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Nº 1690 - Ano 36
12.4.2010

Preservar dá lucro

Estudo mostra que investimentos em beneficiamento e certificação da extração da castanha-do-brasil podem ajudar a conservar a Floresta Amazônica

Igor Lage

Em forma de doce, sorvete, farinha e até pura. A castanha-do-brasil, também conhecida como castanha-do-pará, é consumida de diversas maneiras em diferentes países. Mas a semente da castanheira é muito mais do que um alimento saboroso e de alto valor nutritivo. Estudos do pesquisador Felipe Santos Nunes, do Programa de Pós-graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Instituto de Geociências (IGC), revelam que a atividade de extração da castanha-do-brasil é também uma alternativa eficiente para evitar a destruição da Floresta Amazônica.

Em dissertação defendida em março deste ano, Felipe Nunes expõe conclusões que sinalizam que é possível aliar o aumento da rentabilidade do processo extrativista à prevenção ambiental. “O estudo mostra que as áreas da floresta com vocação para o extrativismo podem ser rentáveis sem que sejam utilizadas para agricultura e pecuária, atividades mais agressivas ao ecossistema”, afirma Nunes.

Para simular as situações de comparação entre produtividade e rentabilidade do produto, foi escolhida a região de Madre de Dios, Peru, que faz fronteira com o departamento de Pando na Bolívia e o estado do Acre no Brasil. “Optamos por essa área porque lá encontramos uma cadeia produtiva consolidada de castanha-do-brasil, além de uma altíssima densidade de castanheiras”, explica o pesquisador. A partir dos dados coletados em trabalhos de campo na região, ele criou, a partir de modelos espaciais, três cenários baseados nos diferentes níveis de beneficiamento e produtos comercializados.

O primeiro indicou que, quando a castanha era vendida com casca (sem beneficiamento), a renda anual da região, obtida em dólares, era de US$3,67 milhões. A segunda situação serviu para estimar a rentabilidade da castanha sem casca (beneficiada) e o resultado foi bem mais significativo: US$9,45 milhões por ano. No terceiro e último cenário, analisou-se a rentabilidade da castanha beneficiada e certificada, e o resultado da rentabilidade anual foi de US$10,2 milhões. As três simulações tomaram como referência área de um milhão de hectares.

Segundo Felipe Nunes, os dados comprovam que a extração da castanha do Brasil, quando realizada com os subsídios necessários, é rentável e contibui para a preservação da Floresta Amazônica. Ele explica que, como a renda com a castanha beneficiada e/ou certificada é maior, os coletores não precisariam obrigatoriamente recorrer a outras atividades durante o ano, após o período de extração, para aumentar a renda familiar, como a pecuária e a agricultura. “Os coletores em Madre de Dios são concessionários, e não proprietários das terras. Além disso, muitos deles não têm acesso aos processos de beneficiamento do produto”, conta o pesquisador, lembrando que a exploração da castanheira, mesmo realizada somente na época chuvosa (entre os meses de dezembro e abril), é uma das principais atividades econômicas da região, empregando cerca de 30 mil pessoas.

Floresta em pé

O pesquisador conta que o primeiro passo foi realizar um trabalho de campo para coletar dados como a densidade de castanheiras da região, os limites das concessões, a produção das árvores e outras informações geográficas. A segunda etapa consistiu em “calibrar” os processos, ajustando numericamente as informações obtidas na fase anterior. Depois disso, foram criados os modelos, que, em seguida, são confrontados com os dados reais para verificar sua plausibilidade, em um processo chamado de “validação”.

Os resultados da pesquisa mostram que a atividade extrativista também pode ser beneficiada por projetos REDD. Trata-se da sigla para Reducing Emissions from Deforestation and Forest Degradation (em português, Redução de Emissões de Desmatamento e Degradação Florestal), mecanismo voltado para concessão de recursos financeiros a atividades que utilizam a floresta sem derrubá-la. “A exploração da castanha-do-brasil, se realizada com práticas sustentáveis e com recursos necessários, pode ser rentável e ajuda a manter a floresta em pé”, analisa Felipe Nunes.

Com a dissertação, Felipe encerra a primeira etapa do projeto: “O próximo passo é estimar a rentabilidade para as regiões da Bolívia e Brasil e comparar a rentabilidade da exploração da castanha com outras atividades, como a agricultura e a pecuária. Também pretendo desenvolver estudos de longo prazo com projeções sobre a produção da castanha-do-brasil”, conclui o pesquisador.

Dissertação: Valorando a floresta em Madre de Dios: um modelo espacial para a rentabilidade da castanha-do-brasil
Autor: Felipe Santos de Miranda Nunes
Orientador: Britaldo Silveira Soares Filho
Co-orientador: Ricardo Alexandrino Garcia
Defesa: 5 de março, junto ao Programa de Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais