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Nº 1426 - Ano 30 - 12.2.2004


Vida em estado poético

Tese da Letras investiga trajetória biográfica de Mário Faustino

Maurício Guilherme silva Jr.

iver ininterruptamente em poesia, em estado poético, escrevendo ou não, mas sempre sob o signo da palavra criadora". Ao longo de 32 anos de vida, essa meta, descrita em carta a um amigo, serviu-lhe de bússola para seguir os dias. Do nascimento no Piauí, nos idos de 1930, à morte nos Andes peruanos, em 1962, o poeta Mário Faustino perseguiu com afinco o ideal de viver poeticamente. Analisar a breve - porém intensa - trajetória biográfica do poeta piauiense foi o principal objetivo da tese de doutorado defendida, na semana passada, por Lília Silvestre Chaves, junto à Pós-Graduação em Estudos Literários da Faculdade de Letras (Fale).

Professora de literatura francesa na Universidade Federal do Pará (UFPA), Lília seguiu nova tendência de pesquisas da área, que buscam inserir o gênero biográfico na esfera da ficção e da crítica. Em seu trabalho, partiu em busca dos "rastros" de Mário Faustino presentes em cartas, álbuns fotográficos, recortes de jornal e manuscritos originais. "No movimento do seu tempo, Mário Faustino pratica e canta o carpe diem, enviando aos homens sua poesia, emissária da paz que, para ele, reúne vida, amor e morte", escreveu a professora no resumo de sua tese.

O material a que a pesquisadora teve acesso está sob a guarda do filósofo Benedito Nunes, professor aposentado da UFPA. Além de crítico literário incentivador da obra de Faustino, Nunes tornou-se amigo próximo do poeta. Nas cartas, fotos e recortes de jornal coletados por Lília, o perfil alegre, libertário e inovador do escritor aparece sem máscaras ou subterfúgios. Nos escritos destinados aos amigos, lá está o permanente desejo de viver a poesia em toda sua plenitude. Em vida, Faustino publica apenas um livro de poemas, O homem e sua hora, coletânea, que, anos mais tarde, é reeditada, mas acrescida de versos inéditos. Também sua obra crítica é reunida, já na década de 80, e dá origem ao livro Poesia-experiência - De Anchieta aos concretos.

Precocidade

A vida do poeta é marcada pela precocidade. Nascido no Piauí, Faustino muda-se para o Pará ainda na infância. Caçula de família composta por 20 filhos, o poeta vive em Belém (PA) com o irmão mais velho, a quem o poeta chamava de pai. Logo aos 16 anos, trabalha no jornal A província do Pará. Antes de seguir para o Rio de Janeiro, ganha bolsa de estudos, e, aos 21 anos, segue para os Estados Unidos, onde estuda língua e literatura inglesas. Na capital paraense, envolve-se com movimentos literários e intelectuais da região e acaba conhecido em outros estados.

Vem daí o convite para que assuma um dos postos jornalísticos mais importantes da poesia brasileira nos anos 50. Durante dois anos, edita a página Poesia-resistência, no Jornal do Brasil, cujo lema era Repetir para aprender, criar para renovar. Nas páginas do diário, muitas tendências literárias receberiam atenção de Faustino. Um exemplo é o movimento concretista, divulgado em primeira mão pelo poeta. O escritor também assume, no início dos anos 60, o cargo de tradutor da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque.

Ao longo de sua trajetória, Mário Faustino, nas palavras de Lília Chaves, "misturou a alegria de viver ao sentimento trágico da existência". Pela intensidade com que aproveitou cada dia de seus 32 anos, ou mesmo pela presença constante da morte em seus versos, até parece que sabia o triste desfecho de sua passagem pela terra. Enviado aos Estados Unidos pelo Jornal do Brasil, o avião em que viajava cai, em 1962, na região dos Andes peruanos. Naquele momento, cumpria o próprio presságio: "Poesia e vida minha hão de seguir paralelas, até que a morte nos separe".

Tese: Mário Faustino: uma biografia literária
Autora: Lília Silvestre Chaves
Defesa: 4 de fevereiro, junto à Pós-graduação em Estudos Literários da Faculdade de Letras (Fale)
Orientadora: Eneida Maria de Souza