Professor Geraldo Luiz Moreira Guedes

Gestão de 1986 a 1990

O Professor Geraldo Luiz Moreira Guedes foi Pró-reitor de Extensão no período de 1986 a 1990, durante a Gestão do Reitor Cid Veloso. Possui Doutorado em Medicina (Medicina Preventiva) pela Faculdade de Medicina Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (2000). Atualmente é Professor Associado da Universidade Federal de Minas Gerais. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Saúde Coletiva.                                                                                                                                                                                                                                                                                                   Texto informado no lattes.

 

Cevex: O Centro Virtual da Memória da Extensão tem como objetivo recuperar, reunir e divulgar a história da extensão na UFMG. Nós estamos entrevistando os ex pró-reitores, e o senhor foi pró-reitor de 1986 a 1990, e é um pouco sobre essa experiência que gostaríamos de escutá-lo, é um exercício de memória.

Prof. Geraldo: Eu vou ter que fazer um exercício de memória. São quantos anos… Eu saí daqui em 90, já são 26 para 27 anos. O tempo passa, voa… Quando eu era pró-reitor minhas meninas eram todas pequenininhas. Nas férias, minha esposa fazia uma pós-graduação nos prédios da PUC, não tinha com quem deixar as crianças e eu vinha com as 4 prá cá. Era tudo assim pequenininha, a gente dava papel e lápis para elas desenharem e eu podia trabalhar. Hoje a minha filha mais velha tem 40, e cinco netos, e aí eu faço a conta por isso. (Risos).

Cevex: A gente pensou que uma pergunta para disparar aí essa memória, esse exercício de retomar essa história, seria pensar como você chega na extensão, como é a sua experiência com extensão, e depois a sua chegada na pró-reitoria?

Prof. Geraldo: Então, eu fui o primeiro pró-reitor que era indicado pelo reitor. Vocês sabem que até 1986, no antigo ordenamento básico, as pró-reitorias acadêmicas eram colegiados. Você tinha o Conselho, e esse conselho com os representantes das unidades, era uma divisão do CEPE, eles escolhiam uma lista tríplice, e dessa lista tríplice o reitor indicava o presidente do conselho que seria o pró-reitor. Então, não era uma equipe que tomava posse, o reitor indicava um pró-reitor de planejamento, um pró-reitor de administração, que era o núcleo, e os seus assessores. E os pró-reitores acadêmicos eram os presidentes de conselho indicados por uma lista tríplice. Acontecia que durante o reitorado podia ter dois, três pró-reitores, porque estava ligado a um mandato do professor no conselho.

Cevex: Nem sempre coincidia com o período de gestão do reitor.

Prof. Geraldo: Não. Até porque os mandatos tinham durações diferentes, tinha professor que saia e você tinha que substituir, assumir um suplente, ou tinha que convocar outro. Tinha uma série de variáveis, e os conselhos eram muito mutáveis, e, portanto, os pró-reitores eram muito transitórios. E aí saiu o ordenamento básico, foi publicado em julho de 86, foi quando o professor Cid, tinha sido o primeiro reitor eleito por eleição direta da UFMG, ele esperou julho a publicação, a oficialização desse novo ordenamento básico para poder indicar os pró-reitores acadêmicos. Ele começou a gestão em março, e só indicou os dois pró-reitores, de planejamento e administração, e aguardou julho para indicar os quatro pró-reitores acadêmicos. Era a primeira equipe formada como um todo, a gestão de quatro anos. Então, nesse período de março a julho, ele manteve os pró-reitores acadêmicos que eram os presidentes dos Conselhos, e não tinha como ser diferente, ele tinha que manter, ele não podia indicar. Eles tinham o mandato deles que estavam vinculados ao mandato deles de conselheiro, então, era o professor Tomáz, eu não sei o período, mas ele era o conselheiro. Já tinha tido uma professora da medicina, a Elisabeth Lauar tinha ocupado também, nesse critério de rodízio, a pró-reitoria.

A minha trajetória é a seguinte, primeiro foi a inserção política na vida da universidade, eu já tinha uma inserção política na vida da universidade, era militante, desde a época da clandestinidade. E continuei militante e pertencia a uma célula na UFMG, logo que entrei como professor, fui para uma célula, um partido político clandestino. E assim, eu continuei militando no movimento docente, na entidade, na PUB, recém-criada e participando da vida. Veio a primeira eleição direta e nós criamos um grupo para estimular candidaturas das pessoas expressivas da vida universitária da época. E foi feito isso, surgiram algumas candidaturas, fruto dessa articulação, do estímulo, e uma dessas pessoas que foi estimulada a participar foi o professor Cid, ele era então diretor do Hospital das Clínicas, foi uma comissão lá com vários professores e o convencemos. Entre essas pessoas, estávamos eu, lembrando lá do seu departamento, o professor Zé Renato, a Rute Pina, o professor Bicalho, o pessoal da Fafich, o Pompeu da educação, já falecido. O Paulinho que foi diretor da Fafich na sua época, Délcio Vieira Salomon, Bicalho da filosofia, apaixonado por Sartre, talvez quem mais conhecia Sartre no Brasil. E assim nós fizemos também com Beatriz Alvarenga, nossa emérita professora, convencemos ela, e o professor Zé Alberto de Carvalho da economia. Nós queríamos estimular a preocupação de pessoas que tinham lutado contra a ditadura, expressões da vida pública. Foi um momento muito rico da vida nacional por isso estou fazendo esse preâmbulo, tanto é que nós estamos fazendo pela primeira vez uma eleição direta para reitor. Em 86 nós estávamos saindo da ditadura, substituindo o Figueiredo pelo Sarney, uma frustração do Tancredo, outro que morreu em uma hora…

E o Leandro Karnal ainda vem tentar me convencer, as pessoas sempre pensam em teorias conspiratórias, mas o acaso existe. Tá bom Leandro, ganhe o seu dinheirinho aí, fale o que o editor da band quer… Porque dá uma tristeza, o cara que apareceu nas mídias falando coisas que chamavam a atenção e que se dizia preocupado com as coisas que viriam a acontecer no Brasil, eu vi uns vídeos dele, e achava que ele tinha alguma propriedade, mas o que ele estava querendo era um lugarzinho na mídia, ganhar um dinheirinho, e conseguiu. Eu não ouço mais jornal, mas por acaso eu liguei na band para ver como estava o trânsito, mas depois do Karnal eu desliguei. (Risos).

Tirando essa digressão do momento, era isso, um momento muito bacana. Eu falo que eu nunca sofri tanto quanto agora aos 64 anos. Por que eu fui um jovem que militei na ditadura, me enchi de esperança de construir um país que pelo menos fosse democrático, não do meu sonho, através da revolução socialista, mas que pelo menos a gente conseguisse atingir o degrau da democracia. Mesmo que não fosse a democracia social, mas a democracia de convivência política, com todos os defeitos que ela tem. Mas é uma ditadura tão grande para você viver mais um pouquinho. Não é a ditadura do Temer, não, mas a ditadura das imposições. Voltei àqueles tempos, não sei se só na minha juventude, mas não, eu conheço pessoas mais velhas, o Florestan Fernandes que eu tive o privilégio de conviver, também estavam cheios de sonhos, mesmo sofrendo a repressão da ditadura podendo ser preso ou ser morto. Mas, tínhamos muitos sonhos, era bom viver, mas depois disso que aconteceu no Brasil agora, é muito triste viver. Para a minha geração é muito triste, tem um monte de gente da minha geração doente, é muito triste. Eu estou fazendo esse desabafo por que tem tudo a ver com aquilo que nós conversamos. Por que eu virei pró-reitor de extensão? Depois que nós saímos das reuniões e as discussões foram feitas, cada um foi apoiar aquele que tinha mais possibilidades. O Cid era da medicina, era um companheiro, uma referência para os professores mais velhos progressistas, por que não tinha na medicina, só tinha conservadores, reacionários, todos jovens como eu. Então, o Cid passou a ser a minha opção, e como vamos fazer a eleição? Conseguindo que o Conselho universitário aprove a consulta, conseguindo que pessoas de expressão na vida acadêmica sejam candidatos. Tiveram outros, mas esses três foram os principais, os que tinham pessoas que se mobilizaram para que eles fossem, o Cid, a Beatriz Alvarenga e o Zé Alberto, esses tinham base, tinham pessoas que acreditavam neles, os outros eram outsiders, o Lourival, um diretor do direito, o Manoel Boiadeiro da física, pai do ex-presidente da PUC, anterior a esse, eu não lembro de mais nenhum.

Eu fui para a campanha do Cid. Pompeu, meu amigão, foi para a campanha da Beatriz, o Paulinho foi para a campanha do Cid, o Zé Renato na campanha do Cid, a Magda Neves na campanha da Beatriz, a Lucilia também. Então, dividiu a Fafich, economia… O Paulo Paiva apoiou o Cid, o Pimentel apoiou a Beatriz. E foi uma festa, brigas na campanha, dentro da PUB… Uma festa da democracia! Levou o Cid, mas acho que poderia ter levado a Beatriz, o Zé Alberto. O pessoal do Zé Alberto ficou muito raivoso por que ele era a bola da vez, do Zé Henrique Santos, era progressista, como o Zé Henrique, mas era do Estado, os outros eram candidatos que estavam de fora. Mais ou menos as coisas se repetem, mas naquela época com muita efervescência. Apesar que não ganha um que não está pronto para ser, não é assim?

Eu já conversei muito com o Jaime, eu conheci o Jaime quando estudante, e militava como eu, ele é mais novo do que eu. O meu nome estava em um grupo que apoiou o Cid, eu fui coordenador na campanha do Cid, ele pediu que eu coordenasse, talvez por ser mais jovem, mais cheio de energia, vitalidade, com aquela cabeça de militante. Eu era chefe do departamento de medicina social, eu tinha trinta e três anos e entrei de cabeça. Terminado a eleição, o Cid foi indicado, respeitou o primeiro da lista, dentro dos critérios e eu fiquei de ser indicado para março, como pró-reitor de planejamento, era assim que o grupo achava que tinha que ser, e o grupo sempre agia como grupo, coletivo. E assim não fui, o Cid achou melhor escolher um colega mais maduro, que ele julgava melhor para lidar com os regimentos da universidade. O pró-reitor de planejamentos era o dono do cofre, era o para-raio da reitoria, é quem segura, fala não. Ele achou melhor não me indicar, eu fiquei triste, e ele na sabedoria dele… Eu estava esperando vir um novo estatuto para me indicar como pró-reitor de extensão, por julgar que era o meu perfil. Eu vinha do Internato rural, eu vinha de um departamento que tinha feito o Internato rural, um programa de extensão ligado àquele concepção de ensino, era um programaço que todo mundo exaltava na UFMG, todo reitor que queria fazer uma defesa da universidade ou pedir vagas, ele botava o Internato Rural como carro chefe, e era realmente uma coisa muito legal, e bem transformadora, depois do SUS, o Internato é mais ou menos o que o SUS propõe, mas antes, era uma coisa bem inovadora. Ele saiu em 78, o SUS só foi acontecer em 88. Na verdade, 90, mas 88 já estava na constituição, o arcabouço dele estava todo montado, e em 90 vem a lei orgânica da saúde. Então, tem esse dado, é da área da medicina, da área da medicina social, tem muito a ver com extensão, tem perfil para isso, e eu cheguei aqui assim.

Cevex: Essa história de política, de militância também…

Prof. Geraldo: Deve ter ajudado. E eu daria menos trabalho para o Cid também. (Risos). Na hora em que os estudantes invadiram a universidade, ocuparam o terceiro andar, o Conselho Universitário, quem vai negociar? Chama o Guedes pelo amor de Deus! (Risos). Até por uma identidade geracional, né. Ele era o pró-reitor mais novo, menos careta…

Cevex: Entre os demais pró-reitores…

Prof. Geraldo: Ele teve que compor, e eu adoro eles o Evandro, o Ivan, Vanessa. A Ana Lúcia nós tínhamos trazido para a equipe, o Ivan era o pró-reitor de pós-graduação. Aí, o Cid teve que indicar o presidente da Fundep, e o Ivanzinho correu atrás, porque tinha tudo a ver com a àrea que ele sempre acreditou, e era a vida dele, o desenvolvimento tecnológico, aí ele correu na frente e a gente apoiou, era o perfil do Ivan mesmo. E aí, quem põe na pró-reitoria de pós-graduação? Reuniu uma equipe de um lado, a turma de lá, Ivan, Evandro e Vanessa querendo uma pessoa com o perfil deles. Do lado de cá, juntou eu, o Rodrigo Andrade, o Cid, Tarcísio, e o Zé Renato querendo uma pessoa mais nosso, e aí, caímos na Ana Lucia. O Cid não a conhecia, nós apresentamos, e ela era amiga da Magda, irmã do Cid, elas se conheciam da Letras, aí pronto, foi a Ana Lúcia. Então, é por isso que a Ana Lucia trafega assim no muro, não no sentido de ser uma pessoa do muro, mas por essa transição entre os progressistas e os reacionários. Essa gestão inteira, ela e a Vanessa brigando, aí sempre consertava, vinham os homens para colocar panos quentes, o Evandro, eu, por que você fica amigo das pessoas, né! Ainda mais na convivência, você está na gestão, está todo mundo empenhado com as mesmas coisas, mas claro que existem diferenças, mas nem sempre existia.

Então, por isso fui pró-reitor, aí entrei aqui de cabeça, falei “ Agora eu sou pró-reitor mesmo, sou presidente do Conselho. O que eu vou fazer? Vou dividir, vou trazer pessoas no pique para trabalhar, vão estruturar as coordenadorias, vou botar gente com o perfil nas coordenadorias…” E fui nomeando pessoas nas coordenadorias de curso, coordenadoria cultural, me encantei com a área cultural, a área de cursos era bem certinha, estava bem rígida dentro daquelas coisas de extensão, iniciação, aperfeiçoamento. Aí fomos estruturando tudo, surgiu muitas coisas, muitos projetos, e vou ter que separar a história da cultura, as outras histórias mais ou menos perto da cultura, tem uma questão fundamental que é o Centro Cultural, que não é nosso, era alimentado já pela gestão do Zé Henrique, já tinha a aprovação, já tinha a aprovação de transformar o prédio da Engenharia em Centro Cultural, só não tinha jeito de fazer. Ainda coloquei com o Cid que aquilo era prioridade, então fizemos. E tem a questão da institucionalização da extensão, que talvez seja o mais importante, aqui hoje para a gente conversar.

Nesse sentido, a gente começou a articular nacionalmente, eu me juntei a três pró-reitores de extensão progressistas do Brasil, que era a Zezé Feres da UFJF, Maria José Feres. A Zezé tinha sido presidente da Andis. O Garrafa, Volnei Garrafa pró-reitor de extensão da UNB, do triste Cristovão Buarque, melancólico… Ele era o reitor eleito diretamente, e o garrafa era o pró-reitor de extensão, a Dulce, socióloga da UFRJ, pró-reitora de extensão do Horácio Macedo, também eleito diretamente, e eu, pró-reitor do Cid. Nós quatro começamos a nos reunir, e isso levou a criação do Fórum Nacional dos Pró-reitores de Extensão, então esse é o lado da institucionalização, nós fomos criando documentos, teve o encontro de Ouro Preto que era foco dos pró-reitores do sudeste, aí criamos o Fórum Regional dos Pró-reitores da Região Sudeste de instituições públicas, porque nós tínhamos entendido da concepção da extensão que nós começamos a construir, que não era do nada, mas a gente construiu todo um arcabouço, com objetivos e documentos. Aí, a concepção era o seguinte, por que tem que ser das universidades públicas? Por que a concepção de extensão da universidade privada não existe na concepção transformadora que a gente quer. Primeiro aquele ponto básico, a extensão é junto com as outras áreas acadêmicas. A importância tem que ser construída na prática, mas é idêntica, igual a graduação, a pós, a pesquisa e a extensão. Particularmente, não existe ensino sem pesquisa e extensão, como diz aquela concepção da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, isso a gente firmou como norte. A extensão na instituição privada é vender serviço, é um balcão para o serviço. A Fundep já fazia isso, cheia de cursos, a Letras tinha uns cursos de inglês que era extensão… Se quer fazer curso, vamos fazer alfabetização.

Então, a extensão aprovou aqui no Conselho o apoio ao Programa de Alfabetização. O primeiro criado, não posso falar primeiramente senão vou ter que dizer “ Fora Temer”. (Risos) O primeiro programa de bolsas de alfabetização era dirigido pelos próprios funcionários da UFMG analfabetos, isso era inimaginável, então ali foi feito esse laboratório. Porque se você tem funcionário da UFMG analfabeto, sem primeiro grau… Aí tem a história, a Faculdade de Educação tem estudos documentados de como foi se consolidando. E o grande salto, para se tornar realmente um programa, não só uma ação beneficente para os funcionários, para se tornar um programa institucionalizado, foram as bolsas aprovadas aqui nessa mesa.

Eu tinha ligação com isso, pois eu tinha dado aula de história no supletivo, às vezes a pessoa só tinha as quatro primeiras séries e assim terminava o ginásio. Eu dei aula de história para a turma que se formou lá na Medicina, estava precisando de professor, e eu lá com todo aquele engajamento virei professor de história. Lá eu fiz grandes companheiros, eram servidores simples, eram bombeiros no Hospital das Clínicas… Eram ótimas essas aulas de história! Nossa, uma das melhores coisas que fiz em minha vida. Mas aí depois eu tive condições de ajudar de outra forma, eu via aquilo como uma coisa transformadora, aí tinha que começar de dentro, era para qualquer professor se sentir mal em conviver com colegas da universidade que eram analfabetos. Eles iam para as manifestações junto com a gente, quando tinha greve. Na área de cursos eu priorizei isso, era meu perfil.

Tinha aqueles programas junto a favela, que já existiam, a Stella era uma abnegada, ela tinha o Programa das Cabras leiteiras, as comunidades, que eram na verdade as favelas, Papagaio… Era algo de muita presença na universidade, e tínhamos o Programa de Cabras, de aleitamento. E junto com a veterinária nós botamos cabras nessas favelas tudo. (Risos). Então, era leite para as crianças, junto com o aleitamento materno tinha as cabras. Tinha um programa de coelho, criar coelho, aí a gente ensinava a fazer receita de coelho, quebrar o preconceito contra coelho. Você entrava lá no Papagaio, naquela favela indo lá para o São Bento, a Santa Lúcia, ali tinha uma clínica dentária do programa de extensão e você cruzava com cabra.

A gente podia andar na favela, hoje não tem jeito, hoje não ia sobrar nenhuma cabra. Era um Brasil pobre, mas não tínhamos ainda essa luta de classes, essa violência, o tráfico criou instrumentos para isso. Nós somos responsáveis por isso, quando a violência bate à nossa porta… Tem gente que não quis fazer, tem gente que fez pouco. Estamos vendo gente cortar a cabeça lá, eu fiquei sabendo que eles estavam fazendo churrasco com carne humana. É triste para nós civilizados, mas é a onda fundamentalista e ela aparece de muitas formas, na religião, na política. O crescimento do Donald Trump, eleito presidente dos Estados Unidos. Tem um candidato fortíssimo para a presidência da França. Aqui temos que conviver com Bolsonaro, nessa época, ele teria vergonha de falar o que ele fala. Pastor Feliciano, Aécio…

Então tinha o programa de cabras, e a Stella, vocês entrevistaram a Stella?

Cevex: Vamos entrevistá-la.

Prof. Geraldo:  É uma época mais poética, ela é poética, por que ela é da história antiga da extensão. Não tinha como fazer mais, e a Stella queria fazer mais, tem um espírito cristão fantástico de ajudar o próximo. A gente entrou com a cabeça de institucionalizar a vida acadêmica. “Ah não, eu posso ser o primo pobre lá quietinho da extensão, sem verba, mas vou fazer o que posso, vou ajudar. ”

Você imagina ter uma dimensão de um programa de cabras, uma criação de cabras na favela, isso é algo fantástico! Mas a Stella era professora no Loyola, os jesuítas têm muito esses programas de ajuda com morador de rua. Ela é daquelas que saia de madrugada com aluno, pegando gente debaixo de viaduto… É uma sonhadora. Ela não era uma pessoa engajada politicamente, ela era uma militante cristã. Eu até poderia tê-la entendido melhor, hoje com a idade eu entendo melhor quem ela era. Mas estávamos muito envolvidos em fazer uma coisa mais institucional, maior, e isso era visto como uma coisa meio periférica… Fica a mea culpa. Hoje eu penso que se tivessem mais Stellas…

Cevex: Ela foi muito importante.

