Flávio Carsalade abre série especial sobre Corredor Cultural Praça da Estação em novo episódio de podcast

Flávio Carsalade abre série especial sobre Corredor Cultural Praça da Estação em novo episódio de podcast

Neste segundo semestre o Corredor Cultural 174 traz uma série especial sobre o berço e ponto de partida desse podcast: o Corredor Cultural Praça da Estação. Essa área tão importante do baixo centro de Belo Horizonte ainda carrega o estigma de ser marginalizada e, consequentemente, nem todos os belo-horizontinos frequentam ou têm uma identificação afetiva com o espaço. Ainda assim, as manifestações culturais insurgentes e populares, a ocupação do espaço público e as diversas vozes e corpos que recorrem ao local mostram sua potência como zona cultural.

O primeiro episódio da série traz um bate-papo sobre a Praça da Estação e sua importância urbanística e cultural para a cidade de Belo Horizonte. O convidado para essa conversa é o arquiteto, urbanista e professor da Escola de Arquitetura da UFMG Flávio de Lemos Carsalade.

Ele foi presidente do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas de Gerais, o Iepha, e membro do conselho curador do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan. É diretor da Editora UFMG e presidente do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios, o Icomos, uma organização não governamental global associada à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, a Unesco.

História

No podcast, Flávio relata que a Praça da Estação é considerada o lugar mais antigo de Belo Horizonte, o início de tudo, o berço físico e real do município. Os materiais de construção da capital chegavam pela linha férrea, desse modo, a primeira pedra que construiu a cidade chegou à Praça da Estação. À medida que os anos se passaram ela também passou a ser uma grande porta de entrada da cidade, até que a ferrovia começou a ser substituída pelas rodovias.

Carsalade explica que quando se tem uma linha férrea é natural que junto dela apareçam núcleos para estocagem de cargas e, ao mesmo tempo, se instale o comércio local, até pela circulação de passageiros no entorno da estação ferroviária. Foi assim em BH, enquanto durou o apogeu da ferrovia no Brasil, nas primeiras décadas do século XX, muitos galpões foram construídos para receber as mercadorias que desembarcavam na Praça da Estação, estabelecendo o comércio na região.

Ele relembra que o terminal rodoviário foi sede do primeiro mercado municipal de BH, que logo depois veio a ser uma feira de amostras. Então, entre a Praça da Estação e a atual rodoviária estabeleceu-se um comércio popular com a chegada dos bens e a sua distribuição, o binômio estação/mercado. Essa tradição permaneceu ao longo do tempo e as ruas que ladeiam a estação ferroviária continuaram sendo lugares do comércio popular, ainda que os galpões tenham sido desativados e muitos deles, por sua vez, transformados em espaços comerciais de varejo.

Edificações

O arquiteto delineia as primeiras construções no largo da estação férrea e destaca a Casa do Conde de Santa Marinha, residência que pertencia a um empreiteiro ligado as obras da nova Capital do Estado, onde hoje funciona a sede do Iphan. Ele evidencia também o Centro Cultural UFMG e a edificação original da estação, que depois foi demolida para uma nova construção, que atualmente reconhecemos como a Estação Central de BH.

Com o desenvolvimento da cidade outras obras importantes começaram a aparecer, como os hotéis Itatiaia e o Sul América Palace e, posteriormente, o Edifício Central, relatando uma cronologia mais expandida.

Flávio conta que houve um processo de demolição e substituição de edifícios muito grande na região, mas que a Rua dos Caetés e a Rua Guaicurus ainda conservam diversas edificações do início da cidade. Muitas delas foram descaracterizadas com o tempo e outras se encontram em condições extremamente precárias, pois como não eram protegidas pelo Patrimônio, acabaram recebendo em suas fachadas lambris de alumínio e letreiros luminosos enormes, forma que utilizavam para mostrar e chamar atenção das mercadorias na época.

Renovação urbana

O urbanista menciona o potencial de renovação urbana do centro da cidade a partir dos espaços desativados e ociosos – em sua maioria de propriedade da Rede Ferroviária Federal – e a transformação em um ‘Parque Linear’. O referido projeto, do qual é coautor, recebeu menção honrosa no Concurso Nacional BHCentro em 1989, promovido pela Prefeitura de Belo Horizonte, que selecionou ideias de revitalização de algumas áreas de maior valor simbólico do centro, como a região da Praça da Estação, mas infelizmente não saiu do papel.

A proposta do ‘Parque Linear do Arrudas’ continua bastante atual e pretende aproveitar as amplas faixas de terreno disponíveis, sem vias de automóveis, para viabilizar a ligação urbana entre Rodoviária, Estação Lagoinha e Serraria Souza Pinto, sentido Leste-Oeste, e entre a ‘cidade baixa’ (Centro) e ‘cidade alta’ (Floresta/Colégio Batista), sentido Norte-Sul, através de uma extensa laje sobre a linha férrea e a Avenida do Contorno, como via de passagem para pedestres. O High Line, em Nova Iorque, é um modelo exemplar de parque linear e ressignificação do espaço público.

Baixo centro

Carsalade explica a expressão ‘baixo centro’ de BH, região onde tudo acontece com um pouco mais de liberdade e vitalidade, termo que também se confunde com a própria geografia do espaço, pelo fato de estar no ponto mais baixo da cidade, área de passagem do Ribeirão Arrudas e das linhas férreas.

Esse território diversificado inclui o comércio ambulante, moradores em situação de rua, profissionais do sexo, grupos teatrais alternativos, local de troca de ônibus de muitas pessoas, naturalmente não frequentado pela elite, mas que é muito rico e vascularizado, apesar de muitos governantes traçarem um muro invisível para essa localidade.

O arquiteto relembra a gestão do ex-prefeito Marcio Lacerda, que em 2010 criou um decreto proibindo a realização de eventos de qualquer natureza na Praça da Estação. Essa decisão deu origem ao movimento ‘Praia da Estação’, após um grupo de jovens questionar a maneira como as pessoas ocupavam o espaço público da capital. A ação ganhou força e contribuiu para a formação de outras iniciativas centradas na ocupação do espaço público, como a retomada dos blocos de rua no carnaval de BH.

É inegável a vocação cultural da Praça da Estação, como ela contribui para a consolidação de valores culturais e estabelece vínculo entre as pessoas e o espaço público.

Ouça o podcast na íntegra e conheça as histórias da Praça da Estação e a sua importância urbanística e cultural para a cidade de Belo Horizonte:

Conheça o trabalho de Flávio Carsalade em: Instagram e Facebook.

Corredor Cultural 174 Podcast

Corredor Cultural 174 Podcast é um projeto que disponibiliza mensalmente no Spotify conversas com artistas, músicos, escritores, cineastas, agentes culturais e demais pessoas que pensam, respiram e produzem cultura. “Corredor”, pelo fato do Centro Cultural UFMG estar situado no corredor cultural Praça da Estação e também no sentido de espaço de passagem, onde transitam ideias, movimentos e expressões artísticas em Belo Horizonte. “Cultural”, pois a temática será sempre cultura e “174” é o número de localização da instituição na Avenida Santos Dumont.