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Nº 1571 - Ano 33
2.4.2007

Lição de humanismo

Escola de Veterinária chega aos 75 anos com uma trajetória de contribuições ao desenvolvimento da ciência animal

Fernanda Cristo

Fotos: Eber Faioli
Jeane Amaral - UFMG
Criação de coelhos na Fazenda Experimental de Igarapé: bem-estar humano como finalidade das pesquisas voltadas para a melhoria da saúde animal

Aom raras exceções, os alunos que ingressam na Escola de Veterinária da UFMG são apaixonados por bichos. Mas ao longo de sua trajetória na Unidade, eles aprendem que qualquer esforço para melhorar as condições de saúde dos animais têm um só objetivo: o bem-estar das pessoas.

Essa lição de humanismo é, talvez, a maior contribuição dada pela Escola de Veterinária, que completou 75 anos no dia 1º de março, ao desenvolvimento do ensino e da pesquisa na área de ciência animal. Os 4.462 alunos de graduação que já passaram por lá aprenderam, entre outras coisas, a desenvolver alimentos saudáveis, a prevenir doenças causadas por aves e mamíferos e a melhorar os animais geneticamente.

A Escola, que começou a funcionar em Viçosa, ocupa hoje, no campus Pampulha, um prédio de 35 mil metros quadrados que abriga mais de 50 laboratórios, além do Hospital Veterinário. A Unidade também possui duas fazendas – em Pedro Leopoldo e Igarapé – onde são realizadas pesquisas, aulas práticas e cursos de extensão. Os 90 professores estão divididos em quatro departamentos, que ministram disciplinas para os dez períodos de graduação, para os mestrados em Medicina Veterinária e Zootecnia e para o doutorado em Ciência Animal.

Pioneirismo

A Escola de Veteriária foi a primeira escola do Brasil a oferecer pós-graduação em Medicina Veterinária, a partir de 1968. O doutorado em Ciência Animal, implantado em 1989, é avaliado com conceito máximo – 7 – pela Capes. Até o momento, pesquisadores oriundos de várias instituições do país e exterior defenderam 1.778 teses e dissertações pela Escola, que se tornou referência nacional para a formação de professores e pesquisadores.

“A Escola de Veterinária desenvolve pesquisas de ponta e, certamente, é uma das unidades que mais contribuem para o desenvolvimento da ciência na UFMG”, avalia o diretor Francisco Lobato. Essa mentalidade voltada para a pesquisa também envolve o corpo discente da graduação, a quem são destinadas 150 bolsas de iniciação científica.

O perfil dos profissionais que saem da Escola de Veterinária, segundo o professor Lobato, é moldado por uma formação generalista: “Nossos médicos-veterinários são capacitados para atuar em três grandes áreas – produção, saúde animal e saúde pública”. A Unidade está atenta às demandas propostas pela sociedade. “Estamos preparando uma mudança curricular, e a inserção de médicos-veterinários na saúde pública continua sendo uma de nossas prioridades”, adianta o diretor.

No campo

No final da década de 1980, os alunos da graduação buscavam formas de aplicar no cotidiano os conhecimentos adquiridos em sala de aula. Uma proposta que surgiu neste período foi a realização de viagens ao campo, com acompanhamento de professores, onde seriam ministradas aulas práticas. A idéia era dividir os alunos em grupos para visitar propriedades e realizar diagnósticos de acordo com as áreas de atuação do professor acompanhante. Em 1987, as chamadas Aulas Práticas Integradas de Campo (Apics) foram inseridas no currículo do curso como disciplinas optativas.

Atualmente são realizadas quatro Apic’s por semestre, nas quais 40 alunos do sexto, sétimo, oitavo e nono períodos, orientados por cinco docentes, passam cinco dias em cidades do interior visitando uma média de sete propriedades por dia. O programa também inclui palestras para os produtores locais. As aulas são desenvolvidas com a colaboração de prefeituras, sindicatos e produtores autônomos. Até o ano passado, 2.832 propriedades foram visitadas por 5.129 alunos.

Outros projetos de extensão de destaque são o próprio Hospital Veterinário, que possui uma estrutura para atendimento de pequenos e grandes animais, e o projeto Correção Ambiental e Reciclagem com Carroceiros de Belo Horizonte, desenvolvido em parceria com a Administração Regional da Pampulha, e que cuida da inclusão socioeconômica dos carroceiros e oferece assistência médico-veterinária aos animais. “A atividade de extensão é um dos carros-chefes da Escola de Veterinária e atinge áreas urbanas e rurais. Diariamente, professores recebem telefonemas de pessoas pedindo orientações”, explica o vice-diretor Renato Saccheto Tôrres.

