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Nº 1769 - Ano 38
2.4.2012

Acesso sem inclusão

Tese da Face relaciona expansão do sistema financeiro com a redução das taxas de pobreza

Flávio de Almeida

A expansão do sistema financeiro em 10% resulta na redução da taxa de pobreza em 1%. Se o número de agências bancárias por habitante também sobe 10%, essa diminuição é ainda maior: 15%. Esses dois dados, que constam de estudo feito pela economista Tânia Marta Maia Fialho, são indicativos do efeito que o crescimento – no primeiro caso – e o acesso ao sistema financeiro – no segundo – exercem sobre a melhoria das condições de vida das camadas mais pobres da população.

“Meu objetivo foi focar diretamente a correlação entre pobreza e desenvolvimento do sistema financeiro”, diz Tânia Fialho, professora de economia da Unimontes, ao mencionar a principal inovação de sua pesquisa, defendida em fevereiro como tese de doutorado no Programa de Pós-graduação em Economia do Cedeplar/Face. Segundo ela, muitos estudos foram desenvolvidos na última década sobre o assunto, mas, em sua maioria, eles estabeleciam uma relação indireta entre as duas dimensões, sempre mediada pelo crescimento econômico e por seus efeitos, como geração de emprego e renda.

A pesquisa compreende o período de 1995 a 2008, marcado pela estabilização da economia – com a queda das taxas de inflação e valorização da moeda nacional – e pela expansão dos níveis de acesso aos serviços bancários, principalmente pela população mais pobre. “O sistema financeiro brasileiro sempre apresentou baixa capilaridade quando se considera a extensão geográfica do país. Com o advento dos programas e políticas públicas de garantia de renda mínima e com o crescimento real do salário-mínimo, ele teve que se adaptar a essa nova realidade”, diz Tânia Fialho.

Embora o número de agências não tenha registrado crescimento expressivo, o sistema foi reforçado com a criação, sobretudo a partir de meados dos anos 1990, de postos avançados de atendimento, caixas eletrônicos e correspondentes – empresas que prestam serviços a instituições financeiras, sob contrato.  “Relatório do Banco Central publicado em 2010 revela que, dos 5.565 municípios existentes no Brasil à época, apenas 34 não contavam com algum tipo de serviço bancário”, ilustra a professora. 

Baixa eficiência

Se a questão do acesso apresentou certa evolução, o mesmo não se pode dizer da chamada inclusão financeira. Foi o que constatou o estudo ao avaliar que o sistema não se mostrou capaz de reduzir a taxa de pobreza, uma vez que mantém custos elevados. “Ele é ineficiente no sentido de que não consegue alcançar a população pobre com concessão de crédito adequado às suas características e necessidades”, explica Tânia. Em outras palavras: o pobre vai ao banco todo mês apenas para sacar o benefício a que tem direito e sequer cogita procurar o gerente para negociar um empréstimo.

Na visão da professora, a inclusão financeira é desafio que precisa ser enfrentado, tendo sido tema, em setembro de 2010, de discussões dos representantes do G20 – formado pelos ministros das finanças e dirigentes dos bancos centrais das 19 maiores economias do mundo, mais a União Europeia.

Tânia Fialho planeja aprofundar seus estudos. “Quero fazer uma análise específica em relação às transferências de renda, correlacionando-as com o sistema financeiro. Tentarei identificar o peso de sua movimentação sobre o sistema”, ela diz. Os programas de transferência de renda estão entre os principais responsáveis pela ascensão, nos últimos anos, de cerca de 30 milhões de brasileiros à chamada sociedade do consumo.

Metodologias cruzadas

O estudo foi construído a partir de ampla revisão da literatura nacional e internacional sobre o tema e com o uso de duas metodologias. A primeira é a chamada correlação canônica, que, segundo Tânia Fialho, permitiu cruzar seis variáveis relacionadas à pobreza e à renda com outras seis vinculadas ao sistema financeiro.

No primeiro grupo, figuram a taxa de pobreza, o grau de informalidade, a média de anos de estudos, a taxa de desemprego, o índice de desigualdade Gini (desenvolvido pelo estatístico italiano Corrado Gini) e a taxa de crescimento da renda domiciliar per capita média. Já o segundo conjunto é composto pelas variáveis tamanho, acesso, inclusão financeira, preferência pela liquidez do público, preferência pela liquidez do banco e eficiência do sistema.

O outro método, adotado de forma complementar, são os chamados dados em painel que, como o próprio nome sugere, baseia-se na criação de painel com as informações das 26 unidades da federação e o Distrito Federal referentes à série de 14 anos coberta pelo estudo. “O objetivo aqui é ajustar as diferenças interestaduais, evitar que elas enviesem os resultados da análise. Não dá, por exemplo, para comparar os estados do Nordeste com os do Sudeste ou do Sul do país”, explica a professora.



Tese: Desenvolvimento do sistema financeiro e pobreza no Brasil (1995-2008)
Autora: Tânia Marta Maia Fialho
Orientador: Frederico Gonzaga Jayme Jr.
Co-orientadora: Ana Maria Hermeto
Defesa em 14 de fevereiro de 2012
Programa: Pós-graduação em Economia do Cedeplar/Face