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Nº 1544 - Ano 32
21.08.2006

UFMG desenvolve impermeabilizante inédito
a partir de rejeitos de isopor

Tecnologia, que beneficia meio ambiente, começa a ser utilizada pelo mercado

Ana Maria Vieira

á dois meses, um caminhão-baú, transportando cinco mil litros de verniz produzidos em Belo Horizonte, a partir de peças descartadas de isopor, iniciou longa viagem rumo a São Gonçalo do Amarante, na Região Metropolitana de Natal, no Rio Grande do Norte. A finalidade da encomenda: impermeabilizar 21 mil metros quadrados de amianto que recobre o teto de uma unidade da empresa têxtil Coteminas. A operação, viabilizada pela Fundep, selava ciclo importante de uma das mais originais pesquisas desenvolvidas na UFMG.

“Em nossas buscas nos bancos de patentes nacionais e estrangeiros não encontramos registro de qualquer produto similar”, revela Rochel Monteiro Lago, professor e pesquisador do departamento de Química do ICEx. Ao lado da professora Maria Helena Araújo, do mesmo departamento, e do ex-aluno de pós-graduação, Maurício Castro, ele iniciou, há quatro anos, trabalho de investigação sobre a transformação do isopor em novos materiais. Em 2004, os três obtiveram registro de patente no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) para produção de impermeabilizante, selante e verniz a partir de dejetos de poliestireno, polímero derivado do petróleo que serve como matéria-prima do isopor.
Eber Faioli

Maria Helena Araújo: isopor é produto
de elevado valor tecnológico

Rochel e Maria Helena coordenam grupo de pesquisa em Tecnologia Ambiental na UFMG, especializado em buscar novas destinações para materiais descartáveis. Segundo a professora Maria Helena, a pesquisa da UFMG com o isopor resultou num produto totalmente distinto – e de importância tecnológica – a partir de seus rejeitos. “A tecnologia de reciclagem adotada hoje pelo mercado consiste, sobretudo, em gerar produtos cuja base é o próprio isopor”, observa a pesquisadora, enumerando as aplicações mais comuns como cimento leve, caixas de CD, canetas, compostagem e aeração do solo. Mas esses materiais, de baixo valor agregado, não atraem investidores para o desenvolvimento de tecnologias de aproveitamento industrial.

É nesse ponto que as pesquisas realizadas na UFMG poderão instaurar novo padrão de reutilização do material, pois, conforme ressalta Maria Helena, “o impermeabilizante não é isopor, mas um novo material, de valor tecnológico ampliado, processado quimicamente”. Além desse diferencial, os pesquisadores relatam outras vantagens da fabricação do impermeabilizante, como o fato de ser um processo bastante simples e não gerar rejeitos no meio ambiente. Os custos foram considerados baixos pela equipe, tanto por essas características de fabricação como pelo valor dos insumos. “Utilizamos uma base química como reagente, que é barata e encontra-se disponível no mercado”, diz a professora. Já Rochel Lago lembra que a qualidade do impermeabilizante é comparável à dos melhores existentes no mercado nacional, conforme resultado de testes realizados em laboratório paulista, certificado pelo Inmetro.

Benefícios sociais
Além das vantagens econômicas e ambientais, o impermeabilizante desenvolvido na UFMG poderá gerar benefícios sociais. “É possível constituir uma rede de coleta, agregando catadores, indústria e comércio, antes de o isopor ser descartado nos lixões. Do contrário, haverá gasto muito elevado com água para lavá-lo”, diz Maria Helena. Esse processo é visto como uma das questões mais importantes do projeto de reutilização do material e, ao mesmo tempo, constitui um gargalo para sua aplicação imediata.

Segundo Rochel Lago, uma medida paliativa para formar uma rede fornecedora da matéria-prima do impermeabilizante seria a realização de acordos com o setor industrial e comercial, que utilizam grande volume de embalagens de isopor. No entanto, os pesquisadores não perdem de vista as vantagens sociais em incluir os catadores nessa nova cadeia produtiva. “É necessário discutir também o modo de remunerá-los pela coleta do produto, uma vez que o isopor é leve e ocupa bastante espaço”, observa Maria Helena.

Essa peculiaridade, no entanto, não deverá ser obstáculo para a implantação da tecnologia em escala industrial. Conforme antecipa Rochel, o grupo iniciou negociação com empresa interessada em obter licença para produzir o impermeabilizante. “Eles trabalham com isolantes térmicos e acústicos e acompanharam a aplicação do verniz na Coteminas”, diz Rochel.

A experiência no Nordeste iniciou-se há três anos, quando o presidente da empresa, Josué Gomes da Silva, visitou laboratórios de Química na UFMG. Desde então, o contato estreitou-se, e a companhia manifestou interesse em utilizar o verniz, devido aos bons resultados e ao baixo custo da tecnologia. O produto mostrou maior eficiência para impermeabilizar concreto e tijolo. Outros materiais testados com resultados positivos incluem madeira, papel e tecido. O impermeabilizante “verde” também protege contra a corrosão. O impacto que sua produção poderá ocasionar ao meio ambiente é dimensionado pela própria experiência na Coteminas: um volume equivalente a 12 caminhões-baús de isopor rendeu cinco mil litros do impermeabilizante. Cada litro do produto protege área correspondente a três metros quadrados.

Efeito que estufa

O isopor é obtido depois que sua matéria prima, o poliestireno, é posto em contato com um agente expansor – o pentano –, que infla o seu volume em pelo menos 50 vezes. É daí que vem o nome técnico, poliestireno expandido (EPS), que tem 98% de ar em sua composição. O produto é marca registrada (isopor®) e existe desde 1949. Apesar de ser 100% reciclável, na prática isso não ocorre e grandes volumes de rejeitos podem ser encontrados em lixões, rios e estradas.

O isopor não é biogradável e especialistas ainda não precisaram quanto tempo o produto levaria para se decompor na natureza. Bastante utilizado em embalagens de produtos industriais e alimentares, o material apresenta diversas vantagens como leveza, facilidade e versatilidade de uso, resistência ao envelhecimento e baixa condutividade térmica.

 

Pesquisa: Produção de impermeabilizante, selante e verniz a partir de dejetos de poliestireno
Unidade: Departamento de Química do ICEx
Equipe: Rochel Monteiro Lago, Maria Helena Araújo e Maurício Castro
Financiamento: CNPq, Capes, Sebrae e Fapemig
Apoio: Fundep e Instituto Inovação