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Nº 1632 - Ano 35
03.11.2008

Uma equação social

Seminário discute relações entre raça,
pobreza e democracia

Divulgação
MV Bill
MV Bill: políticas públicas muito aquém das necessidades

Itamar Rigueira Jr.

Como se articulam no Brasil raça, pobreza e democracia? Como ampliar os benefícios da democracia para reduzir a desigualdade, e onde a questão racial entra nessa equação? Essas e outras perguntas serão postas na mesa de debate em seminário nesta quarta-feira, dia 5, a partir das 10h30, na Faculdade de Educação (FaE) da UFMG. Promovido pela revista Veja, o evento leva a algumas universidades brasileiras novas versões de uma série de encontros promovidos este ano para comemorar o quadragésimo aniversário da publicação.

A missão de compor a mesa para o seminário Sociedade: raça, pobreza e democracia foi confiada ao professor Eduardo Rios Neto, da Faculdade de Ciências Econômicas (Face), que vai trazer à UFMG Fábio Wanderley Reis, cientista político e professor emérito da Universidade, Ricardo Henriques, assessor da presidência do BNDES, e o rapper MV Bill, presidente de honra da Central Única das Favelas (Cufa), sediada no Rio de Janeiro. “Imaginamos um formato não totalmente acadêmico, envolvendo um intelectual, um gestor público e um militante da sociedade civil”, conta Eduardo Rios Neto.

Coordenador de pesquisa sobre o Bolsa-Família encomendada pelo governo e realizada em 2005, Eduardo está certo de que os programas sociais estarão entre os assuntos tratados no debate desta semana. “Vale a pena discutir em que medida o combate à pobreza se faz com transferência de renda ou política econômica. Isso é um falso dilema, porque é possível investir nas duas coisas”, opina. As cotas para negros nas universidades são, para o professor, outro assunto inevitável. Ele discorda dos que defendem políticas sociais com foco apenas nos pobres. “Não há como negar a correlação entre pobreza e raça, daí a importância das ações afirmativas”, defende.

Para Fábio Wanderley Reis, o debate se justifica pela clara articulação das questões mencionadas no título do seminário. “Mais de três séculos de escravidão marcaram e continuam marcando a estrutura social do Brasil”, diz ele, acrescentando que este é um dos fatores que influenciam o processo eleitoral. De acordo com o cientista político, o voto tem clara projeção social e regional, como demonstrou a eleição presidencial de 2006. “O apoio a Lula crescia no sentido Sul-Nordeste. E na cidade de São Paulo há uma divisão definida pela condição socieconômica: o antipetismo domina as classes favorecidas e o voto no PT se concentra na periferia”, ele exemplifica.

Wanderley Reis ressalta que o eleitorado pobre já não é tão passível de manipulação e passa a reivindicar. “Para conquistar maioria de votos, é preciso estar atento à temática social”, diz. Ele apóia as políticas de distribuição de renda, pois o desenvolvimento não tem bastado para reduzir a pobreza no país. “No último século, o Brasil esteve entre os países de maior crescimento, mas a desigualdade persistiu.”

Estratégia sustentável

Ex-secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o economista Ricardo Henriques concorda que desenvolvimento social não se confunde com crescimento econômico. Para ele, a redução da pobreza exige uma estratégia sustentável, porque é necessário enfrentar a desigualdade. De acordo com ele, essa desigualdade tem duas dimensões principais: a regional e a racial. “Qualquer estratégia precisa repensar a diversidade, o que inclui discutir, entre outros aspectos, o papel da população negra na sociedade contemporânea”, afirma Henriques.

MV Bill estará em Belo Horizonte no dia 5 para lembrar que a democracia não é plena se as oportunidades e o acesso à informação são restritos. Segundo ele, saúde e educação também precisam ser democratizadas. “A falta de democracia aumenta o abismo que separa as partes ‘boa’ e ‘podre’ da sociedade”, diz MV Bill.

O artista e militante destaca a força dos movimentos sociais e elogia iniciativas do governo federal, como os Pontos de Cultura, que promovem a prática artística em comunidades carentes, e a atuação do Pronasci (programa do Ministério da Justiça que articula políticas de segurança com ação social), que “atacam as causas da criminalidade e da violência, em vez de apenas condenar”. Ele salienta, porém, que “as políticas públicas ainda estão muito aquém das necessidades das minorias”.