Prof. Geraldo: Eu lembro da dona Zilda Arns, para um militante como eu, a Zilda era uma cristã bem-intencionada, mas não mais que isso. Para um médico sanitarista como eu sou, aí a Zilda foi fantástica, ela acabou com a desnutrição no Brasil com o trabalho das mães cristãs, dando farinha forte.

Aqui tinha uma pesquisa da farinha e nós pagávamos estagiários, tinha um professor do ICB com nome árabe, o Munir Chamone. E era muito importante o negócio da farinha forte. Eu fui médico e vi desnutrido com uma doença chamada cochocor, dos meus alunos, nenhum viu mais desnutridos. Isso foi trabalho de gente como a dona Zilda, o Munir Chamone. A pró-reitoria apoiou esse projeto, havia aquelas mulheres com a balancinha onde pendura a criança e pesa, em comunidades eclesiais de base. Fantástico! Mas eu como militante, queria fazer a inclusão e achava público. E ela estava lá no Haiti para fazer isso e morreu no terremoto. Também fica a mea culpa de ela não trabalhar aqui na pró-reitoria, mas eu dei apoio a farinha, nunca deixei de dar dinheiro para o Munir. Minha menina foi aluna do Coltec e trabalhou no projeto da farinha forte do Munir. Então conheço bem, lembro do Munir me encher a paciência… (Risos). Gente boa demais, maravilhoso, tem que ser né? O cara para levar um projeto como o Farinha Forte em uma universidade tão elitista, se ele não for chato, ele não faz.

O Munir é um herói. Para o pessoal que sobreviveu à desnutrição, você imagina. Tanto jovem podendo estudar… Mas é isso, tinha essas vertentes. De tudo do que tinha antigo eu incensava, e o que era novo eu corria atrás.

E a articulação era comigo mesmo. Foi com essa articulação que criamos o Fórum da região sudeste, nós criamos o Fórum Nacional, de um encontro em Brasília, entre 86 e 90. E foi logo no início da minha gestão, o Volnei foi eleito o primeiro presidente do Fórum dos pró-reitores, nós o elegemos.

E para falar a verdade, quem botava para quebrar era eu. (Risos). Eu era mais novo que eles, também, a Zezé era um pouco mais velha, o Volnei um pouco mais velho, a Dulce também, mas eu era o mais agitado, marcava encontros, utilizava a estrutura aqui para dar suporte ao Fórum, eu designava um servidor. E apesar da UFRJ ser maior, a Dulce não tinha esse pique, e eu acho que ela não tinha a força na gestão que eu acho que eu tinha. O Cid me apoiava muito e isso me dava também retaguarda. Então, o primeiro encontro foi na UNB, o segundo encontro foi em BH, e eu fui o segundo presidente do Fórum Nacional dos Pró-reitores de Extensão das Universidades Públicas. Claro que tudo isso, eu não inventei da minha cabeça, a gente não inventa nada, a gente pega as coisas que têm, organiza e dá seguimento, cria forma. Na arte a pessoa inventa e dá forma àquilo que ela capta. E vamos falar das nossas teses… Não é 90 % de trânsito de ação e 10 % de criação? Se for 10! E é isso mesmo, por que a gente não inventou a roda. Então, todos esses conceitos da extensão a gente organizou e deu a nossa contribuição, escrevendo, botando alguns princípios, a carta de Ouro Preto foi a base de Brasília para a criação do Fórum Nacional, e eu fico muito feliz de ter participado disso. Aqui internamente, o que a gente pegou mesmo e que foi legal foi o Centro Cultural, nós saímos atrás de parceria por que não tínhamos dinheiro. A primeira coisa que tinha que fazer era arrumar o telhado, aí se bancou a licitação de uma construtora, que é a Coscarelli, o velho Coscarelli tinha a maior paixão por aquele prédio e ele administrou, eu lembro que eu ía lá ver as obras e ele estava lá, apaixonado, e ele restaurou o telhado todo. Isso foi a primeira coisa, agora vamos arrumar dinheiro para a parte elétrica, a CPMN deu 500 mil cruzeiros, ainda não era o real, o real é pós Itamar, FHC.

Eu sou de uma cidade onde tudo está se chamando de Itamar Franco, daqui a pouco a cidade vai se chamar Itamar Franco. (Risos). A avenida Independência virou Itamar Franco, o aeroporto virou Itamar Franco, o Expominas virou Itamar Franco, então vai assim, por que lá ele foi prefeito, aí fica Prefeito Itamar Franco, aí foi governador de minas, aí vira Governador Itamar Franco, Senador Itamar Franco e Presidente Itamar Franco, tinha que ser Vice-Presidente Itamar Franco. (Risos).

Cevex: Mas tem a história do Juiz de Fora Temer.

Prof. Geraldo:  Tem, Graças a Deus! (Risos). Se redimiu porque minha cidade é manchada com o 1° de abril de 64, por que foi de lá que o Mourão Filho saiu. Aí mudaram para 31 de março para não pegar muito mal. Foi o 1° de abril nas comemorações deles. Então, agora o Juiz de Fora Temer, se redimiu.

