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Nº 1332 - Ano 28 - 20.12.2001

/ Dietmar Samulski

"Não somos bombeiros"

le é uma das maiores autoridades da Psicologia Esportiva no Brasil. O pesquisador alemão Dietmar Samulski chegou ao país em 1987 como professor visitante da UFMG. Gostou tanto que fez concurso para professor adjunto oito anos depois e acabou casando-se com uma brasileira.

Psicólogo da delegação paraolímpica brasileira e coordenador do Laboratório de Psicologia do Esporte (Lapes) da Escola de Educação Física, Samulski analisa, nesta entrevista ao BOLETIM, o estágio atual da psicologia esportiva no país e defende a necessidade de um trabalho científico de longo prazo com nossos atletas.

BOLETIM - Como o senhor avalia o estágio atual da Psicologia do Esporte no Brasil?

Dietmar Samulski - O Brasil ocupa uma posição de liderança na América do Sul tanto em termos de produção científica quanto em termos de qualificação profissional. Temos mais de 20 doutores em Psicologia do Esporte no país, além de vários profissionais que atuam na área. Mas também buscamos afirmação e reconhecimento. Como presidente da Sociedade Mineira de Psicologia, venho lutando para que a Psicologia do Esporte seja incorporada aos cursos de Psicologia como disciplina aplicada. Até hoje, a área está circunscrita aos cursos de Educação Física.

B - Que distinção o senhor faria entre a Psicologia do Esporte desenvolvida nas universidades e esta que anda em voga nos meios esportivos brasileiros?

DS - Há muitas diferenças. Considero que boa parte do trabalho de psicologia feito em clubes e federações esportivas brasileiras é baseada nos princípios da auto-ajuda. Esses profissionais realizam palestras de motivação e dinâmicas de grupos às vésperas de competições e decisões importantes. É uma linha de ação muito imediatista.

B - Mas alguns esportes exigem resultados imediatos. Como conciliar essa pressa com a necessidade de realizar um trabalho de longo prazo?

DS - Vou dar um exemplo da minha experiência pessoal. O comitê paraolímpico me contratou como psicólogo da delegação que disputou as Paraolímpiadas de Sidney. Tive seis meses para fazer esse trabalho. Nesse período, construímos um perfil psicológico de todos os atletas da delegação brasileira. Foi um diagnóstico complexo, porque baseou-se nas especificidades de cada atleta, incluindo aí os aspectos de suas deficiências, e as particularidades das modalidades. Os resultados apareceram e a delegação paraolímpica voltou com seis medalhas de ouro.

B - Enquanto isso, a outra delegação passou em branco...

DS - O Brasil chegou a seis finais olímpicas e perdeu todas. Quando isso acontece, alguma coisa na parte psicológica não vai bem. O Guga (o tenista Gustavo Kuerten) perdeu oito partidas seguidas, o que também não é normal num atleta de seu nível. Acho que ele também precisa de uma assessoria psicológica. O Larri (o técnico Larri Passos) atua como treinador, pai e psicólogo, o que não deixa de ser interessante. Penso, no entanto, que um acompanhamento psicológico mais profissional faria muito bem ao Guga.

B - Mas esse trabalho precisa de tempo para amadurecer...

DS - Só que no Brasil isso nem sempre acontece. O Roberto Shinyashiki foi contratado pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB) a uma semana das Olímpiadas. O que ocorre é que muitas vezes o psicólogo esportivo é chamado, por exemplo, para dar palestras para uma equipe de

futebol que vem de várias derrotas consecutivas. Ou seja, exerce a função de bombeiro, de um pai-de-santo. Prefiro trabalhar numa perspectiva de continuidade. Tanto que permaneço vinculado ao Comitê Paraolímpico até os Jogos de Atenas, em 2004. No ano que vem, farei novas avaliações da equipe paraolímpica e poderei comparar seus resultados com os que já tenho no banco de dados formado no ano passado. Isso é inédito no Brasil.

B - A Psicologia do Esporte ainda pode ajudar o esporte brasileiro a ganhar muitas medalhas?

DS - Creio que temos uma contribuição importante a dar ao nosso esporte. Mas a nossa área não trabalha apenas com atletas de alto rendimento. Também atuamos na reabilitação física e na motivação de pessoas para a prática esportiva. Não queremos apenas que o atleta ganhe medalhas, mas também se prepare para enfrentar a vida.

 

Congresso comemora 10 anos de Laboratório

Uma das principais referências da área no Brasil, o Laboratório de Psicologia do Esporte (Lapes), da Escola de Educação Física, acaba de completar 10 anos. A data foi comemorada em grande estilo na semana passada, quando o Laboratório sediou o VIII Congresso Brasileiro de Psicologia do Esporte.

Organizado pelos professores Dietmar Samulski, Luiz Carlos Moraes e Rodolfo Novellino Brenda, o congresso trouxe importantes especialistas a Belo Horizonte, como o professor Benno Becker Júnior, presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia Esportiva (Sobrape), Dieter Hackfort, professor da Universidade de Munique (Alemanha), e Regina Brandão, professora das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), de São Paulo, e responsável por uma recente avaliação psicológica dos jogadores da seleção brasileira de futebol.

Segundo o professor Samulski, UFMG e USP abrigam o que há de melhor na área da produção científica em Psicologia Esportiva. O Lapes, por exemplo, possui seis doutores - mais de 20% do número de profissionais com doutorado que atuam no país - quatro mestres, oito mestrandos e 11 monitores e bolsistas.