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Nº 1756 - Ano 38
7.11.2011

Dos NANOS aos EMBRIÕES

A influência do meio ambiente sobre as propriedades dos nanotubos de carbono, a descoberta da capacidade vasodilatora de um composto vegetal e a ética que envolve o uso de embriões humanos são os temas dos trabalhos que venceram o Grande Prêmio UFMG de Teses 2011, cujo anúncio foi feito no dia 20 de outubro. As três, que representam as principais áreas do conhecimento na pós-graduação, foram defendidas em 2010, assim como as outras 31 contempladas com o Prêmio UFMG de Teses.

Tese impacta metrologia dos nanotubos

Ana Rita Araújo

As propriedades eletrônicas e vibracionais de uma nanoestrutura – em particular o nanotubo de carbono – sofrem interferências do meio ambiente, assegura o físico Paulo Antônio Trindade Araújo, ganhador do Grande Prêmio de Teses 2011 da UFMG na área de Ciências Exatas e da Terra e Engenharias. Em abordagem inovadora, a pesquisa também demonstra que as alterações no nanotubo podem ser descritas com base em interações da constante dielétrica, propriedade que determina como um material vai responder ao campo elétrico, ou seja, sua capacidade de acumular cargas e se polarizar.

“A descoberta da função que descreve a dependência da constante dielétrica com o diâmetro do nanotubo é também relevante para o desenvolvimento da ciência de sistemas de baixa dimensionalidade”, explica Araújo. Ao fornecer padrões para as propriedades dos nanotubos de carbono, o estudo tem implicações práticas na área de metrologia, adotadas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro), que busca o estabelecimento de métodos de medidas confiáveis, fundamentais para a garantia da qualidade de produtos.
Instrumentação

Segundo Paulo Araújo, a compreensão e a descrição acurada dos aspectos abordados na tese Study of the electrostatic shielding and environmental interactions in carbon nanotubes by resonance raman spectroscopy permitem a correta indexação da estrutura dos nanotubos de carbono, essencial para o uso das propriedades optoeletrônicas dessas nanoestruturas. Segundo o pesquisador, a instrumentação científica que foi parte da concretização do trabalho culminou na instalação, no Departamento de Física da UFMG, de instrumento único no país, capaz de realizar experimentos de espectroscopia óptica, microscopia de varredura e manipulação de nanoestrutura com resolução em nanoescala.

“Esse sistema tem sido utilizado em diversos projetos que incluem não só os nanotubos de carbono e materiais correlatos, como o grafeno, mas também sistemas biológicos e ciências do solo, sempre levando a esses temas uma abordagem nanotecnológica”, informa. Defendida junto ao Programa de Pós-graduação em Física, a tese orientada pelo professor Ado Jório de Vasconcelos deu origem a 15 publicações em revistas de impacto internacional.

Graduado em Física pela UFMG, em seu doutorado Paulo Araújo trabalhou por um ano na Ludwig Maximillians Universitaet Muenchen, em Munique (Alemanha). Atualmente faz pós-doutorado no Massachusetts Institute of Technology (EUA), onde desenvolve projetos de pesquisas em grafeno e isolantes topológicos.


Xantona dilata os vasos

Foca Lisboa
Luciano Capettini, ladeado por Andréa Gazzinelli, pró-reitora adjunta, e Ricardo Santiago Gomez, pró-reitor de Pós-graduação: novas drogas
Luciano Capettini, ladeado por Andréa Gazzinelli, pró-reitora adjunta, e Ricardo Santiago Gomez, pró-reitor de Pós-graduação: novas drogas

Ana Rita Araújo

Duas descobertas relacionadas ao tratamento da aterosclerose são os principais resultados de estudo que rendeu ao pesquisador Luciano dos Santos Aggum Capettini o Grande Prêmio UFMG de Teses. A pesquisa revela que o subtipo neuronal da enzima óxido nítrico sintase (nNOS) está presente também nos vasos sanguíneos – e não apenas nos neurônios, como se pensava. Além disso, o trabalho apontou que a enzima se encontra comprometida em artérias de animais com aterosclerose, favorecendo o surgimento das placas de gordura.

A pesquisa também demonstrou, pela primeira vez, que um composto de origem vegetal, a xantona swertinina, pode ser útil no tratamento das alterações vasculares na aterosclerose, ao atuar exatamente na ativação da nNOS. “Várias plantas encontradas em abundância no Brasil são extremamente ricas em xantonas, como é o caso do abricó-do-pará e do gengibre selvagem”, exemplifica o pesquisador.

Orientado pela professora Virgínia Soares Lemos, do Departamento de Fisiologia e Biofísica do ICB, o trabalho foi escolhido como a melhor tese defendida na UFMG em 2010 na área de Ciências Agrárias, Ciências Biológicas e Ciências da Saúde.

