experimentalmente (...)”. O relato, de autoria de pesquisadores do Departamento de Física, e que integra a proposta de criação do Instituto de Ciência e Tecnologia em Nanomateriais de Carbono, põe em relevo as potencialidades de pesquisa de uma nova estrela da física: o grafeno.

Identificado há apenas quatro anos, ele se apresenta como uma folha bidimensional formada por átomos de carbono, desencadeando pesquisas para aplicações diversas. Ao lado dos nanotubos de carbono e dos fulerenos, integra o universo de investigação do Instituto sediado na UFMG, um dos mais afinados com pesquisas sobre temas de fronteira da ciência. “O sucesso da nanociência e nanotecnologia promete uma revolução em campos como energia, saúde, tecnologia da informação e fenômenos emergentes”, escrevem os pesquisadores no projeto do Instituto.

Coordenado pelo professor Marcos Pimenta, o Instituto receberá cerca de R$ 7,2 milhões. A rede é formada por 54 pesquisadores de 19 instituições de pesquisa, universidades e empresas em oito estados, além de contar com colaboradores estrangeiros. Alguns dos desafios do grupo incluem nanofabricação de dispositivos eletrônicos a partir de nanotubos ou grafenos; estudos sobre toxicidade de nanomateriais de carbono em aplicações biológicas e ambientais.

Genética a serviço da medicina

Quarenta e cinco pesquisadores de oito instituições de Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul fizeram convergir seus esforços científicos em torno do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Medicina Molecular (INCT-MM), sediado na Faculdade de Medicina. Seu objetivo é utilizar os recursos da genética, biologia e imagem moleculares para pesquisar diagnósticos e tratamentos mais eficientes para doenças psiquiátricas, neurológicas e diversos tipos de tumores.

Coordenado pelo professor Marco Aurélio Romano-Silva, o Instituto receberá, nos próximos três anos, recursos de R$ 7,2 milhões. A maior parte do dinheiro será usada na aquisição de um Tomógrafo de Emissão de Pósitrons (PET), equipamento da medicina nuclear que gera imagens funcionais de altíssima definição.

O equipamento será compartilhado por grupos de pesquisa de áreas como nefrologia pediátrica, ginecologia e obstetrícia, reprodução humana, neurologia, psiquiatria e oncologia. Segundo o professor Marco Aurélio Romano, a criação do Instituto permitirá o fechamento de uma “cadeia de produção científica” na área da medicina molecular. Isso porque o Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear (CDTN), que funciona no campus Pampulha, criou uma unidade de produção de radiofármacos – substâncias emissoras de radiação utilizadas na radioterapia e em exames de diagnóstico por imagem. Graças à estrutura montada no INCT-MM, tais substâncias, depois de produzidas e testadas em animais no CDTN, poderão ter sua eficiência avaliada clinicamente na Faculdade de Medicina. Dessa forma, a unidade do CDTN receberá feedbacks que a ajudarão a elaborar radiofármacos mais específicos.

Como exemplo, o professor Marco Aurélio cita os radiofármacos para acompanhamento de quimioterapia. Tais substâncias, produzidas com glicose marcada com flúor, medem os níveis de metabolismo de um determinado tecido. “A célula tumoral tem uma avidez muito maior em captar glicose marcada, e, com o uso do PET, é possível identificar a diminuição do metabolismo antes mesmo da redução física do tumor. Assim, é possível avaliar se a quimioterapia está funcionando ou se é necessário mudar a estratégia de tratamento”, detalha o professor.
No caso da psiquiatria, área de atuação de Marco Aurélio Romano, a criação do Instituto deverá potencializar estudos para compreender melhor a fisiopatologia de certas demências, como o Mal de Alzheimer. Além da UFMG e do CDTN, as outras instituições envolvidas são Fundação Ezequiel Dias, Hospital Júlia Kubitschek, PUC Minas, Ufop, UFSM e a Universidade do Extremo-Sul Catarinense.

Vacina contra a negligência

Se depender dos esforços de cerca de 30 pesquisadores vinculados ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas, seis enfermidades tropicais que recebem pouca atenção e investimentos em profilaxia por parte das grandes corporações farmacêuticas internacionais poderão, em alguns anos, deixar de ser rotuladas como doenças negligenciadas.
Sob a liderança da UFMG e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a equipe trabalha no desenvolvimento de vacinas para doenças que representam um verdadeiro tormento para a saúde pública de países do terceiro mundo: doença de Chagas, dengue, leishmaniose (para imunização de humanos e cães), leptospirose, toxoplasmose e malária (contra o Plasmodium vivax). Em todas elas, o processo encontra-se em estágio avançado. “Ou estamos na fase pré-clínica, realizando testes com animais, ou nos preparando para entrar na etapa de testes clínicos”, informa o coordenador do Instituto, professor Ricardo Gazzinelli, do Departamento de Bioquímica e Imunologia do ICB e pesquisador do Centro de Pesquisa René Rachou.

O Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas, que receberá recursos de R$ 6,6 milhões, envolve, além da UFMG e da Fiocruz (René Rachou, Instituto Oswaldo Cruz, Biomanguinhos e Centro de Pesquisa Gonçalo Muniz), mais três universidades públicas: USP, Unifesp e UFRJ.
Segundo o professor Ricardo Gazzinelli, o Instituto será estruturado em três divisões: de imunologia básica, para estudar mecanismos de defesa do organismo; de tecnologias de vacinas, voltada para descoberta de antígenos e adjuvantes imunológicos (substâncias empregadas na formulação de vacinas); e de desenvolvimento de vacinas, direcionada para a realização de testes clínicos.