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Nº 1728 - Ano 37
28.02.2011


Os CIENTISTAS que queriam mudar o Brasil

Historiadora relata em livro a trajetória dos ‘biólogos militantes’ do Museu Nacional do Rio de Janeiro

João Kleber de Mattos

Manuscrito

Na primeira metade do século 20, um grupo de cientistas acreditou que poderia usar seu conhecimento para transformar o Brasil. Escreveu livros, produziu programas de rádio e filmes educativos, editou revistas, organizou exposições, congressos e sociedades científicas e viajou o mundo em visitas a museus e universidades, desfraldando uma bandeira preservacionista que só se transformaria em agenda global algumas décadas depois.

A experiência durou menos de 20 anos, mas deixou marcas na história da ciência brasileira. A ponto da professora Regina Horta Duarte, do Departamento de História da Fafich, registrá-la no livro A biologia militante: o Museu Nacional, especialização científica, divulgação do conhecimento e práticas políticas no Brasil – 1926-1945, lançado recentemente pela Editora UFMG, dentro da coleção do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (Ieat).

A saga foi protagonizada pelos cientistas do Museu Nacional do Rio de Janeiro. “O que eles queriam era mudar o país”, afirma Regina Horta. Segundo ela, o grupo atuava junto ao Ministério de Educação e Saúde do Governo Vargas e pressionava pela elaboração de leis voltadas para a preservação da natureza. Um dos frutos mais importantes desse esforço foi o Código de Caça e Pesca, publicado em 2 de janeiro de 1934 no Diário Oficial. O decreto baseava-se no anteprojeto elaborado pelo diretor do Museu, Roquette-Pinto, pelo botânico Alberto Sampaio e pelo aracnólogo Mello Leitão, que, em 1918, fora professor da antiga Faculdade de Medicina de Belo Horizonte – uma das quatro unidades que em 1927 dariam origem à UFMG.

Esses cientistas, segundo Regina Horta, estavam conectados com o conhecimento gerado no mundo à época. Dedicavam-se à produção e divulgação científica nas áreas de botânica, antropologia, paleontologia e zoologia. Montaram uma sala de cinema no Museu Nacional para exibição de filmes educativos realizados na instituição.

De acordo com a historiadora, a influência dos cientistas do Museu Nacional perdeu força a partir do final da década de 40. Um dos fatores do esquecimento de sua ação preservacionista pode estar associado à onda desenvolvimentista que tomou conta do país a partir de então. “Suas ideias passaram a ter ressonância cada vez menor”, diz a professora.

Interesse

A biologia militante é resultado de tese defendida, em março do ano passado, pela professora Regina Horta em concurso para professor titular do Departamento de História da Fafich. Seu interesse pela trajetória dos pesquisadores do Museu Nacional surgiu nas atividades do Grupo de Pesquisa Coleção Brasiliana, liderado pela professora Eliana Dutra. Os cientistas do Museu Nacional publicaram vários livros nessa coleção, organizada por Fernando Azevedo a partir de 1931.

Regina Horta pesquisou arquivos na Argentina, Uruguai, São Paulo e Rio de Janeiro. Entre os desafios, a historiadora menciona o estudo da história da biologia. “Cheguei à conclusão de que a reflexão sobre o tempo é tão essencial na história quanto na biologia. As duas disciplinas lidam com a importância do acontecimento e da criação e também ressaltam que é preciso considerar o jogo das probabilidades entre o acaso e a necessidade”, comenta ela, que frequentou a Seção de Memória e Arquivo do Museu Nacional, fundado por Dom João VI em 1818, no Rio de Janeiro, e que hoje está vinculado à UFRJ.

Livro: A biologia militante: o Museu Nacional, especialização científica, divulgação do conhecimento e práticas políticas no Brasil – 1926-1945
Autora: Regina Horta Duarte
Editora UFMG
Área: História da Ciência/História do Brasil
Coleção: Ieat
218 páginas
R$ 42