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Nº 1643 - Ano 35
9.3.2009

Para não levar gato por lebre

Por meio da técnica genética de barcode, pesquisadores da Veterinária identificam espécies de peixes do
Rio São Francisco; método ajuda a evitar fraudes

Luiza Lages

O Barcode é uma técnica proposta por Paul Hebert, pesquisador canadense que realizou, em 2001, trabalho de análise genética de insetos, através do qual demonstrou que, usando o gene Citocroma Oxidase 1, do DNA mitocondrial, seria possível identificar as espécies. O método prevê o sequenciamento de 650 pares de base desse gene, espécie por espécie, e a comparação dos resultados. O procedimento consegue identificar o quanto um indivíduo difere de outro geneticamente.
Filipe Chaves
Daniel e Denise
Daniel e Denise: identificação de espécies da bacia do Rio São Francisco

Em 2008, duas alunas do ensino fundamental surpreenderam a população de Nova York ao denunciar que muitas lojas e restaurantes da cidade vendiam peixes de forma fraudulenta. Kate Stoeckle e Louisa Strauss recolheram 60 amostras de 14 estabelecimentos locais e as enviaram para análise na Universidade de Guelph, no Canadá. Na instituição, o material passou por avaliação pela técnica do Barcode, ou código de barras, que corresponde à análise de uma sequência específica do DNA mitocondrial. Por meio da comparação com um banco de dados que identifica espécies do mundo inteiro, o Barcode of Life, a conclusão foi de que um quarto das amostras aproveitadas (14 em 56) haviam sido rotuladas erroneamente. Parte dos estabelecimentos vendia “gato por lebre”: oferecia um produto inferior pelo preço de um pescado de qualidade superior.

Comandado pelo Instituto de Biodiversidade de Guelph, o Barcode of Life é um consórcio mundial que busca gerar sequências de DNA capazes de identificar cada espécie do planeta. Vinculada ao grupo canadense, uma pesquisa de identificação de peixes pela técnica do barcode começa a ser desenvolvida no Brasil por pesquisadores da UFMG. A professora Denise Aparecida Andrade de Oliveira e o doutorando Daniel Cardoso de Carvalho, da Escola de Veterinária, vão lançar até o fim do ano um estudo sobre o Barcode das espécies do Rio São Francisco.

No momento, a equipe do Laboratório de Genética realiza trabalho de coleta e análise genética dos animais. A intenção é recolher cinco indivíduos de cada uma das 150 espécies de peixes conhecidas no Rio São Francisco e sequenciar o gene Citocromo oxidase 1 de cada um deles. “Dentro da espécie, existe uma diferença entre um indivíduo e outro que deve ser pequena, de 0 a 1%, mas entre uma espécie e outra a média gira em 5%. O que se espera é que depois de correlacionar a informação obtida, as diferenças das sequências entre os cinco indivíduos da mesma espécie sejam bem menores do que quando comparadas com as sequências dos cinco indivíduos de outra espécie”, explica Daniel Carvalho.

Divergência genética

Segundo ele, se dentro de uma espécie for encontrada divergência genética superior a 1%, isso indica a possibilidade de existência de duas espécies. “Aí surgem as espécies crípticas, morfologicamente bem parecidas, mas bem diferentes pelo DNA”, detalha Daniel de Carvalho. Ele acredita que esse trabalho pode aumentar o número de espécies de peixes conhecidas na bacia do Rio São Francisco. As aplicações da técnica envolvem a identificação dos peixes, a detecção de fraudes e a assistência na pesca a longo prazo.

Os pesquisadores da UFMG farão a correlação entre os números das espécies e as sequências de DNA, e os dados serão introduzidos no site do Barcode of Life: www.barcodinglife.org. Cientistas de todo o mundo trabalham com o mesmo procedimento, gerando informações sobre espécies e as inserindo na página da internet. Por meio dela, o público tem acesso a informações como as coordenadas geográficas do local onde o peixe foi coletado, a foto do espécime, a sequência do DNA e o dado bruto do sequenciamento, chamado cronomatograma, que possibilita conferir a qualidade daquela sequência de DNA. “Essa técnica permite ter a certeza de que o filé de surubim é mesmo de surubim e não de um peixe menos nobre”, exemplifica Daniel de Carvalho.

A pesquisa de identificação de peixes do Rio São Francisco será um dos desdobramentos do projeto do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), de Informação Genético-Sanitária da Pecuária Brasileira, sediado na UFMG. O objetivo é estudar o potencial econômico, genético e sanitário da produção animal no país. Por ser um levantamento da pecuária brasileira, o estudo adquire uma importância econômica e social que transcende o monitoramento da biodiversidade. “A nossa intenção é desenvolver e implementar técnicas a serem usadas pelo próprio Ministério da Agricultura para fins de fiscalização”, afirma a coordenadora da pesquisa, Denise de Oliveira.

Rita da Glória