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Nº 1672 - Ano 36
19.10.2009

Chapa 02
Clélio Campolina Diniz e Rocksane de Carvalho Norton

PENSANDO A UNIVERSIDADE

Foca Lisboa Campolina e Rocksane

As eleições para a Reitoria da UFMG, mandato 2010-2014, ocorrem em momento particularmente complexo e desafiador. As crises e tendências em curso apontam no sentido de um redesenho da geografia econômica e do poder político mundiais, alterando a posição relativa das nações e das regiões. O Brasil tem, hoje, todas as condições para mudar sua posição no cenário econômico e político mundial. Para isso, é imperativo pensar o papel da Universidade como vanguarda crítica na construção de um projeto de nação capaz de combinar as dimensões econômicas, sociais e políticas de uma sociedade materialmente mais rica, porém, antes de tudo, mais justa e solidária.

A Universidade tem sido, ao longo de sua história, espaço de criação e transmissão de conhecimento e de resistência democrática, combinando ciência, tecnologia, cultura e vida pública. A UFMG não abre mão de continuar sendo instituição de excelência no ensino, na pesquisa e na extensão. Desempenhar esse papel significa tanto criar novos caminhos do conhecimento quanto preservar o melhor do patrimônio cultural da humanidade, sendo guardiã e difusora de valores decisivos da civilização, aqueles que, afirmando a absoluta dignidade do ser humano e sua liberdade, só se realizam inteiramente quando forem compartilhados por todos.

I. Universidade e Cultura

A importância estratégica da cultura em um mundo contemporâneo tão marcado por contraposições e conflitos é revelada ao se compreender seu papel na direção da inclusão social, da superação da pobreza, da defesa do meio ambiente e das condições para a justiça e para a paz.

Universidade e Cultura, quando destituídas de sua riqueza e diversidade, se enfraquecem, debilitam-se e têm seu espaço prontamente ocupado pelas regras draconianas do mercado e pelo fanático culto às realidades imediatas, tão dominantes na mídia contemporânea. Por isso, impõe-se à Universidade uma decidida reafirmação de sua relação intrínseca com a cultura.

II. Diversidade e Integração

Se, na Universidade, a busca e o acúmulo do conhecimento foram sendo ampliados e aprofundados, a integração entre as modalidades de conhecimento ou áreas de saber vêm se perdendo. Por outro lado, a complexidade das manifestações naturais e sociais indica as limitações dos saberes disciplinares para explicar muitas dessas realidades, que são transdisciplinares, e nelas atuar. O avanço e o aprofundamento do conhecimento por vezes reforçam as especializações e a multidisciplinaridade fundada na mera justaposição de áreas, limitando a compreensão da complexidade de muitos desses fenômenos. Amplia-se, assim, a necessidade de um crescente esforço de integração das diferentes áreas do conhecimento, através da interdisciplinaridade, como caminho para a compreensão dessas realidades e para a definição de como nelas praticar intervenções.

III. Ciência, Tecnologia e Inovação

No momento, desenha-se uma nova trajetória tecnológica baseada na biodiversidade e nas nanotecnologias, fortemente enraizada no avanço do saber científico. Se a corrida tecnológica é a arma para o crescimento econômico e para a competição, não podemos nos restringir à dimensão unicamente econômica da tecnologia e da inovação.

Urge introduzir a dimensão social como objetivo central do processo de inovação, na busca de uma sociedade que, sem negar o avanço da riqueza material, priorize a construção de relações humanas mais justas, solidárias e de inclusão, portanto menos desiguais.

IV. Sustentabilidade

A Universidade tem lugar privilegiado na justa apreensão e enfrentamento da questão ambiental, seja em seus cursos, pesquisas e atividades de extensão, seja na cultura de sustentabilidade que ela tem difundido, influenciando novas práticas e estruturas curriculares que instalam a questão ambiental como dimensão inescapável do mundo contemporâneo.

Para a UFMG, o meio ambiente deve ser mais que uma questão teórica, impondo-se como exigência em seus campi. Eles devem ser exemplos e referências de práticas de sustentabilidade, desenvolvendo, ao lado de contínuas campanhas e políticas de educação ambiental, um tratamento adequado de resíduos de seus laboratórios e de demais atividades.

V. Universidade e Cidade

A cidade possui realidades com as quais a Universidade tem variados compromissos, por suas funções precípuas nos campos do ensino, da pesquisa e da extensão. Compromissos na busca de propostas capazes de garantir o pleno desenvolvimento material e social de cada localidade ou região, elaborando, discutindo e difundindo propostas sintonizadas com as ideias de liberdade, de solidariedade e de sustentabilidade.

