Heloisa Starling
Entre 1964 e 1970, a ditadura militar criou um sistema reticulado que abrigou o vasto dispositivo de coleta e análise de informações e de execução da repressão no Brasil. O centro desse sistema era o Serviço Nacional de Informações (SNI), um órgão de coleta de informações e de inteligência que funcionava de duas maneiras: como um organismo de formulação de diretrizes para elaboração de estratégias no âmbito da presidência da República e como o núcleo principal de uma rede de informações atuando dentro da sociedade e em todos os níveis da administração pública. A estrutura do SNI fornecia ao sistema uma capilaridade sem precedentes ramificando-se através das agências regionais; das Divisões de Segurança e Informações (DSI), instaladas em cada ministério civil; das Assessorias de Segurança e Informação (ASI), criadas em cada órgão público e autarquia federal.
Até 1967, a ditadura se utilizou da estrutura de repressão já existente nos estados, mobilizando os Departamentos de Ordem Política e Social, subordinados às Secretarias de Segurança Pública e os policiais civis lotados nas Delegacias de Furtos e Roubos, famosos pelo uso da violência e a prática da corrupção. A máquina de repressão começou a tomar nova forma em maio de 1967, com a criação do Centro de Informações do Exército (CIE). O CIE atuava simultaneamente na coleta de informações e na repressão direta e foi provavelmente a peça mais letal de todo o aparato da ditadura. Tão temidos quanto o CIE eram o Centro de Informações da Marinha (CENIMAR), criado em 1957 e o Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (CISA), montado em 1970.
A partir de 1969, o sistema de coleta e análise de informações e de execução da repressão tornou-se maior e mais sofisticada com a criação, em São Paulo, da “Operação Bandeirantes”, (OBAN) um organismo misto formado por oficiais das três Forças e por policiais civis e militares, e programada para combinar a coleta de informações com interrogatório e operações de combate. A OBAN foi financiada por empresários paulistas que estabeleceram um sistema fixo de contribuições – cujo funcionamento é, até hoje, um dos mais bem guardados segredos da ditadura. Também serviu de modelo para a criação, em 1970, dos Centros de Operação e Defesa Interna (CODI) e os Destacamentos de Operação Interna (DOI). Os CODI-DOI estavam sob o comando do ministro de Exército, Orlando Geisel, conduziram a maior parte das operações de repressão nas cidades e atuavam sempre em conjunto: os CODI como unidades de planejamento e coordenação; os DOI subordinados aos CODI se conduziam como seus braços operacionais.
Os documentos disponíveis são de natureza variada e graus diferenciados de sigilo: confidenciais, sigilosos, ultrassecretos. Trazem informações sobre a organização de órgãos integrantes do sistema de coleta e análise de informações e de execução da repressão no Brasil; organização de arquivos sigilosos por órgãos de inteligência e repressão das Forças Armadas; códigos para cifragem e decifragem de comunicação de rádio em operações militares; planejamento e avaliação de ações; operações de monitoramento.
Para saber mais:
FIGUEIREDO, Lucas. Lugar nenhum; militares e civis na ocultação dos documentos da ditadura. São Paulo: Companhia das Letras, 2015;
FIGUEIREDO, Lucas. Ministério do silêncio; a história do serviço secreto brasileiro de Washington Luís a Lula (1927-2005). Rio de Janeiro: Record, 2005;
FICO, Carlos. Como eles agiam; os subterrâneos da ditadura militar; espionagem e polícia política. Rio de Janeiro: Record, 2001;
QUADRAT, Samantha Viz. Poder e informação: o sistema de inteligência e o regime militar no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ/PPGHIS, 2000;
JOFFILY, Mariana. No centro da engrenagem; os interrogatórios na Operação Bandeirante e no DOI de São Paulo (1969-1975). São Paulo: EDUSP, 2013;
GODOY, Marcelo. A casa da vovó; uma biografia do DOI-Codi (1969-1991), o centro de seqüestro, tortura e morte da ditadura militar. São Paulo: Alameda, 2014.
2.1. CENIMAR
2.2. CIE
2.3. CISA
2.4. SNI
2.5. CODI-Doi
2.6. DOPS/DEOPS
2.7. Outros órgãos