Busca no site da UFMG

Nº 1652 - Ano 35
11.5.2009


Escrita define os rumos do conhecimento

Patrícia Azevedo

Acervo pessoal
Charles Bazerman: pesquisas sobre o uso da escrita científica

O desejo de compreender a importância da escrita em todos os campos da vida moderna impulsionou os estudos do norte-americano Charles Bazerman nos últimos 30 anos. E, se depender da sua disposição, será o combustível para os próximos.

Doutor em literatura inglesa e americana pela Universidade de Brandeis, Bazerman ajudou a fortalecer a linguística como campo de pesquisa e se tornou um dos maiores especialistas no assunto. Seus trabalhos como pesquisador resultaram em 18 livros, três deles editados em português. Ao longo dos anos, investigou, em especial, a história da escrita científica e maneiras de utilizá-la em projetos tecnológicos.

Sua carreira de educador começou em 1971, no Union College, em Nova Jersey. Depois de passar pelo Baruch College, Instituto de Tecnologia da Georgia, Universidade de Louisville e Universidade de Cornell, assumiu como professor do Departamento de Educação da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, onde trabalha atualmente. “Tenho procurado contribuir para o ensino e a aprendizagem da escrita nos vários níveis de escolaridade, porque ela é, certamente, um dos mais importantes meios de participação na sociedade”, afirma o professor.

Em 2005, ministrou, na Faculdade de Educação, palestra sobre escrita científica. Admirador da cultura e da música brasileiras, Bazerman retorna ao país a convite do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (Ieat) para falar sobre informação ambiental nesta terça-feira, dia 12, às 14h, no auditório 1007 da Faculdade de Letras. Antes, em entrevista por e-mail ao BOLETIM, ele discorreu sobre seu trabalho.

O senhor tem estudado a escrita científica e assuntos como gênero, interações e desenvolvimento cognitivo, e sua palestra na UFMG abordará o tema informação ambiental. Qual é a relação entre esses assuntos?

O ambiente é uma dimensão que interage com muitas outras esferas de ação, como o governo, ativismo e políticas públicas, economia e corporações e o prazer na vida cotidiana. Em cada uma dessas esferas, a comunicação é desenvolvida por meio de gêneros especializados, organizados em sistemas de atividade. Para construir a cooperação necessária à resolução dos problemas do aquecimento global e outras questões ambientais, a deliberação e o planejamento devem envolver todas essas esferas. E cada uma delas precisa estar atenta ao conhecimento produzido pelas outras.

O que o senhor encontrou nas suas pesquisas sobre representações políticas do ambiente?

Existem vários grupos interessados na questão do meio ambiente e preocupados em encontrar saídas para os problemas ambientais. Cada grupo é motivado a produzir determinadas informações e a comunicá-las aos outros. Uma vez que os governos são essenciais para coordenação das questões ambientais, cada grupo está preocupado em ter a ação governamental como base de sua informação. Todavia, alguns grupos tentam também usar informações e processos retóricos para perturbar ou atrasar deliberações, produzindo incertezas, interferindo assim na atuação das agências governamentais e dos organismos políticos.

Como é sua relação com o Brasil? Três dos seus livros foram publicados aqui.

Tudo começou em 2003, quando a professora Ângela Dionísio, da Universidade Federal de Pernambuco, chegou à minha universidade, em Santa Bárbara, para fazer pós-doutorado. Ela pesquisou o modo como as pessoas interpretam e compreendem informações a partir de novos gráficos de gêneros. Quando ela retornou, conseguiu convites para que eu visitasse vários campi no Brasil e ministrasse pequenos cursos. Ângela e sua colega Judith Hoffnagel organizaram e traduziram três volumes de ensaios que eu escrevi para ampliar a disponibilidade do meu trabalho no Brasil. Também atuei, em 2007, como coordenador da conferência prévia do Simpósio Internacional de Estudos de Gêneros Textuais, que foi realizada em Tubarão (SC). Essa é minha quarta viagem ao Brasil (uma quinta está prevista para o verão) e minha segunda visita à UFMG. As universidades brasileiras têm uma vida intelectual muita rica. E passei a amar a cultura brasileira, em especial a música.

Como a escrita pode ajudar no desenvolvimento do conhecimento e da própria sociedade?

Toda vez que escrevemos, precisamos recolher informações, organizá-las e criar novos significados para elas. Quando a escrita é ensinada dentro de uma disciplina ou profissão, nós aprendemos a utilizar evidências, a conectá-las com o que foi escrito anteriormente e a pensar de maneira apropriada. Algumas tarefas de escrita são especialmente úteis para nos ajudar a refletir mais profundamente sobre determinado campo e como os vários pedaços de conhecimento podem se encaixar.

Vivemos em uma sociedade documentada, na qual a informação sobre vários aspectos de nossas vidas é recolhida por muitas organizações públicas e privadas. A informação define nossos relacionamentos, nossos direitos e obrigações para com aquelas organizações. Até nossa vida amorosa é influenciada pelos livros de psicologia, moralidade e entretenimento que moldam nossas visões de como deveríamos agir e pensar sobre nós mesmos e sobre os outros. É importante que as pessoas aprendam a escrever tão bem quanto leem, para que possam ter voz na sociedade e deixem de ser apenas receptores passivos do que as outras pessoas escrevem.