Pontos para um Programa de Ação para a UFMG

1. Autonomia

Entendemos por autonomia o compartilhamento de responsabilidades entre a Universidade e o Governo, de forma a assegurar condições adequadas, desburocratizadas e eficientes para as gestões acadêmica, financeira, administrativa e de recursos humanos. Propomos, dessa forma, a construção e negociação de um projeto de autonomia junto ao Governo Federal, que contempla três dimensões:

  1. autonomia didático-acadêmica;
  2. autonomia para a gestão financeira de seus recursos orçamentários e de receitas próprias;
  3. autonomia administrativa, que inclua o estabelecimento de uma nova política de recursos humanos.

2. Reconstrução das Carreiras e Política de Recursos Humanos

As carreiras funcionais docente e técnico-administrativa em educação são regulamentadas pelo Regime Jurídico Único dos Servidores Civis da União (RJU), o que gera grande rigidez e defasagem em relação aos avanços científicos, técnicos e organizacionais de uma universidade dinâmica, plural e eficiente.

No que se refere à carreira técnico-administrativa em educação, além de não possibilitar adequadamente a ascensão funcional, ela não corresponde às necessidades atuais da UFMG. Nesse sentido, a carreira precisa ser reestruturada, considerando diferentes funções e cargos hoje inexistentes, mas fundamentais para o funcionamento da Universidade.

Na reconstrução das carreiras, três diretrizes precisam ser desenvolvidas:

  1. a criação de um regime jurídico próprio para o servidor público das universidades federais;
  2. uma nova política de recursos humanos, através da qual todos os servidores sejam acompanhados e qualificados, compatibilizando seus interesses com os da instituição;
  3. uma nova política de acompanhamento da saúde do trabalhador, inclusive pela implementação do Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor (SIASS).

3. Fundações de Apoio

As fundações de apoio existem para atender à Universidade. Desse modo propomos:

  1. redefinir suas tarefas, funções, formas de vinculação à UFMG e controle sobre elas;
  2. garantir a ampliação de mecanismos de transparência em suas ações;
  3. definir a conveniência do atendimento às demandas externas à Universidade.

4. Descentralização e Desburocratização

Para dar maior agilidade à gestão da Universidade e fortalecer a legitimidade de suas decisões, o funcionamento dos órgãos colegiados precisa ser reavaliado. Propomos:

  1. garantir às unidades maior autonomia de funcionamento;
  2. promover o fortalecimento das congregações, executando uma política de desconcentração orçamentária;
  3. incentivar maior integração dentro da Universidade, através do fortalecimento das articulações entre o Reitorado e as direções das unidades.

5. Ensino e Pesquisa

5.1. Ensino fundamental e técnico

O Centro Pedagógico e o Colégio Técnico devem ser entendidos como unidades fundamentais para o desenvolvimento das metodologias de ensino, vitais para os cursos de pedagogia e licenciatura, e como referência para as redes pública e privada de ensino. Eles devem ser considerados, portanto, como unidades inseparáveis de um projeto de Universidade que busca a inclusão, a pluralidade e a excelência.

5.2. Ensino de graduação

A UFMG destaca-se no cenário regional e nacional pela qualidade dos seus cursos. No entanto, a própria comunidade universitária reconhece a necessidade de continuar avançando na promoção de sua qualidade, não só para manter sua posição no referido cenário, como para progredir em novas fronteiras.

Reconhecendo a existência do Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), que expandiu significativamente o número de vagas na Graduação, a UFMG deve, nos próximos anos, empenhar-se na busca da manutenção e do aprimoramento de seus padrões acadêmicos de excelência e relevância. Para tanto, cabe garantir o objeto do acordo assinado entre o Ministério da Educação e a Universidade, bem como as formas de salvaguardar a própria instituição, por meio da seleção adequada de docentes, do acompanhamento discente e de avaliações frequentes do processo de implantação já previstas no projeto da UFMG.

5.3. Pós-graduação e pesquisa

O momento é oportuno para repensar, com equilíbrio e lucidez, a situação da pós-graduação na UFMG, que se destaca no país, com projeção internacional em várias áreas. Cabe colocar em questão os mecanismos institucionais de avaliação, para que sejam capazes de detectar, em meio à profusão de dados quantitativos, os indícios, às vezes sutis, da produção do conhecimento transformador, verdadeiramente relevante.

Em que pesem a solidez da estrutura e os bons indicadores de desempenho da pós-graduação e da pesquisa, a UFMG deve buscar desenvolver seu potencial para ser centro de excelência e liderança acadêmica em todas as áreas do conhecimento.

6. Extensão e Cultura: A Integração Universidade-Sociedade

Para a UFMG, as atividades de extensão são complementares e essenciais à plena realização do ensino e da pesquisa. No entanto, é preciso superar a concepção, comumente disseminada, que faz das atividades de extensão o equivalente às políticas sociais compensatórias, assistencialistas.

É importante reafirmar a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, além de reforçar a interação dinâmica dessas atividades.

Se a UFMG tem grande tradição em muitas atividades de extensão, a cultura abre, como base para o aprimoramento da inclusão e da cidadania, novo caminho para a integração da Universidade com a sociedade, permitindo a criação de um espaço comum de saberes.