Cevex: Professor, quando você lembra dessa história, como era a participação, o envolvimento dos estudantes. E como o senhor avaliaria a importância da extensão para os estudantes, ou não tinha tanto, era um diálogo mais com os professores mesmo?

Prof. Geraldo: Então, era setorizada por núcleo de interesse. Você não tinha a extensão como uma importância para movimento estudantil. Não fazia muito parte da pauta deles. Mas ela tinha importância para o pessoal da área artística e cultural, os estudantes dessa área e outros que tinham afinidades pelas artes, quando vinha o Festival de Inverno, então tinha um significado grande para eles. Claro que eu nem vou falar dos estudantes da música, do T.U., das Belas Artes, isso é óbvio, eles estavam todos envolvidos, uma militância muito grande até nas atividades de extensão universitária.

E eu acho que a parte que a gente queria da respeitabilidade acadêmica… a extensão sempre foi vista como uma coisa menor. Então se tinha uma bolsa e participava de um projeto, descobria uma outra coisa que ajudava ele na sua formação, os projetos de extensão, podia ser o de cabra, podia ser outro projeto de extensão, da constituinte, mas aí, eram setoriais, por interesses, eu não via ainda, entre os professores também não era a prioridade deles. Ou era do bom samaritano, no bom sentido, como a Stella, o Munir, o pessoal da alfabetização de adultos, do supletivo, e assim muitos outros projetos, mas aí não era a demanda. Quem estava no Internato Rural adorava o internato, não sei se era pela oportunidade de ter a primeira experiência de vida fora da casa dos pais, ou se era pelo conteúdo de saúde…

Cevex: Talvez tudo junto.

Prof. Geraldo: É, talvez tudo junto, uma coisa ligada a outra. Não mudava muita coisa não na vida deles. Hoje eu tenho essa história dos regressos, nós fizemos uma pesquisa lá, não sei se acabou. O Internato rural tinha uma graninha que sobrava do dinheiro das prefeituras, e a gente andou fazendo revista, o Internato registrou alguns números, registramos os projetos, participação comunitária, internato era muito essa visão comunitária. A forma de organização do período da ditadura que acabou sobrando essa concepção universitária de Associação de Bairro, Associação Comunitária, esses núcleos que eram diferentes da organização sindical, de grupo de trabalhadores rurais que tinha no passado. Tanto é que muitos líderes comunitários acabaram entrando na política, viraram vereadores, muitos não, alguns, muitos tentaram.

Mas eu acho que não, não sei se é uma coisa que mudou, porque a extensão cresceu de forma institucional. Hoje por exemplo na divisão de verba, eu não sei quanto que representa a extensão no conjunto das áreas acadêmicas, essa proporcionalidade hoje, mas nessa época ainda era pequena. Eu brigava muito, e o Tarcísio, pró-reitor de planejamento não conseguia me enganar, como todo pró-reitor de planejamento engana os outros, ele cortava um dobrado comigo. Mas ele sempre ganhava, mas pelo menos eu desmascarava. (Risos).

Tinha que comprar isso, tinha que trocar a frota… Mas por que trocar a frota? Não dá para aguentar esse carro mais um tempo? E botava aqueles números na frente, e eu destrinchava tudo. Por ser da área médica, eu tinha facilidade para entender o que está por trás de um número, mas aí você precisa decifrar o número senão você não vai descobrir o que está por trás, o qualitativo que está por trás do quantitativo. (Risos). Então, eu acho que era pouco, entre os professores pouco, e os funcionários com uma visão sesta da extensão.

Cevex:  Como assim?

Prof. Geraldo: O Rosa. De achar que a pró-reitoria de extensão tinha que apoiar Rosas de Abril, os projetos legais de convivência intra-campus para os servidores. É uma coisa que tem que ter mesmo, e o que eu tentava dizer para eles é que não era a extensão que tinha que fazer isso, quem tinha que apoiar isso era a administração. Depois criou a Pró-reitoria de Assuntos Comunitários, mas na época era uma luta, e eles iam bater onde também? Na graduação? Na pós? Na pesquisa? (Risos). Vamos lá na extensão que esses caras estão mais abertos. Eu tentava explicar, mas mais na frente conseguiu se criar a Pró-reitoria de Assuntos Comunitários que tem que pensar na vida no campus, na convivência na comunidade, fazer programações tipo essa que a Assufemg fazia, não sei se ainda faz. Martinho da Vila veio e foi ótimo. Eu até fui no camarim, por que eles acharam que tinha que chamar o pró-reitor porque devia ter dado algum dinheiro. Eu achei muito bom, não tinha ninguém para me filmar, falar que eu estava locupletando, eu nem conhecia o Martinho. Por que hoje você tem que pensar no que você vai fazer, se eu agisse como eu agia no passado… E eu não fiz nada demais, não acho que fiz nada demais…

Cevex: Há uma vigilância…

Prof. Geraldo: Sim, uma vigilância total.  A pró-reitora adjunta foi criada na nossa época, não existia.

Cevex: Há quanto tempo o senhor aposentou professor?

