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Nº 1744 - Ano 37
15.8.2011

Simbiose pela DIVERSIDADE

Pesquisadora descobre na Serra do Cipó novas espécies e grande variedade de fungos que contribuiriam para a riqueza dos campos rupestres

Itamar Rigueira Jr.

Os campos rupestres, presentes principalmente em altitudes acima de 900 metros, são considerados ecossistema único pelas variações no ambiente e pela grande riqueza em espécies vegetais e endemismo. O solo de características especiais é tido como o principal modulador dessa diversidade. Em estudos para tese de doutorado desenvolvida no Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG, a pesquisadora Fernanda de Carvalho constatou que os solos dos campos rupestres da Serra do Cipó, que integra a cadeia do Espinhaço em Minas Gerais, abrigam alta diversidade de fungos micorrízicos arbusculares (FMA) – 23% das espécies descritas até o momento no mundo e 40% no Brasil.

Além disso, o trabalho relata o primeiro registro no país das espécies Pacispora dominikii e Acaulospora colossica, e três possíveis espécies novas: duas do gênero Acaulospora e outra do gênero Scutelospora. De acordo com a pesquisadora, o achado mais relevante é a diversidade de FMA em campos rupestres, mesmo considerando que o estudo foi realizado apenas em época de seca, o que pressupõe que a variedade dos fungos é provavelmente ainda maior. “Esse trabalho confirmou a importância de estudos em ecossistemas de campo rupestre. A diversidade variou de acordo com o ambiente, mesmo com a proximidade entre eles. Isso sugere que a comunidade de plantas está intimamente ligada à diversidade de FMA”, afirma Fernanda de Carvalho.

‘Prestadores de serviços’

Os fungos são microrganismos que retiram sua energia de substâncias orgânicas, tendo como principal função a decomposição de resíduos no solo. Os fungos micorrízicos arbusculares (FMA) não provocam, em suas associações com as plantas, alterações morfológicas nas raízes colonizadas. E eles só se propagam quando associados a plantas vivas. Com origem que remonta a entre 353 e 462 milhões de anos, eles são considerados multifuncionais no ecossistema.

“Os FMA estabelecem simbiose mutualística com cerca de 80% das plantas terrestres. A planta supre o fungo com energia para crescimento e reprodução, e esse microrganismo presta à planta e ao solo serviços como absorção de nutrientes obtidos de áreas localizadas além da zona de absorção da raiz, em especial o fósforo, que é pouco móvel”, explica Fernanda de Carvalho. Além disso, de acordo com ela, os FMA aumentam a resistência da planta ao ataque de patógenos e sua capacidade de absorção de água. E ainda favorecem o sequestro de carbono da atmosfera, entre outras funções.

A pesquisadora ressalta que várias espécies de plantas são dependentes dessa associação para sobreviver em solos de baixa fertilidade natural. “Por isso, o primeiro passo para explorar o significado dessa simbiose para a manutenção da riqueza de ecossistemas naturais é conhecer a diversidade dos FMA, objetivo central da minha tese”, diz Fernanda.

São conhecidas 122 espécies de FMA no Brasil, mais de 50% da diversidade total (216 espécies) já identificada no mundo. Mas os estudos em geral, segundo a pesquisadora, têm se restringido a algumas formações vegetais ou ecossistemas. Seu trabalho foi o primeiro a analisar a composição específica das comunidades de FMA e a relação desses organismos com características físico-químicas dos solos e com a variedade de plantas nos diferentes habitats dos campos rupestres da Serra do Cipó (afloramentos rochosos, brejos arenosos e turfosos, cerrado e campo pedregoso).

Caracterização genética

Orientada pelo professor Geraldo Wilson Fernandes, Fernanda de Carvalho desenvolveu pesquisa de campo na reserva particular Velozia. Em visitas mensais, ela fez o levantamento florístico dos diferentes ambientes. Para determinação da diversidade dos fungos, utilizou o laboratório da Embrapa Agrobiologia, em Seropédica (RJ). Juntamente com os estudos relacionados aos FMA, Fernanda de Carvalho iniciou trabalho com bactérias fixadoras de nitrogênio. Em pós-doutorado em curso na Universidade Federal de Lavras, prossegue nas pesquisas com essas bactérias e busca a caracterização genética dos fungos micorrízicos arbusculares.

A pesquisadora considera que uma de suas principais contribuições foi mostrar a grande diversidade dos FMA nos campos rupestres, e consequentemente reforçar a importância de políticas de conservação desse ecossistema. “Eles são um excelente campo de pesquisa. Afinal, por que os campos rupestres são tão ricos em diversidade de plantas e endemismo? A ligação íntima dos FMAs com a produtividade das comunidades vegetais não os torna em grande parte responsáveis por essa riqueza do ecossistema?”, questiona Fernanda Carvalho, enquanto continua trabalhando em busca de respostas.

Tese: Abundância de espécies de plantas e diversidade de simbiontes radiculares em campos rupestres da Serra do Cipó, MG
Autora: Fernanda de Carvalho
Defesa: em 2010, no programa de Pós-graduação em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre do ICB
Orientador: Geraldo Wilson Fernandes
Co-orientadores: Francisco Adriano de Souza (Embrapa Milho e Sorgo) e Fatima Maria de Souza Moreira (Ufla)