7. Inclusão Social e Assistência Estudantil

Na UFMG, a um só tempo foram instituídas políticas de aumento de vagas, por meio da adesão ao Reuni, e de ações afirmativas, com a adoção dos bônus social e racial. Ambas atuam positivamente no aumento das possibilidades de acesso de pessoas de menor faixa de renda a uma universidade pública de excelência. Quando o objetivo é promover a inserção social nas universidades, acesso e permanência dos estudantes são questões fundamentais.

Diante da nova realidade de financiamento da Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump), a garantia de manutenção dos seus programas é questão de fundamental importância, tendo em vista:

  1. a manutenção e ampliação dos processos de acompanhamento de estudantes, especialmente aqueles dos cursos noturnos e admitidos através das políticas de bônus;
  2. a manutenção e ampliação das políticas de inclusão e permanência na Universidade.

8. A Gestão dos Campi

A construção da interface campus--cidade não é trivial, principalmente em se tratando de relação com cidades que se tornam cada vez mais violentas, movimentadas e segregadas. Por outro lado, não resolveremos os nossos problemas de transporte e trânsito de modo autônomo, assumindo-nos como ilhas encravadas no tecido urbano. Para equacioná-los, será preciso uma interação cada vez maior com as diversas instâncias de governo que atuam no espaço metropolitano de Belo Horizonte e da cidade de Montes Claros.

Várias medidas deverão ser discutidas e implementadas, com destaque para:

  1. controle do tráfego, das áreas de estacionamento e do sistema de transporte coletivo interno nos campi;
  2. funcionamento dos restaurantes e cantinas;
  3. segurança;
  4. gerenciamento e controle de resíduos.

9. Internacionalização

O desenvolvimento dos programas de pós-graduação no país permitiu uma rápida e significativa elevação do padrão do conhecimento universitário brasileiro. Frente a essa transformação, já não basta limitarmo-nos às formas convencionais de internacionalização. Torna-se necessária a criação de centros de estudos internacionais, organizados de forma complementar e sinérgica entre as diferentes áreas do saber. Se, por um lado, devemos manter nossas vinculações com os países mais desenvolvidos, por outro devemos focar nossa atuação nas áreas menos desenvolvidas ou estratégicas no redesenho da geografia econômica e na geometria do poder, representadas pela América Latina, África e Ásia.

10. Hospital Universitário

Qualquer proposta de ação para o Hospital das Clínicas (HC) deve considerar que ele é parte intrínseca das atividades de ensino, pesquisa e extensão da área de Saúde na Universidade. Assim, o Hospital deve receber especial atenção do Reitorado, visando a:

Trajetórias

Foca Lisboa

Clélio Campolina Diniz: professor titular da Faculdade de Ciências Econômicas (Face-UFMG), pesquisador do Cedeplar e representante do Brasil junto ao Comitê Científico da Rede Iberoamericana de Globalização e Território. Engenheiro, mestre e doutor em Economia, especializado em desenvolvimento e planificação, foi bolsista, pesquisador e professor das universidades de Oxford, Rutgers, Roma, Sevilla e Jean Monet. Exerceu diversas funções de administração acadêmica, entre elas a de diretor da Face, chefe do Departamento de Economia, diretor do Cedeplar, presidente do Conselho de Curadores da Fundep, presidente da Câmara de Ciências Sociais e Humanas da Fapemig, membro do Conselho Técnico Científico da Capes e vice-presidente da Comissão de Desenvolvimento Local da União Geográfica Internacional. Foi diretor-presidente do BH-TEC (Parque Tecnológico de Belo Horizonte). Orientou dissertações e teses, é autor de dois e organizador de quatro livros e possui dezenas de trabalhos publicados. Recebeu cinco prêmios por reconhecimento técnico ou acadêmico e duas condecorações.



Foca Lisboa

Rocksane de Carvalho Norton: professora associada do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG e assessora técnica da Central de Projetos do Nupad. Foi presidente da Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump) e membro do Conselho Técnico-Científico do Departamento de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatria. Médica pela UFMG, mestre em Pediatria e doutora em Gastroenterologia, especializada em Pediatria e Nutrologia, foi chefe do Departamento de Pediatria e membro do Colegiado de Graduação do Curso de Medicina, tendo sido, diversas vezes, professora homenageada pelos formandos do curso. Foi membro do Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG por sete anos. Presidiu o Comitê de Nutrologia da Sociedade Mineira de Pediatria e coordenou cursos da Sociedade Brasileira de Pediatria. Representou Minas Gerais na Comissão Nacional de Médicos Residentes e foi coordenadora pediátrica do Pronto Atendimento do HC. Orientadora de alunos de iniciação científica e de pós-graduação (dissertações e teses), publicou um livro e dezenas de artigos científicos em periódicos nacionais e internacionais.

Chapa 02