Conheça autores e obras indígenas que colaboram para a ampliação dessas vozes literárias
29 de agosto de 2023
Ouça também no Spotify!
Se fosse perguntado a um grupo de pessoas “o que é literatura indígena?”, é provável que muitas não saberiam a que se referir, outras poucas poderiam dizer sobre autores brasileiros que tratam da temática indígena, como José de Alencar, e um número ainda menor saberia dizer nomes de autores e de obras indígenas.
Apesar de existirem mais de 300 povos indígenas no Brasil, prevalece um grande desconhecimento sobre a diversidade sociocultural desses povos. Esse desconhecimento é ainda maior quando se trata das suas produções e conhecimentos artísticos e literários. Essa lacuna no repertório coletivo tem uma razão muito sólida para existir, que infelizmente é o preconceito racial e o apagamento das contribuições dos povos indígenas na história do Brasil, situação essa que começa a ser revertida com a inserção de representantes indígenas em cargos no sistema político brasileiro e também a chegada dos estudantes desses povos às universidades, por meio da lei de cotas.
O processo de educação formal para os povos indígenas em seus idiomas originais só começou a valer a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988; antes desse momento, nas escolas indígenas o ensino se dava exclusivamente na língua portuguesa. Somente a partir da década de 1990 começam a ser gestadas políticas de educação escolar indígena diferenciadas, cujas diretrizes privilegiam a interculturalidade, o bilinguismo e a valorização dos saberes tradicionais.
Entretanto, se ampliarmos o conceito de literatura para algo que está para além de grafismos no papel, podemos compreender que mesmo antes do surgimento de textos escritos por autores indígenas, já havia uma produção literária indígena, embora não exatamente como estamos acostumados. Ela envolve também o ser indígena e seus fazeres culturais, como a dança e a pintura corporal; e isso também é literatura.
A essa literatura propriamente indígena vêm somar-se uma gama de escritores indígenas, ainda pouco conhecidos, que passaram a publicar textos escritos em português. Suas obras trazem aos leitores não-indígenas a sofisticação dos múltiplos saberes destes mundos, muitas vezes sem perder o sabor e as marcas da oralidade que os singularizam. Contando com a sensibilidade atual da população em prol de ampliar as vozes, afinal, é um esforço em conjunto para combater esse apagamento, eles têm ganhado visibilidade atualmente e por isso, destacamos quatro autores e obras indígenas para colaborar na ampliação dessas vozes literárias.
O primeiro é o autor Daniel Munduruku, autor de 56 livros, pertencente ao povo Munduruku. Graduado em Filosofia, tem licenciatura em História e Psicologia. Tem Mestrado e Doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e Pós-Doutorado em Linguística pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Seus livros são em sua maioria infanto-juvenis e paradidáticos. Sua obra mais conhecida é “Kaba Darebu”, sobre um menino indígena e sua vida e relações com a aldeia e a natureza.
A segunda escritora é Eliane Potiguara. Considerada a primeira escritora indígena, Eliane também é professora e doutora honoris causa, título concedido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em seu livro “O Coco Que Guardava A Noite”, a autora revisita uma narrativa karajá para escrever uma ficção fantástica indígena.
A mais jovem da lista é Julie Dorrico, do povo Macuxi. Julie descobriu sua etnia aos 26 anos e isso consolidou sua trajetória como escritora e pesquisadora de seu povo. A escritora já possui o prêmio FNLIJ/Tamoios por seu livro “Eu sou macuxi e outras histórias”; nele a autora reafirma sua identidade em sua escrita, que mistura prosa e poesia.
E por último, mas não menos importante, temos Cristino Wapichana, roraimense, contador de história e ativista. Ganhou o prêmio Estrela de Prata do Prêmio Peter Pan 2018 com seu livro “A Boca da Noite”. O texto, também fantástico, mescla o cotidiano, valores e histórias da comunidade Wapichana.
A concepção de um país mais igualitário perpassa o que nós consumimos, seja por entretenimento, ou por formação pessoal. É importante combatermos os perigos de uma história única, como diz a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi “mostre um povo como uma coisa, como somente uma coisa, repetidamente, e será o que eles se tornarão”.
[Texto de autoria de Juliana C. L. Cavalli, aluna do curso de bacharelado em Estudos Literários e estagiária do Núcleo de Ações Educativas]
Referências:
Cristino Wapichana e a arte da literatura indígena.
DANIEL MUNDURUKU – Currículo Resumido.
Eliane Potiguara – Literatura Indígena – Um Pensamento Brasileiro.
Julie Dorrico – nas trilhas da literatura indígena.
Formações – Polo – Itaú Social.
TECNOLOGIA, T. A Boca da Noite | Grupo Editorial Zit | Loja Oficial.