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Nº 1763 - Ano 38
13.2.2012

O termo surgiu em 2004 com Thomas Vander Wal, para designar uma classificação popular que se origina das ações de representação da informação desempenhada pelos usuários de diversos serviços na web. É uma inovação que explora o uso da linguagem cotidiana e o potencial das redes sociais na organização da informação.

História de reconhecimento e negação

Tese recorre às lutas dos movimentos sociais para compreender o direito de greve no Brasil

Flávio de Almeida

Um pesquisador de história do direito que se limitasse a consultar as sentenças, tratados e jurisprudências do início do século 20 talvez concluísse que a classe operária havia chegado ao paraíso – no caso o Brasil – pelo menos no tocante ao direito de greve. Mas uma análise do movimento grevista em duas companhias ferroviárias em 1906 revela que a história que emerge dos compêndios jurídicos não está bem contada.

É o que se conclui de estudo do pesquisador Gustavo Silveira Siqueira, apresentado em dezembro como tese de doutorado na Faculdade de Direito. “Investiguei a tensão que havia entre um direito reconhecido por juristas, tribunais e patrões e a prática do Estado que usava a polícia para reprimir os movimentos sociais”, explica Silveira, que recorre ao que chama de “experiência jurídica” para compreender o que está por trás do reconhecimento ou negação de um direito. “A violação e o crime são experiências jurídicas, e eles podem nos ensinar muito mais sobre o direito do que a própria lei”, argumenta.

Sob essa perspectiva, Gustavo Silveira mergulhou no universo da greve dos ­ferroviários das companhias Mogyana de Estradas de Ferro e Paulista de Vias Férreas e Fluviais. A primeira atuava nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Goiás, e a segunda concentrava suas operações no estado de São Paulo.

Referências

O pesquisador se debruçou sobre farta documentação especializada, como sentenças, jurisprudências e até uma decisão da Corte Suprema brasileira, que em 1920 absolveu um trabalhador estrangeiro da Companhia Mogyana envolvido na greve de 1906.

Entre os documentos de natureza jurídica, ele recorreu a trabalhos dos principais especialistas da época, como Antônio Evaristo de Moraes, que publicou, um ano antes da paralisação, tratado sobre direito operário, em que assinalava que a “greve é um direito em toda nação civilizada”.

Como a consulta à literatura especializada pareceu-lhe insuficiente para compreender a dimensão dos movimentos, Gustavo Silveira foi atrás de outras fontes. Buscou dicionários da época para apreender o conceito de greve e analisou jornais, informativos distribuídos pelas ligas operárias, comunicados das empresas e até o panfleto de um pároco de Jundiaí, que aconselhava os fiéis grevistas a voltarem ao trabalho. A análise do material permitiu-lhe constatar que a retórica jurídica não se traduzia em efetivo reconhecimento ao direito de greve.

Gustavo Silveira também se cercou de outras referências para fundamentar a abordagem do direito de greve a partir dos movimentos sociais. A principal delas é o que chama de “antropofagia jurídica”, conceito inspirado no Movimento Antropofágico de Oswald de Andrade. Segundo Silveira, boa parte da teoria sobre direito de greve foi produzida na Europa, o que não basta para analisar um movimento grevista no Brasil. “Não se pode simplesmente usar uma referência europeia, sem mastigá-la e transpô-la para a realidade brasileira”, ensina.

Trilhos de guerra

Um clima de tensão se instaurou em maio de 1906 com a greve dos cerca de seis mil trabalhadores das duas principais companhias ferroviárias do Brasil. O governo federal enviou navios de guerra do Rio de Janeiro para Santos para impedir que a paralisação atingisse o principal porto do país. Já os ferroviários lançaram mão de táticas de guerrilha: sabotaram a infraestrutura das ferrovias, quebrando trilhos ou jogando sabão para impedir a locomoção dos trens.

Houve prisões, feridos e mortes de soldados e operários, e trabalhadores foram despejados das casas que pertenciam às companhias. A greve não fora motivada por melhores salários. Os grevistas reivindicavam tratamento mais digno das chefias e exigiam a cabeça do inspetor-geral da Mogyana, o engenheiro Francisco Paes Leme de Monlevade, que tinha fama de carrasco entre os ferroviários.

Monlevade foi mantido no cargo, e o movimento terminou com a demissão de vários operários. A única conquista sequer constava da pauta de reivindicações: a limitação da jornada de trabalho em oito horas.

Tese: História do direito pelos movimentos sociais: cidadania, experiências e antropofagia jurídica nas estradas de ferro (Brasil, 1906)
Autor: Gustavo Silveira Siqueira
Orientador: Arthur José Almeida Diniz
Co-orientador: Antônio Manuel Hespanha
Defesa: 19 de dezembro, no Programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade de Direito