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Nº 1728 - Ano 37
28.02.2011

Ela lida com “GENTE de CARNE e SANGUE”

Faculdade de Medicina comemora 100 anos cada vez mais próxima da população

Larissa Nunes*

Bruna Carvalho
Vista aérea da Faculdade de Medicina: prática médica aliada ao avanço tecnológico

Ao anotar que “uma coisa é pôr ideias arranjadas, outra é lidar com país de pessoas, de carne e sangue, de mil e tantas misérias”, João Guimarães Rosa criticava o distanciamento entre o sistema político e a população brasileira. Mas não seria nada impróprio se o trecho de Grande sertão: veredas também tivesse sido escrito para alfinetar o ensino médico há 80 anos, época em que um dos mais renomados escritores brasileiros estudava na Faculdade de Medicina da UFMG.

Nos 100 anos de existência da quarta escola de medicina mais antiga do país, fundada em 5 de março de 1911, poucas transformações foram tão orgulhosamente recebidas como a aproximação do ensino com a prática médica. Ano após ano, os alunos são inseridos, sob acompanhamento de professores, com mais antecedência nos ambientes de cuidados com a saúde, onde têm contato com os pacientes “de carne e sangue”. Hospitais, ambulatórios, postos de saúde, creches e asilos transformaram-se nas melhores salas de aulas.

“No início, o trabalho com o público era pequeno, e os projetos de extensão, quase inexistentes. Hoje, os alunos têm aulas nos ambulatórios e fazem o internato rural”, aponta o professor Ajax Pinto Ferreira, do Departamento de Cirurgia e formado pela turma de 1971. Ele se refere ao programa que prevê a estada, por três meses, de alunos do último ano do curso em cidades do interior de Minas Gerais. Nesse período em que atendem moradores de lugares com recursos mais limitados e “sem ressonância magnética”, como destaca o professor.

Portas abertas

Ao mesmo tempo em que a Faculdade de Medicina vai invadindo, no melhor sentido da palavra, espaços de saúde pública, nota-se que o caminho inverso vem sendo percorrido: a população nunca esteve tão representada dentro da unidade. O curso de Medicina, que no passado já foi tachado de elitista, está formando alunos de todas as classes sociais. “A política do bônus no vestibular para alunos negros e pardos e oriundos de escolas públicas ajudou a diversificar nosso corpo discente”, destaca o diretor da Faculdade de Medicina, Francisco Penna.

Há 10 anos, a Faculdade abriu suas portas para outra área da saúde: a Fonoaudiologia,cuja graduação recebe 50 alunos por ano. A área estuda agora estruturar programas de pós-graduação. E mais recentemente, com o curso Tecnologia em Radiologia, implantado em 2010, a instituição passou a receber estudantes no período noturno e ingressou de vez no ramo das graduações tecnológicas, formando profissionais para atuar nas áreas de Medicina Nuclear, Radiologia e Radioterapia.

Com o pé na UFMG

Quase todos os mineiros nascem com o pé na UFMG. A brincadeira é quase um clichê, mas serve para ilustrar o alcance do trabalho do Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad), criado em 1993. Ele é responsável pelo terceiro maior programa de triagem neonatal do mundo, atrás apenas de duas iniciativas norte-americanas. O “teste do pezinho” permite a detecção precoce de quatro doenças: fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, doença falciforme e fibrose cística.

Foca Lisboa
Manuscrito
Triagem neonatal: diagnóstico de quatro doenças congênitas

Além de se destacar no diagnóstico, o Nupad é reconhecido pelo acompanhamento prestado às crianças que recebem o resultado positivo para essas doenças. “É o nosso diferencial. Em muitos setores, realiza-se somente a triagem. No Nupad, nós fazemos o tratamento – e sem ônus algum para o paciente”, afirma Francisco Penna.

Outra referência no país é o Núcleo de Educação em Saúde Coletiva (Nescon), responsável por pesquisas e assessoria na área de políticas públicas e por desenvolver trabalho de capacitação de profissionais para atuação no Sistema Único de Saúde, principalmente na Atenção Básica em Saúde da Família.

Ainda no ramo da medicina preventiva e social, destaca-se o Projeto Manuelzão, criado em 1997 por iniciativa de professores da Faculdade de Medicina para o desenvolvimento de atividades de revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas. A proposta dos médicos de lutar pela promoção de qualidade de vida teve tanta repercussão em Minas Gerais, que, hoje, o Manuelzão já se destaca com projetos também na área cultural.

Com o pé no futuro

Em abril, chega à faculdade o equipamento Pet Scan, que funcionará dentro do Instituto Nacional em Ciência e Tecnologia (INCT) de Medicina Molecular. Com custo estimado em mais de R$ 7 milhões, o aparelho é capaz de realizar exames de imagem para detecção precoce de tumores e do Alzheimer. Os primeiros beneficiados pela novidade serão os pacientes do Hospital das Clínicas da UFMG.

Outro projeto que promete ser um marco tecnológico nas atividades da Faculdade de Medicina é o Laboratório de Genômica, com inauguração prevista para 2011. Ao mapear o genoma a custos mais baixos, o laboratório poderá contribuir decisivamente na prevenção e tratamento de doenças de alta incidência, como hipertensão, aterosclerose e até mesmo o câncer. "Seu grande diferencial será a capacidade de ler o genoma e selecionar informações importantes para a medicina", afirma o professor Sérgio Danilo Pena, um dos responsáveis pelo primeiro sequenciamento de genoma realizado no Brasil, iniciado em 1992.

Ao Cetes, Centro de Tecnologia Educacional em Saúde, atribui-se o primeiro impulso que empurrou a Faculdade de Medicina para mais perto da tecnologia da saúde. A distância, os cursos contam com animações, vídeos e recursos 3D que estimulam o aprendizado dos alunos. O Cetes também disponibiliza manequins robotizados e semirrobotizados para aulas práticas no laboratório de Simulação.

Manuscrito

Programação

Dia 14 de março, às 17 h

Dia 28 de março, às 19h30, no Minascentro

Acervo Centro de Memória da Medicina UFMG
Manuscrito
O Palacete Thibau, no Centro de BH, foi a primeira sede da Faculdade de Medicina

Em 17, os primeiros 17

Foi em um prédio na esquina da avenida Afonso Pena com rua Espírito Santo que, em 1917, Belo Horizonte viu graduarem-se seus 17 primeiros médicos. A atual sede, apelidada de "Caixotão", só foi erguida em 1960, na avenida Alfredo Balena, depois que a anterior, no mesmo endereço, foi demolida. No "Caixotão", a Medicina cresceu e se consolidou, passando a receber 320 calouros todos os anos, frente aos 160 que ingressavam até os anos 60. Hoje, são quase 2 mil estudantes, 11 departamentos, 398 professores e 115 funcionários técnico-administrativos.

A Faculdade de Medicina também ganhou seus “tentáculos”: o Hospital das Clínicas, na área hospitalar, e, mais recentemente, o Risoleta Tolentino Neves, na região de Venda Nova. Juntos, oferecem 62 programas de residência médica. A unidade também deu origem ao Instituto de Ciências Biológicas, hoje no campus Pampulha.

Dos mais de 15 mil diplomas emitidos pela Faculdade de Medicina, alguns guardam assinaturas que também marcaram a história do Brasil. Além de Guimarães Rosa, formado pela turma de 1930, passaram pela Medicina da UFMG Juscelino Kubitschek e Pedro Nava, colegas até 1927, Amílcar Viana Martins, em 1929, e Ivo Pitangui, em 1946.

*Jornalista da Assessoria de Comunicação Social da Faculdade de Medicina da UFMG