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Nº 1884 - Ano 41
10.11.2014

Encarte

opiniao

Um site para lidar com a dislexia

Ângela Maria Vieira Pinheiro*

Os indivíduos acometidos pela condição denominada “dislexia” apresentam dificuldade, de origem neurológica, na aprendizagem da leitura e da escrita que, apesar de persistente, pode ter seus sinais comportamentais minimizados por meio de um ensino apropriado. Quanto mais cedo essa intervenção ocorrer, maiores serão os ganhos nas habilidades de leitura e na redução dos problemas emocionais e comportamentais associados à dislexia. Daí a necessidade de os professores serem capacitados a identificar os sinais de risco dessa condição, a fim de prover ensino adequado às crianças diagnosticadas com dislexia por profissionais habilitados.

Tendo como uma de suas estratégias a promoção de uma educação de qualidade para todos, a Dyslexia International (ONG sem fins lucrativos, registrada na Bélgica, com relações operacionais com a Unesco), apoiada pelo Ministério de Educação Superior belga, reuniu importantes pesquisadores de todo o mundo e os últimos achados científicos para criar uma plataforma online para a capacitação de professores alfabetizadores de crianças, com foco naquelas com dislexia.

As versões em francês e inglês dessa plataforma foram apresentadas no I Fórum Mundial de Dislexia, realizado na sede da Unesco, em Paris, em 2010. No Brasil, a versão inglesa foi adaptada, sob minha ­coordenação, para o nosso contexto sociolinguístico e passou a se chamar Dislexia Brasil. Em apenas um ano de disponibilização, sem qualquer custo, como recurso aberto de educação, o site (www.dislexiabrasil.com.br) já tem mais de 32 mil usuários, o que evidencia a forte aceitação do tema em nosso país.

Com linguagem acessível aos professores, essa plataforma, como as versões que deram origem a ela, leva o usuário a conhecer a dislexia, a identificar os sinais de risco dessa condição e a lidar com os disléxicos em sala de aula. Como a intervenção objetiva a alfabetização, o conteúdo aprendido beneficia o ensino de todos os alunos da turma.

Os resultados do primeiro estudo sobre a apreciação do site Dislexia Brasil por professores foram apresentados no II Fórum Mundial de Dislexia (IIWDF), realizado de 18 a 20 de agosto, na UFMG. A totalidade dos participantes considerou o conteúdo do site pertinente para aplicação em sala de aula e a grande maioria avaliou positivamente as suas diferentes seções. Em outro estudo, um questionário sobre as informações contidas no site foi aplicado entre professores que não tiveram acesso a ele. Ficou constatado que a maior parte desses professores tem conhecimento de baixo a mediano dos conteúdos tratados pelo site, o que justifica a sua utilização em larga escala.

Entre os 500 participantes do IIWDF, incluindo os seus palestrantes – 25 cientistas estrangeiros de destaque e 15 pesquisadores brasileiros –, houve consenso sobre a necessidade de se avançar com a implantação do curso para a formação básica de professores em todo o Brasil. Em virtude disso, o grupo de participantes da mesa-redonda Curso online – fundamentos, avaliação, adaptação para outros idiomas e desenvolvimentos futuros, realizada no Fórum, elaborou petição sobre a implantação do site Dislexia Brasil na preparação de professores nos cursos de pedagogia e na formação continuada, para capacitar esses profissionais para ­alfabetizar, não só as crianças disléxicas, mas também as crianças, adultos e adolescentes com todos os níveis de capacidade.

A proposta consiste em apresentar a plataforma Dislexia Brasil para as autoridades da área da educação e coordenar a sua implantação, inicialmente em nível estadual e, posteriormente, em âmbito nacional. É importante ressaltar que o curso representa o conhecimento e a experiência em alfabetização e em dificuldades de aprendizagem acumulados nas últimas décadas por autoridades no assunto, de diferentes partes do mundo. O que está sendo oferecido é uma formação gratuita, validada e adaptada ao contexto brasileiro, no qual existe uma demanda sem precedentes.

A oportunidade de se adotar esse curso no âmbito da preparação de professores e na formação continuada daqueles em exercício possibilitará ao Brasil se equiparar aos líderes mundiais em “boas práticas de ensino da leitura e da escrita”, tanto para alunos com desenvolvimento típico quanto para os que apresentam transtornos de aprendizagem, de modo que o potencial de todos seja aproveitado. Será também um passo importante para reverter a situação em que as crianças fracassam na escola e se tornam um dreno econômico para a sociedade ao longo de suas vidas.

Entre as seis medidas propostas pela referida petição, ressaltamos a contribuição dessa iniciativa para a concretização da meta do Plano Nacional de Educação, de 24 de junho de 2014, sobre a formação ­conti­nua­da de professores, que visa capacitá-los a preparar as crianças da pré-escola para a alfabetização, a realizar a identificação precoce de dificuldades e transtornos de leitura e a alfabetizar adequadamente nos anos iniciais do ensino fundamental.

*Professora do Departamento de Psicologia da Fafich. Presidiu o IIWDF (http://dislexiabrasil.com.br/wdforum2014/).