O Hospital Veterinário acolhe por mês cerca de 1.500 animais. Seus proprietários pagam um valor abaixo do preço de mercado ou, quando carentes, são atendidos gratuitamente. Além do atendimento de rotina, o Hospital oferece serviços especializados que não existem nas clínicas convencionais, como cardiologia e hemodiálise.

Comemorações

As comemorações do 75º aniversário da Escola de Veterinária iniciaram-se oficialmente na última sexta-feira, 30 de março. Na solenidade, o docente Ivan Barbosa Machado Sampaio recebeu o título de professor emérito da UFMG e o professor Élvio Carlos Moreira, do departamento de Medicina Veterinária Preventiva, diretor entre 1982 e 1986, resgatou os principais marcos da história da Escola.

O calendário de eventos inclui várias atividades que serão realizadas ao longo do ano. “A idéia é celebrar os 75 anos valendo-se daquilo que a Escola promove rotineiramente, como seminários, cursos e palestras”, explica o presidente da comissão organizadora das comemorações, professor José Ailton da Silva, que dirigiu a Escola entre 1990 e 1994.

Tradição com ousadia

A Escola de Veterinária foi fundada em 1920, em Viçosa, na Zona da Mata de Minas Gerais, mas apenas em 1932 – data oficialmente considerada como o seu marco inaugural –, o curso começou a funcionar, integrando a Escola Superior de Agricultura e Veterinária (Esav). A mudança para a capital aconteceu em 1942, quando Juscelino Kubitschek, à época prefeito de Belo Horizonte, construiu o Parque da Gameleira e precisava ocupá-lo com técnicos em agricultura e pecuária. Seis anos depois, foi criada a Universidade Rural do Estado de Minas Gerais (Uremg), que reunia, entre outras instituições, a Escola Superior de Agricultura de Viçosa e a Escola Superior de Veterinária de Belo Horizonte.

Em 1961, a Escola de Veterinária foi incorporada à UFMG. A mudança para o campus Pampulha aconteceu em 1974, quando as antigas instalações no bairro Nova Suíça foram repassadas ao Cefet. O professor Élvio Carlos Moreira tem uma ligação com a Escola que remonta à década de 60, quando foi aluno de graduação. “Ao longo do tempo houve alguns ajustes, para atender às demandas sociais. Ampliamos a produção de determinadas espécies, aumentamos o número de vagas na graduação, mas a essência não mudou. Desde os primórdios, guardamos uma concepção de ciência veterinária como promotora da saúde”, resume o professor.

Apesar do apreço pela tradição, a Escola soube inovar. Foi a primeira da UFMG a criar um centro de extensão, em 1966, e pioneira no Brasil na implantação de mestrado em medicina veterinária. “A Escola de Veterinária da UFMG sempre procurou incentivar e qualificar seus docentes e mantê-los atualizados, por meio de programas de doutorado, pós-doutorado, intercâmbios e estágios em centros de excelência científica e técnica no Brasil e no exterior”, analisa Élvio Carlos Moreira.

 

Tem boi na grama

boi na gramaNo meio do gramado havia um boi. Aparentemente disforme, com suas pernas curtas e cabeça minúscula saindo de um dorso alto, magro e, contraditoriamente, farto em volume. Certamente não é um animal qualquer: fruto da imaginação de um dos expressivos artistas plásticos brasileiros, Jarbas Juarez, tomou forma como escultura e, desde 1973, tem morada fixa na Escola de Veterinária. A integração foi imediata e esse animal tão especial inspirou a logomarca oficial da Escola. A justificativa não ocorre apenas de afinidades evidentes, mas do papel que esse animal tem na história e na economia mineira.

Para o professor Nivaldo da Silva, outro aspecto reforçado pela visão do artista foi determinante na eleição desse símbolo para a Escola: “Ele representa a maximização da produção e da produtividade animal, dado à característica de exibir, em suas partes mais nobres, um maior potencial de produção de carne e de leite". Construída em um período em que Jarbas Juarez, que foi professor da Escola de Belas-Artes, se destacava pela ousadia e experimentação de sua obra, lançando-se no cenário artístico nacional, o trabalho conquistou lugar especial ao lado de outras esculturas de grandes dimensões feitas preferencialmente em sucata.

Construído em fibra de vidro e resina poliéstar, o boi andou sumido nos últimos tempos. Passou por uma restauração – afinal são 34 anos sob sol e chuva –, mas já está de volta ao seu hábitat (quase) natural.