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Nº 1769 - Ano 38
2.4.2012

opiniao

Por trás da fachada, um novo modelo

Marcelo Campos Galuppo*

Parece ser iminente a mudança da Faculdade de Direito para o campus da UFMG, na Pampulha. Apesar do aumento de apenas 10% do total da área construída em relação ao atual edifício, sua horizontalidade e a racionalização do uso dos espaços implicarão melhor aproveitamento. Mas o que me entusiasma nessa mudança não é apenas o novo prédio e sua localização, mas a possibilidade de revermos o modelo de ensino, pesquisa e extensão que praticamos. Vou apresentar quatro problemas que o novo espaço físico pode ajudar a solucionar.

O ensino baseado no ensino. Em grande parte das disciplinas de graduação da Faculdade de Direito, e mesmo de seu curso de pós-graduação, a centralidade do professor no processo formativo é ainda impressionante. Esse modelo, baseado na “transmissão” do “saber”, mostra-se mais preocupado com o “conteúdo” das disciplinas do que com a aquisição de habilidades e competências necessárias ao exercício das profissões jurídicas pelo estudante. Sabe-se, no entanto, que o estudante só torna seu o conhecimento que ele mesmo constrói de modo operativo, que o leva a modificar o como e o porquê de seu fazer. Além disso, o modelo que adotamos, baseado em aulas expositivas, implica desperdício de energia, que poderia ser sinergicamente canalizada para outras atividades, como a pesquisa. Cada disciplina obrigatória (a esmagadora maioria do currículo, muito pouco flexível) é ofertada em quatro turmas por semestre, geralmente assumida por dois professores, que têm que repetir a aula ministrada em duas turmas. Não há muita diferença se uma aula expositiva é dada para 20 ou 100 estudantes. Poderíamos ter um modelo de ensino mais vinculado à pesquisa e à autonomia do estudante se a aula expositiva fosse realizada em um pequeno auditório para 100 estudantes, grupo que depois seria desmembrado em seminários menores em que se discutiriam temas e textos ligados à primeira aula (poderíamos contar com a colaboração dos estudantes de pós-graduação para auxiliar os professores a conduzirem esses seminários). Isso demandaria a construção de, pelo menos, 10 auditórios de 100 lugares e 40 salas de 25 lugares (em que as carteiras seriam substituídas por módulos que comporiam layouts variáveis). Essas salas e os auditórios também deveriam contar com recursos tecnológicos mais adequados para o século 21. As canetas e cadernos foram substituídos por notebooks e tablets, e a tendência é que o número desses equipamentos em sala de aula aumente com o tempo. Se as salas e auditórios não possuírem tomadas elétricas suficientes para seus usuários e rede wireless, em pouco tempo ficarão disfuncionais. Por outro lado, salas assim equipadas podem levar o computador a estalecer novas interações professor-estudante.

A falta de relação entre extensão e ensino. Apesar de toda a retórica da integração da extensão ao ensino e à pesquisa, a vida da universidade ainda se estrutura mais nessas duas que na primeira das atividades. Por que os trabalhos de conclusão de curso têm que ser modalidades ligadas exclusivamente à pesquisa (monografias), e não à extensão, sobretudo em uma ciência social aplicada, como o Direito? A possibilidade de adotar tal medida é compatível com a resolução CNE/CES 9, de 29 de setembro de 2004, que estabelece as diretrizes curriculares para o curso de graduação em Direito. No entanto, seria necessário ampliar substancialmente o espaço físico destinado à extensão universitária, para comportar todos os estudantes que quisessem realizar seu trabalho de conclusão na modalidade extensionista.

A diferença entre o ensino diurno e o noturno. É possível que estudantes e professores não cheguem ao campus antes das 19h30, tendo em vista o horário de encerramento do expediente forense, só retornando às suas casas depois de 22h. O primeiro modo de enfrentar esse problema é rever a importância da sala de aula no processo educativo, integralizando parte da carga horária com atividades de pesquisa, extensão e ensino a distância (Resolução CNE/CES 3, de 2 de julho de 2007). O segundo é adotarmos um horário nominal que não corresponda, na maioria dos casos, ao real (havendo, ainda, o problema da integralização dos créditos referentes às disciplinas optativas). E o terceiro, que me parece o melhor deles, consiste em ter a coragem de decidir o que a Face fez em relação ao seu curso noturno de Administração de Empresas: aumentar a duração em um ano, de modo que a graduação diurna em Direito duraria cinco anos e a noturna, seis.

O tamanho da graduação. Para se ter uma ideia da expansão dos cursos de Direito, em 1991 havia, no Brasil, 165 cursos. Em 2011, eram 1174, sendo 148 somente em Minas Gerais. É evidente que a maioria desses cursos é de baixa qualidade. A grande maioria de seus egressos não é aprovada no Exame de Ordem nem em concursos públicos para cargos jurídicos. Em consequência disso, apesar do número de bacharéis em Direito, o Brasil é dos países com pior serviço jurídico prestado a seus cidadãos. É provável que o estudante que tenha ficado em 300º lugar no vestibular da UFMG seja tão bom quanto a média dos estudantes aprovados nas 200 vagas do curso. Poderíamos aumentar as vagas semestrais para pelo menos 300, aproveitando a possível implantação de um Reuni II e prestando um grande serviço ao Brasil e a Minas Gerais.

*Professor da Faculdade de Direito da UFMG