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Nº 1982 - Ano 43
19.06.2017
Ana Rita Araújo
Em contraposição à avalanche de notícias sobre crimes e à fantasia da felicidade imperturbável, postagens mostram vidas imperfeitas de pessoas comuns que superam momentos ruins do cotidiano. Com essa estratégia, o projeto Veículo Inspirador de Amanhãs Solidários (V.I.D.A.S.), da Faculdade de Medicina, pretende atuar como prevenção ao suicídio, ao disseminar mensagens de esperança nas redes sociais. De acordo com o coordenador do projeto, professor Humberto Correa, embora o autoextermínio seja um fenômeno complexo, sabe-se que a desesperança é um dos fatores de risco. "Apesar do bombardeio de más notícias, coisas boas acontecem a todo momento, e o ser humano é capaz de atos de altruísmo", enfatiza.
O projeto foi idealizado com o intuito de criar uma rede positiva e um ambiente de solidariedade, capazes de aumentar a esperança. A intenção é propor novos olhares e discussões a quem busca, pelas redes sociais, alternativas para lidar com os problemas do dia a dia. Além do compartilhamento de relatos, experiências e mensagens positivas, está prevista a divulgação de posts educativos sobre a depressão e outras doenças mentais, orientando as pessoas sobre sintomas e formas de buscar ajuda.
Realizada em parceria com a empresa de marketing digital Chá de Conteúdo, a iniciativa conta com a participação de quatro estudantes de Medicina e é aberta a alunos de outros cursos. A equipe seleciona materiais de interesse nos mais diversos veículos, produz imagens e identidade visual e compartilha nos perfis facebook e instagram. Humberto Correa explica que as redes sociais foram escolhidas por favorecer o diálogo com o público jovem, já que pessoas da faixa etária de 15 a 35 anos figuram em grupo considerado de risco.
Presidente da Associação Latino-americana de Suicidologia e da Associação Brasileira para o Estudo e a Prevenção do Suicídio, o professor do Departamento de Saúde Mental informa que, nos últimos dez anos, houve crescimento de 20% no autoextermínio no país, principalmente entre jovens e adolescentes. Ele comenta que, apesar de grave problema de saúde pública, o tema ainda é tabu, envolvido em atmosfera de medo ou vergonha, o que se reflete no reduzido financiamento à pesquisa. "Mas o interesse por estudos na área tem crescido", contrapõe.
Entre as causas desse fenômeno, estão, segundo ele, a doença mental – a depressão é a mais frequente – e questões sociais, culturais "e até biológicas". Como exemplo de fator social, Humberto Correa cita a crise econômica e o uso de álcool e de outras drogas e também destaca o peso de uma sociedade individualista, com estruturas que estimulam a competição e enfraquecem os laços sociais.
A psicóloga Cínthia Demaria, que também é jornalista da agência Chá de Conteúdo, comenta que o esgarçamento dos laços entre as pessoas – substituídos cada vez mais por relações superficiais e passageiras nas redes sociais – e a intolerância às frustrações, levam facilmente à depressão. "O que estamos expondo no projeto são alternativas para vidas imperfeitas, mostrando a possibilidade de superar dificuldades", afirma. Inspirado inicialmente na ideia de se contrapor a um seriado em que a personagem enumera 13 razões que a levaram a cometer suicídio, o trabalho da equipe coordenada por Humberto Correa pretende divulgar e fomentar aspectos positivos do ser humano, como atos solidários, de altruísmo e de generosidade, "em geral esquecidos pela grande mídia, que só divulga os aspectos negativos da sociedade e das pessoas".
Segundo Cínthia Demaria, o projeto tem duas vertentes, pois conversa com os que procuram ajuda e, ao mesmo tempo, abre espaço para que pessoas de todo o país possam enviar conteúdo "para contribuir no salvamento de vidas". Com mediação da equipe do projeto, os internautas podem enviar relatos sobre eventos, atitudes ou experiências que fizeram diferença em suas vidas. A equipe também responde a dúvidas enviadas como mensagens privadas. "A ideia é criar um canal de solidariedade e de boas notícias", reitera.
Cínthia Demaria explica que os perfis ainda são pouco conhecidos, pois o projeto ainda não teve lançamento oficial. Mesmo assim, a página no Facebook já exibe comentários como o de uma seguidora, que afirma: "Muito bom ter um espaço para desabafar nos momentos de solidão".
Tão logo o projeto amplie seu alcance, serão publicados desafios e campanhas pontuais. "Queremos lançar um game, responder a perguntas do público e pedir, por exemplo, que os internautas nos enviem seus 13 motivos para viver", conta a jornalista. Ela esclarece que a equipe pretende monitorar o número de acessos e o alcance das campanhas, mas o objetivo final é "mudar as métricas do suicídio".