Prof. Geraldo: Há pouco tempo, em outubro de 2013. Aí eu tentei ficar um ano sem vir para o institucional, mas eu fiquei em um projeto que trabalho até hoje o Mais Médicos, eu não sei quando vão terminar, ainda não terminaram por que os prefeitos do PMDB não querem que acabe, senão já tinha acabado. As entidades médicas são todas contrapor que são reacionárias. Se tem um período da minha vida que eu não gostaria de ter vivido é a frente entidades médica. Eu fui presidente do CRM, e fui conselheiro federal do CFM, e aliás eu tinha muito contato com o pessoal da psicologia e das outras áreas, porque era muito duro sobreviver lá em Brasília com aqueles reacionários, um pessoal bem atrasado. (Risos). Lá tinha um pessoal progressista no Conselho Federal de Psicologia, andou fazendo umas revoluções legais.

Cevex: Ana Bock?

Prof. Geraldo: Ela mesmo. E nós tínhamos um fórum dos conselhos federais da área de saúde.Aí tinha um representante de cada conselho. E era a briga do ato médico. O Conselho Federal de Ensino estava em briga com os outros 13, são 14 profissões da área.  E aí, eles lá do CFM “Quem é conselheiro que vai para esse fórum? ” É igual aqui o Cid me chamava para conter as ocupações do 3° andar. (Risos). Vai o Guedes que ele é meio comunista, eles não achavam que eu era inteiro, se fosse inteiro como eu iria estar lá? (Risos).

Aí, vai o Guedes. Era no Conselho Federal de Enfermagem que se reunia, e eu cheguei lá meio que como inimigo, e as pessoas foram me conhecendo, e eu virei presidente deste fórum do Conselho Federal de Saúde. Eu fiquei muito amigo de todas as pessoas das outras áreas, eu tenho mais amigos nos outros conselhos, como a medicina veterinária, biomedicina, psicologia, nutrição, fiquei muito amigo do pessoal da nutrição, um pessoal muito bom, e até a educação física.

Cevex:  Professor, você nunca pensou em se candidatar para reitor?

Prof. Geraldo:  Eu fui candidato a reitor logo na sucessão do Cid. Eu fui pungido a ser candidato por aqueles mesmos grupos, mas aí já não existia um espírito com foi na outra. A vitória do Cid tinha traumatizado à direita na UFMG.

Esse período talvez tenha sido o período, que eu como ser humano, aprendi mais. Determinadas coisas que a minha geração, mesmo as pessoas ditas progressistas, por que você tem que ter cuidado, por que depois vira um Serra, FHC, Cristovão, que dizem que eram progressistas…

Eu tenho que falar do MEC, que a gente criou uma coordenadoria que tinha um peso, tinha que ter um órgão no MEC que criasse um pouco de expressão lá dentro, para que a extensão tivesse não só verba, um fundo, que depois foi criado um fundo de extensão, não sei se veio a acabar…

Cevex: Não. Ainda tem, mas na história mais recente está em xeque, a gente não sabe se vai continuar.

Prof. Geraldo: Então, nós criamos uma coordenadoria lá, que deixou de ser a sala do subsolo para ter um status e ser recebido pela SESU, o diretor da SESU, secretaria de ensino superior, participar, ter um lugar na mesa no encontro de reitores, a gente ter assento em mesa, isso tudo era luta da institucionalização. Não um assento, mas um lugar nas mesas do encontro anual, com um tema para falar, ter uma mesa. Mas normalmente eles colocavam a nossa mesa no último dia, na última hora, aí não falamos para ninguém, os reitores já tinham todos ido embora. Mas tinha participação nos anais. Essa é uma particularidade da extensão.

Aqui na UFMG a cristalização do poder da elite universitária é a mesma coisa que no Brasil, por exemplo, agora você vai mexendo as verbas da ciência e tecnologia, o reitor tem apoio da unidades acadêmicas, você consegue tirar um documento.

Falar nisso, foi terrível o que fizeram com o reitor da UFRJ, estão perseguindo mesmo, ele já está com dois inquéritos abertos, por eventos que ele fez lá, vai ter processo pelo resto da vida, vai virar um tormento na vida dele depois que ele deixar de ser reitor. Vai ter que contratar advogado. Tudo para intimida-lo.

Então, eu fui candidato, sim. E meu sonho era esse, mas não me abati não, achei natural, pois quando você tem a compreensão do todo… Isso me deu um aprendizado como ser humano… A gente fica muito viciado na cultura do machismo, misoginia, racismo, preconceito contra pobre, e mesmo você sendo de um campo que deveria cercear isso, acaba naturalizando. Você ouve piada contra negro, você ouve uma piada discriminatória contra mulher, contra loura, conta. Assiste o Sai de baixo com o Caco que adora falar mal de pobre e vira piada. Isso tudo faz parte de uma cultura de dominação. Eu não vejo mais televisão, por que quando eu fui ficando com raiva da Globo, mas é a melhor produção, eu ia ver o Viva, que é aqueles programas antigos, aí aparecia Sai de baixo. Como se ri disso, gente? Como eu posso ter rido disso? Eu fazia parte disso. E eu estou contando a minha história, fazendo louvas a minha militância, ao meu engajamento que vem desde os 14, 15 anos. E eu ria disso, gostava de assistir. Como a gente é engambelado! Agora você imagina a grande massa. Aí, eu falo para as minhas filhas, eu só tenho filha mulher, são cinco. O grande aprendizado, você tem que tirar alguma coisa dessa experiência, não da derrota, mas da luta. Porque antes de ser derrotado, você luta, lutou e continuou lutando. Mesmo assim, tem coisas que eu não vou fazer mais, eu acho que agora são os jovens que vão fazer. Mas esse aprendizado cristalizou, desnudou a sociedade brasileira. A sociedade brasileira é racista, é misógina…

