(Crédito da foto em destaque: SiBBr / MMA)

Reportagem: Ferdinando Marcos / UFMG

O Brasil vem perdendo sua biodiversidade antes mesmo de conhecê-la. Essa constatação é unânime entre os pesquisadores que participaram da mesa-redonda Estudos genético-evolutivos da biodiversidade brasileira, realizada na tarde de ontem (segunda, 17), no CAD 2, durante a 69ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

No debate foram apresentados estudos sobre invertebrados marinhos, plantas do Cerrado e animais carnívoros – como raposas e onças – e discutidas possíveis estratégias de conservação da biodiversidade. Participaram do debate os integrantes da Sociedade Brasileira de Genética, Gisele Lobo Hajdu, professora da Uerj, a professora Mariana de Campos Telles, da PUC-GO e da UFG, e o professor da PUC-RS Eduardo Eizirik.

Invertebrados marinhos

A pesquisadora do Laboratório de Genética Marinha do Departamento de Genética da Uerj, Gisele Hajdu, discorreu sobre a importância da biodiversidade marinha, que fornece, além das belezas naturais, bens de consumo (por meio da pesca, por exemplo), serviços de regulação climática, entre outras funções fundamentais para a vida humana. Não sem motivo, mais de 50% da população mundial vive em zonas costeiras.

Gisele Hadju: lacuna precisa ser mitigada. Foto: Ferdinando Marcos / UFMG

Atualmente, há 1,75 milhão de espécies do universo marinho descritas; a estimativa, porém, é de que existam entre 5 e 100 milhões de espécies. “Essa lacuna precisa ser mitigada”, afirma a pesquisadora. Hajdu chamou a atenção também para a responsabilidade humana na perda de biodiversidade nessas áreas por motivos como poluição, destruição e fragmentação dos habitats, erros no manejo de recursos (ultrapassagem dos limites de pescas, por exemplo), entre outros.

Sobre o conhecimento atual desenvolvido na área, a professora da Uerj afirma haver uma evolução, mas o quadro ainda está longe do ideal: “Os estudos da biodiversidade brasileira até os anos 1990 se baseavam nos taxonomistas clássicos, o que era um problema, pois tínhamos poucos especialistas. Precisamos conhecer a biodiversidade para não perdê-la, entretanto, a maior parte dos alunos não está interessada em estudo longo, de ao menos 10 anos, que possibilite uma descrição complexa de uma espécie e nos ofereça maior número de estratégias na sua preservação”, alerta Hadju.

Frutas do cerrado

Em abordagem sobre suas experiências com espécies de plantas – frutíferas ou arbóreas – do Cerrado, Mariana Campos Telles falou sobre seus estudos de genética e biodiversidade e também alertou para uma “lacuna no conhecimento”: “No cerrado temos cerca de 12 mil espécies conhecidas, nem 50 possuem um estudo aprofundado sobre suas características”, informa a pesquisadora.

Nos estudos que desenvolve no Núcleo de Excelência em Genética e Conservação de Espécies do Cerrado da UFG, Telles utiliza marcadores moleculares (também conhecidos como marcadores de DNA) para a reunião de dados, ou “caracterização genômica” em termos técnicos, importantes para a preservação dessas espécies.

Mariana Campos Telles: marcadores moleculares. Foto: Foca Lisboa / UFMG

A professora, que conduziu estudos com árvores de pequi, baru, mangaba, caju, ipê-amarelo, jatobá-do-cerrado, entre outras, avalia que se deve “correr atrás do prejuízo” no que tange à reunião de conhecimentos básicos sobre as espécies, que posteriormente podem ser aplicados na conservação: “Só assim poderemos usar essas informações genéticas para tomar decisões políticas que visem à proteção dessas espécies nativas”, conclui.

Desmatamento na Mata Atlântica

Especialista em estudos genéticos e genômicos de carnívoros brasileiros, o pesquisador da PUC-RS Eduardo Eizirik descreveu suas conclusões de um fenômeno considerado alarmante pelos biólogos: a hibridização entre espécies diferentes de raposas, que originalmente habitavam o Sul de São Paulo e a região Sul do país. As suspeitas mais fortes são de que o desmatamento estimado em mais de 90% da Mata Atlântica – antes uma espécie de barreira natural para as espécies –, provocou o fenômeno.

Nos estudos conduzidos por Eizirik, também foram utilizados marcadores moleculares para uma análise filogenética baseada em DNA mitocondrial para observar raposas com o DNA mitocondrial de uma espécie e fenótipo de outra. “Se a princípio a hibridização de duas espécies não parece grande coisa, quando descobrimos que, em toda América do Sul, existem apenas seis, temos uma dimensão melhor de um processo antropogênico recente. Os indivíduos misturados estão se difundindo na região e iremos acompanhá-los a fim de propor estratégias para mitigar esse fenômeno”, afirmou Eizirik.

Eduardo Eizirik: hibridização entre espécies de raposas. Foto: Foca Lisboa / UFMG