Busca no site da UFMG

Nº 1731 - Ano 37
28.03.2011


FOTOGRAFAR e PROTEGER

Tese defendida na Belas-Artes propõe método que usa a fotografia para compreensão de mudanças ambientais

Itamar Rigueira Jr.

Manuscrito
Panorama da Serra de Itabirito, com destaque para o Pico do Itabirito: fotos em alta definição permitem análise de pequenas porções da imagem

Fotografar a natureza já foi considerado absurdo por profissionais do quilate de Henri Cartier-Bresson, que na década de 1930 criticou colegas que apontavam suas câmeras para paisagens, enquanto outros registravam os efeitos da grande depressão econômica e a ascensão do nazismo na Europa.

Manuscrito
Pico do Itabirito: fotos em alta definição permitem análise de pequenas porções da imagem

Nos dias atuais, o foco na paisagem pode ter papel político crucial, ao servir de subsídio para a discussão sobre como as sociedades vêm tratando os ecossistemas. Essa é a base de inspiração do professor Paulo Baptista, da Escola de Belas-Artes (EBA) da UFMG, para os estudos que culminaram em sua tese de doutorado. Ele propõe a prática de um modelo de interpretação fotográfica da paisagem que une produção pessoal ao uso instrumental das imagens em estudos de geografia, ciências biológicas e planejamento urbano, entre outras áreas.

“Demonstro que é viável a execução de trabalhos nessa linha, com a utilização de equipamentos e técnicas de foto digital em alta resolução, associados a métodos informatizados de cartografia e georreferenciamento das imagens”, escreveu Baptista em seu trabalho.

O equipamento principal é uma câmera de grande formato, acoplada a um dispositivo de captura digital de imagens por varredura. O conjunto é controlado por um computador portátil. O modelo permite resolução de captura de até 108 megapixels e integra estrutura de pesquisa do Laboratório de Documentação Científica por Imagem da EBA, onde se desenvolvem documentação do patrimônio cultural e natural. O georreferenciamento das fotografias usou programas que extraem dados obtidos pelos receptores GPS e os armazenam em formatos compatíveis com um grande número de aplicações cartográficas. A localização é apoiada em cartas topográficas do IBGE e em mapas dos sistemas Google Earth e Google Maps.

Ameaças ao Espinhaço

Paulo Baptista escolheu duas áreas da Serra do Espinhaço que sofrem ameaças de transformação por ocupações socioeconômicas e ambientais. Na região entre Serro e Diamantina, passando por povoados como Milho Verde e São Gonçalo do Rio das Pedras, ele identificou perigo no asfaltamento do trecho remanescente da Estrada Real. Para ele, isso deve transformar radicalmente a vida das comunidades, já que vai aumentar exponencialmente o movimento de veículos, incluindo caminhões de carga.

Já na parte Sul do Espinhaço, próximo a Belo Horizonte, um grande projeto de mineração pode, de acordo com Baptista, descaracterizar a última área ambientalmente preservada do Quadrilátero Ferrífero. “A serra do Gandarela conserva espécies de Mata Atlântica e de campos rupestres ferruginosos, geossistema muito raro no Brasil, e abriga biodiversidade ímpar”, justifica.

Uma das referências do pesquisador é o trabalho do americano Mark Klett, que refotografou, nas décadas de 1970 e 1990, paisagens registradas no século 19 por expedições que mapearam o território dos Estados Unidos, visando ao planejamento da ocupação do país. Klett fez imagens dos mesmos pontos de vista, nas mesmas épocas, dias e horários das antigas fotos, obtendo margem de precisão medida em centímetros.

“Minha intenção original para a pesquisa era ‘refazer’ fotos que já existissem, mas não se encontra quase nada dessa região nos acervos. Então, proponho metodologia para um trabalho que se faça daqui para frente”, explica Baptista, graduado em engenharia eletrônica com mestrado – também na EBA – sobre a transição dos processos químicos para os digitais em fotografia.

Ele está certo de que sua proposta tem alto teor de ineditismo no Brasil e pode fortalecer a ponte entre a fotografia e as geociências. “Para fotografar, preciso entender um pouco de geografia, e os geógrafos terão com a fotografia mais subsídios para seu trabalho. É uma colaboração que tem tudo para ser muito frutífera”, acredita Paulo Baptista.

Tese: Panoramas da Serra do Espinhaço: ensaio de mapeamento fotográfico da paisagem
De Paulo Baptista, orientado por Heitor Capuzzo Filho
Defesa: novembro de 2010, no programa de pós-graduação em Artes da EBA