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Nº 1684 - Ano 36
1.3.2010


Universidade em transformação

O professor Sérgio Cardoso, do Departamento de Filosofia da USP, é convidado especial da Semana de Recepção aos Calouros. Nesta entrevista ao BOLETIM, ele antecipa o conteúdo da palestra que fará para os novos estudantes, que, em sua opinião, terão papel decisivo na “revitalização” da universidade brasileira.

A questão-tema de sua palestra é: “Que fazer nas universidades e das universidades?”. Como o senhor pretende responder a essa pergunta?

Tomei um título abrangente porque o tema é amplo, complexo e polêmico. Minha intenção, no entanto, é modesta. Gostaria de lembrar aos calouros da UFMG – pois é para eles que falarei – a importância da instituição que eles passam a integrar, suas fragilidades, dificuldades e as perspectivas de sua revitalização, que dependem em grande parte dos estudantes e, em particular, desses jovens que nos próximos anos vivenciarão um processo fundamental de transformação das universidades brasileiras.

Como o senhor vê esse movimento de inclusão de grupos sociais que até bem pouco tempo atrás tinham poucas oportunidades de ingresso nas universidades brasileiras? Como avalia medidas como cotas, bônus e o ProUni?

A universidade pública brasileira é inaceitavelmente elitizada do ponto de vista social. A inclusão dos mais pobres e das chamadas minorias e a necessidade de uma realização efetiva do dever do Estado de proporcionar amplo acesso à educação superior são reconhecidas até mesmo por pessoas politicamente muito conservadoras. A questão está na forma de se alcançar isso. De antemão, o que posso dizer é que não há solução, em si mesma, justa, legítima e incontroversa. Trata-se – sem ignorar a justiça, a legalidade e certo bom senso – de tomadas de posição conjunturais e políticas. De minha parte, creio que as cotas podem ser benéficas, que a reserva de um número de vagas (com seleção por mérito, obviamente) para egressos de escolas públicas é muito importante. Apoio o ProUni como uma medida conjuntural – quase emergencial – para uma geração que não pode esperar pelas condições para a adequada expansão do ensino público.

Há quem afirme que a inclusão desses alunos pode prejudicar a qualidade do ensino superior público...

Não concordo. Em primeiro lugar porque eles passam (e devem passar) por avaliações de habilitação (e aproveito para dizer que o vestibular simplesmente classificatório é uma distorção. É preciso haver avaliação, como a feita pelo Enem, por exemplo). Depois, o vestibular frequentemente avalia mais conhecimentos acumulados do que capacidade para enfrentar o ensino superior. Por fim, já se sabe que egressos de escolas públicas e selecionados pelo sistema de cotas têm demonstrado, na média, um rendimento em muitos casos superior ao de outros estudantes, como revelam estudos da Unicamp e da UFRJ.

Pluralidade em retalhos

Luiza Andrade

Quem chega ao campus Pampulha pela avenida Antônio Carlos deve ter notado um grande painel com a representação de uma colcha de retalhos, o símbolo da campanha de conscientização da comunidade acadêmica sobre o Programa de Bônus. “A ideia da colcha de retalhos é um desdobramento da noção da pluralidade, não só de pessoas e culturas diferentes, mas também de contextos sociais diversos que trabalham em harmonia, contribuindo para a expansão do conhecimento e o enriquecimento dos debates acadêmicos”, analisa a professora Cláudia Mayorga, do Departamento de Psicologia da Fafich e representante da Comissão Permanente de Estudos e Acompanhamento de Medidas de Inclusão Social no Corpo Discente (Cais).

Segundo ela, a campanha parte do princípio de que a Universidade só tem a ganhar ao incorporar novos grupos sociais por meio do Programa de Bônus. “Assim, podemos trabalhar a extensão universitária em outra perspectiva, aproximando a academia de um contexto social mais realista.”
Cláudia Mayorga explica que a comissão de monitoramento do Programa de Bônus foi instituída pela Universidade não apenas para acompanhar os alunos “bonistas”, mas também para observar a própria recepção da comunidade acadêmica ao sistema. Ela lembra que não basta acompanhar o desempenho acadêmico dos alunos em sala de aula, mas que é preciso, sobretudo, avaliar a integração desses grupos ao ambiente acadêmico.

Frentes

A Comissão Permanente de Estudos e Acompanhamento de Medidas de Inclusão Social no Corpo Discente da UFMG (Cais) é formada por duas frentes de ação: a Subcomissão de Acompanhamento e a Subcomissão do Censo. A primeira encarrega-se de avaliar o desempenho dos alunos no ambiente acadêmico e o modo como a Universidade recebe os novos alunos. Também propõe medidas e ações para facilitar a inserção e fornece instrumentos (cursos, debates e ações profissionalizantes) para que os “bonistas” explorem ao máximo as potencialidades oferecidas pela academia. A Subcomissão do Censo ocupa-se da formulação de questionários e outros instrumentos para diagnosticar a situação social e acadêmica do corpo discente da UFMG.

Adotado no Vestibular 2009, o Programa de Bônus estabelece um adicional de 10% na nota dos alunos que cursaram os sete últimos anos em escolas públicas. Aqueles que se enquadram nessa condição e ainda se autodeclaram negros recebem bônus de 15%.