Cevex: Patrimonialista, racista…

Prof. Geraldo: Patrimonialista. É tudo! E racista, porque a cultura de ódio nasce do racista. Desculpe se eu estou falando demais, mas a gente frequenta ambientes onde prevalece o clima de ódio.  E eu estou ficando com ojeriza de Ipanema quando dizem “Coisa feia aquela favela!” Eu não acho não, eu queria que eles descessem ali e ficassem tudo na praia. Eu não acho feio não, acho muito legal. No dia em que tiver direito para todo mundo, aí aquele pessoal lá vai ajudar a reflorestar aquele lugar. Igual a Europa cuidou dos rios dela, nós que bancamos, com a expropriação do nosso trabalho. Nos países pobres a social democracia fez gracinha, agora estão pegando os árabes na reta, é igual àquela favela ali, vamos ver o que é ‘bom para tosse’. Não é que eu sou a favor do fundamentalismo, muito pelo contrário, de violência eu não tenho nada, eu sou a favor do processo civilizatório. Mas o mundo ocidental vai pagar um preço da exclusão. E a gente não está falando da África, nós estamos falando de um mundo árabe, porque o mundo árabe ainda vive em conflito. O mundo africano, a África é excluída, é como se não existisse, só de vez em quando você vê uma notícia, é uma exclusão total.

Cevex: A conversa está muito boa! Eu vou fazer uma última pergunta para a gente fechar. Nesse contexto todo que a gente está vivendo hoje no país, e na universidade, pelo o que ela está passando, qual é, e qual pode ser o papel da extensão nesse contexto todo? E o que o senhor espera para os próximos 90 anos da universidade? Pensando aí nesse foco da extensão.

Prof. Geraldo:  Eu acho assim, como nós somos um espaço mais livre de amarras, nós temos que deixar um pouco as regras que as universidades são obrigadas a seguir.  Antes de pensar na institucionalização, eu acho que ela avançou legal, está bem consolidada nos objetivos da universidade, nos arcabouços, na verdade falta é dinheiro, o que não é prioridade, mas pelo menos todo mundo tem vergonha de dizer que ela não tem que existir.  Então, está bem.

Nós temos que nos próximos 90 anos fazer um espaço de transformação da sociedade, por que só a sociedade pode mudar essa instituição no futuro, e torná-la pertencente, quer dizer, ela ser um espaço popular. Então, vamos dar força para tudo que for transformador. É marginal? Põe as cabras da Stella, isso em uma época que tinha desnutrição. Hoje, tem muita violência de todos os tipos, contra mulher, negros, todas as minorias, e a violência maior contra a democracia. A extensão passa pela universidade para dizer para o que veio. Vamos fazer um espaço de transformação, e se puder revolucionar. (Risos e palmas).

E vai ser para os próximos 90, porque nós temos muito estrada pela frente. Só lembrar a história da revista da extensão. O Tomáz fazia uma revista muito legal, chamava Conexão. Ele chegou, e eu acho que ele queria ser o oficial natural, o lado humano dele é muito legal. Foi companheiro do meu irmão, Zé Luís, o Zé Luís foi presidente da UNE em 66, a época de chumbo. O Tomáz tinha a maior admiração pelo Zé, por que as gerações vão criando seus ídolos, foi um ídolo da juventude dele, o Zé, pelo desprendimento dele. Aí, ele me pediu “Guedes, a revista está praticamente pronta, só não deu para publicar, e eu queria que você publicasse. ” E assim, eu editei a Conexão. Mudou de nome, não foi por questões políticas, estava ótimo o nome, mas nós queríamos registrar, mas já tinha o nome Conexão. Sempre tive muito carinho por ele.

Você sabe, para encerrar, a história da vitória dele? O pessoal queria ficar meio longe de mim, eu me tornei meio maldito depois da eleição, e nem o pessoal da esquerda me procurava porque eu não quis me candidatar de novo. Mas eu acho que a vida é assim, passou, passou.

Cevex: Mas foram muitas contribuições.

Prof. Geraldo: Mas eu não sou muito apegado à essa história, tudo o que passa, passa. Era natural que eu fosse candidato na próxima eleição, lógico, mas eu não quis nem saber, fui fazer meu doutorado, agora tenho que fazer minha vida acadêmica para eu ter direito a pelo menos uma aposentadoria decente, a lógica da universidade é essa mesmo. Tenho essa filharada para criar. (Risos). Resolvi não ganhar dinheiro com medicina, então tenho que fazer a lição de casa aqui.

 

Entrevista realizada no dia 04/092016, às 09:00 horas, no Gabinete PROEX- UFMG.Entrevistadora: Professora Claudia Mayorga. Equipe participante:  Gabriela Braga Casali.

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Professor Evandro José Lemos da Cunha

Veja entrevista com:

Professor João Antônio de Paula