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Nº 1647 - Ano 35
6.4.2009

Questão de risco

Dissertação analisa grau de comprometimento socioambiental em lixões do estado

Ana Maria Vieira

Os municípios de Santa Bárbara, Conselheiro Lafaiete, Cambuquira e Três Pontas aparecem, pela ordem, em um ranking ainda desconhecido e nada lisonjeiro: são as localidades que abrigam os lixões de maior periculosidade ao meio ambiente e aos seus habitantes, entre outras 230 que adotam esse modelo de descarte de resíduos sólidos, em Minas Gerais. A posição conquistada por Santa Bárbara, à frente na lista, tem explicação: seu lixão situa-se entre dois cursos d’água, em local de alta declividade e muito próximo de núcleos urbanos. “São muitas as condições negativas presentes num único lugar”, avalia Gerson Mattos Freire, que defendeu dissertação de mestrado pelo IGC em 3 de abril, sobre o tema.

Denominada Análise de municípios mineiros quanto à situação de seus lixões, a dissertação, orientada pela professora Ilka Soares Cintra, apresenta uma pioneira classificação de risco dessas áreas, extraída de técnicas de geoprocessamento. Seu objetivo, conforme ressalta o especialista, não é crucificar os municípios. Pelo contrário: uma de suas metas consiste em propor metodologia para fornecer dados mais precisos sobre a realidade de 230 lixões do estado, localizáveis por coordenadas geográficas. Por meio dessas informações, o poder público poderá realizar escolhas melhor qualificadas para a recuperação de áreas mais críticas.

“Segundo a legislação, 70% dos lixões mineiros devem deixar de operar em 2011. Como os municípios não possuem recursos para promover as melhorias necessárias nas áreas degradadas, apesar da existência do ICMS ecológico, o estado, como parceiro no processo, terá de estabelecer prioridades”, observa Freire, que colocará seu estudo à disposição do governo de Minas, por meio da Feam.

Para desenvolver a nova metodologia, o pesquisador extraiu e conjugou, por meio de software desenvolvido pela UFRJ, dados relativos a fatores naturais e antrópicos (decorrentes da ação humana) existentes em bases de dados de diversos órgãos ambientais de Minas Gerais – Geominas, Copasa, IEF, Igam e Feam, entre outros.

Radiografia

Ao radiografar a realidade mineira sob esta ótica, Gerson Freire constatou que, dos 858 municípios do estado, 559 possuem lixões. Ele trabalhou com apenas 230 porque são os que possuem dados válidos de coordenadas geográficas. O pesquisador apurou ainda que apenas 55 cidades destinam seus resíduos para usinas de triagem e compostagem, enquanto 17 dispõem de aterros sanitários, que atendem grupo de 31 localidades.

Outros 270 migraram para o chamado aterro controlado – meio-termo entre o lixão e o aterro sanitário, pois promove o recobrimento do lixo com terra, porém sem agregar outras vantagens como a impermeabilização do solo e a drenagem de chorume e gás. “Discuto esse conceito, pois na realidade ele é um lixão controlado”, pondera Freire.

O sistema de lixões provoca sérios danos ambientais. O chorume pode contaminar lençóis freáticos, cursos livres de água e o ar. Também atraem insetos e animais, degradam a paisagem e põem populações inteiras em risco, além de atrair atividades socialmente degradantes, como a catação de resíduos. Em seu trabalho, Gerson detalhou esses fatores de impacto, distribuindo-os em naturais e antrópicos e atribuindo notas a cada um.

Pontuação

Por esse processo, quanto mais baixa a pontuação total, piores são as características ambientais, sanitárias e sociais dos lixões. Assim, a maior declividade do terreno no qual está estabelecido, a menor distância que mantém dos cursos d’água e aquíferos e a maior frequência de chuvas e permeabilidade de solos são variáveis que pioram sua classificação quanto aos fatores ambientais. Sobre os antrópicos, o pesquisador relaciona o maior volume de resíduos gerados diariamente, a menor distância de núcleos urbanos e a inexistência de unidades de conservação como fatores que agravam os danos causados pelos espaços abertos de disposição de resíduos.

Essa via adotada por Freire – que também atribui peso a conjunto de atores – permite saber exatamente quais as fragilidades específicas de cada lixão. Assim, é possível saber que as maiores vulnerabilidades do lixão de Conselheiro Lafaiete encontram-se em sua topografia (grande declividade promove carreamento dos resíduos) e na proximidade com a cidade.

A técnica de geoprocessamento permite ainda estampar as ocorrências em mapas, o que facilita a identificação dos problemas e sua percepção pelo público. Apesar de não ser um recurso novo, ela ainda não se encontra disseminada em processos públicos de avaliação de riscos ambientais. “O poder público tem os dados disponíveis, mas eles não são cruzados”, diz Freire, acrescentando que isso ocorre porque “não se chegou a pensar esse conceito como elemento de análise”. O pesquisador concluiu que sua contribuição deverá ser exatamente a proposta de “conjugação dos dados existentes em favorecimento a uma análise focada no tema”.

Dissertação: Análise de municípios mineiros quanto à situação de seus lixões
Autor: Gerson Mattos Freire
Orientadora: Ilka Soares Cintra
Defesa: 3 de abril, junto ao programa de pós-graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do IGC