Novas drogas

Princípio ativo presente em várias plantas, a xantona é objeto de estudos que focalizam o tratamento de doenças como aterosclerose, hipertensão e diabetes. Em sua pesquisa, Luciano Capettini avaliou o mecanismo de ação vasodilatadora de sete xantonas, entre as quais escolheu a 1,3-diOH-7,8-diOMe-xantona (swertinina), por ser a mais potente. “Nosso trabalho mostra que as xantonas induzem a dilatação das artérias por um mecanismo novo, ou seja, indicamos uma xantona natural como a primeira droga que induz vasodilatação pela estimulação da nNOS”, explica Capettini. Segundo ele, foi possível perceber que nos casos de aterosclerose a enzima nNOS está diminuída. A hipótese é que daí decorram as consequências dessa doença, como estreitamento das artérias.

Professor recém-concursado do Departamento de Farmacologia do ICB, Capettini realizou pós-doutorado na Suíça, com o tema aterosclerose. “Pretendo continuar o trabalho com os professores Virgínia Lemos e Steyner Cortes, este do Departamento de Farmacologia, nos estudos sobre novas drogas a partir de compostos naturais”, anuncia, ao destacar a colaboração de pesquisadores do Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas e da Faculdade de Farmácia. Ele comenta que os grupos de pesquisa liderados por Virgínia Lemos e Steyner Cortes têm recebido, de diversas instituições do país, em especial das regiões Norte e Nordeste, materiais para análise, em que prevalecem os extratos de plantas.


Ser ou não-ser?

Foca Lisboa
Lincoln Frias (à direita) com o reitor Clélio Campolina:
			análise dos argumentos favoráveis ao concepcionismo
Lincoln Frias (à direita) com o reitor Clélio Campolina:
análise dos argumentos favoráveis ao concepcionismo

Itamar Rigueira Jr.

Do ponto de vista da ética, o uso e o descarte de embriões humanos para pesquisa e reprodução são admissíveis, e também não há razões decisivas contra a seleção de embriões. Essas são algumas das conclusões da tese A ética do uso e da seleção de embriões, de Lincoln Thadeu Frias, premiada na área de Ciências Humanas, Ciências Sociais e Aplicadas e Linguística, Letras e Artes.

O objetivo da pesquisa foi analisar os argumentos contrários ao uso de embriões humanos em dois tipos de tecnologia: a derivação de células-tronco embrionárias – que são capazes de se transformar em vários tipos de tecido e podem ajudar a solucionar cegueira, paralisias musculares e doenças neurodegenerativas – e o diagnóstico genético pré-implantação, durante a fertilização in vitro.

Segundo Lincoln Frias, embora a lei em vigor no país permita a pesquisa a partir de embriões inviáveis ou que sobraram em clínicas de fertilização, a situação moral dos embriões permanece controversa nas áreas da legislação e da ética. Tal situação é foco da primeira discussão do trabalho. O autor examina os principais argumentos a favor do concepcionismo, corrente segundo a qual a vida começa na
concepção porque o embrião já é um ser humano e a gestação, um processo contínuo.

“Meu estudo chega à conclusão de que embriões podem ser usados para reprodução e pesquisa, ainda que sejam viáveis e criados apenas para esse fim. Não há razões convincentes para conferir ao embrião o direito à vida, embora se justifique que deva haver limites para seu uso”, afirma Lincoln Frias.

Equívoco com nazismo

A tese investiga também o antisselecionismo, a crença de que a seleção genética de embriões é moralmente errada. O diagnóstico genético pré-implantação (DGPI) já é amplamente utilizado por casais que recorrem à reprodução assistida e se beneficiam da identificação de características genéticas dos embriões criados em laboratório.

“O principal argumento contra a seleção genética é o de que isso seria semelhante à eugenia nazista”, explica o pesquisador. “É um equívoco, porque no nazismo o processo era centralizado pelo governo e feito de acordo com um modelo, enquanto no DGPI os pais é que decidirão pelos filhos, se é que será mesmo possível escolher alguma característica complexa.”

Em outro capítulo, Lincoln Frias analisa a chamada restrição terapêutica, prevista pelo Novo Código de Ética Médica, que determina que a seleção de embriões só deve ser utilizada para evitar o surgimento de doenças hereditárias. Nessa seção, o pesquisador apresenta estudos de caso sobre a seleção por deficiência, para melhoramento, por sexo e por compatibilidade para doação – por exemplo, de medula para um irmão doente.

Para Lincoln Frias, a restrição terapêutica não é adequada para distinguir critérios de seleção moralmente aceitáveis. Ele não considera que haja razões morais definitivas contra a seleção por sexo e por compatibilidade para doação, embora não visem à saúde dos filhos. “Essa restrição é válida, sim, para políticas públicas, pois evita que os ricos tenham ainda mais privilégios”, ressalta o autor, lembrando que o DGPI é procedimento muito caro e garantiria aos mais abonados novas vantagens competitivas.