Protocolos Anestésicos

Considerações anestésicas em animais de laboratório

Em pesquisas científicas, a utilização de animais de laboratório representa um dos dilemas mais conflitantes no debate bioético. O principio dos 3 R’s de Russel e Burch propõe a redução do número de animais utilizados em cada experimento, a substituição por métodos alternativos e o refinamento das técnicas objetivando evitar a dor e sofrimento desnecessários deve ser imperativo.

Conhecimento prévio acerca da fisiologia, comportamento, técnicas de contenção física e farmacológica sobre os fármacos à serem empregados para realizar procedimentos anestésicos, devem ser estudadas. Particularidades e variabilidade espécie-específica existem, havendo grande variação da posologia a ser empregada, e a segurança e correto manejo da dor só é obtido monitorando e diagnosticando pronto e adequadamente qualquer alteração observada.

Camundongos e ratos

Os cuidados pré-anestésicos de roedores devem incluir uma revisão do histórico sanitário da colônia e aspecto físico do animal. A administração parenteral do agente anestésico constitui o método mais comum em roedores. O volume da droga, local de administração e propriedades irritantes do agente devem ser considerados. Para minimizar erros em injeção intraperitoneal, o jejum de quatro horas e uso de agulha 20-22 são recomentadas. A água não deve ser restringida.

Coelhos

Nesta espécie, o ceco pode atuar como um reservatório para o anestésico, alterando o efeito do fármaco. Recomenda-se calcular a dose baseada no peso metabólico (peso do corpo X 0.75). A idade, sexo, raça e linhagem, peso e período do dia podem afetar a resposta aos fármacos empregados. Não há necessidade de jejum, porque os coelhos apresentam alta taxa metabólica e baixo risco de vômito. Recomendam-se tubos de 2 a 4 mm de diâmetro para intubação endotraqueal, lembrando que somente deve ser feito por pessoas treinadas, por apresentar alta dificuldade para sua realização e alta incidência de laringoespasmo. Há necessidade de suplementação de oxigênio em animais submetidos à anestesia geral.

Suínos

São animais estressáveis e muito sensíveis à contenção e à anestesia. Em alguns casos estes eventos produzem hipertermia maligna, que provoca rigidez muscular, taquipneia, taquicardia e hipertermia, seguida de dispneia, arritimias cardíacas e morte. A preparação pré-anestésica deve incluir jejum sólido de 12 horas e hídrico de 4-8 horas. Há necessidade de intubação endotraqueal e suplementação de oxigênio nestes animais.

Protocolos anestésicos

Protocolo sedativo e/ou anestésico seguro e eficaz deve conferir adequada sedação, redução do estresse e analgesia, de acordo com o procedimento à que o animal será submetido. Para protocolos sedativos, podem ser empregados os fármacos e sua posologia destacados na Tabela 02, de forma isolada ou associados com fármacos opióides presentes na Tabela 06, o que proporcionará grau de sedação leve a moderado, possibilitando a manipulação e avaliação dos animais, exame físico e coleta de sangue por exemplo. Para promover sedação em grau mais intenso, as associações presentes na Tabela 05 devem ser empregadas, e caso seja realizado procedimento mais invasivo que possa cursar com sensibilidade dolorosa, os analgésicos opióides devem ser administrados conjuntamente.

Quando se fala em anestesia geral, não apenas imobilidade, miorrelaxamente e inconsciência devem ser promovidos ao paciente, mas a analgesia deve imperativa sempre que seja realizado procedimentos invasivos e dolorosas, prezando assim pelo bem estar do animal, reduzindo seu estresse e sofrimento. Para anestesia cirúrgica, os protocolos indicados consistem na associação de pré anestésicos (Tabela 02) seguida da indução anestésica (Tabela 03) e sua manutenção pode ser obtida através de bolus repetidos do fármaco indutor, bem como pode ser realizada pela administração de anestésicos inalatórios (Tabela 04). Algumas associações farmacológicas (Tabela 05) podem ser empregadas, e associadas com fármacos opióides (Tabela 06) promovendo analgesia durante o procedimento.

Cuidados pós-operatórios

A recuperação dos animais deve ser feita em sala aquecida, sem ruídos e com luz reduzida. A supressão do sofrimento e da dor deve ser uma das prioridades da experimentação animal. Os procedimentos cirúrgicos invasivos são suscetíveis de causarem dor e o estresse pós-operatório pode comprometer seriamente o bem-estar animal. A temperatura da sala deve estar em torno de 25 graus Celsius para evitar a hipotermia. Os comitês internacionais recomendam enfermagem em tempo integral nas primeiras 48 à 72 horas pós procedimento. A dor no pós-operatório deve ser pesquisada sistematicamente para determinar se o animal necessita da administração de analgésico (Tabela 06). A pesquisa envolve vários indicadores como: avaliação da atividade motora, alteração da aparência, como postura encurvada, piloereção, secreção ocular ou nasal; alteração do temperamento, aumento da agressividade, relutância em interagir; alteração na vocalização, batimento ou ranger de dentes; alteração no consumo de alimentos ou água, perda de peso, diminuição da excreção de fezes e urina; alterações fisiológicas, nos batimentos cardíacos, frequência respiratória, pressão arterial. Avaliação do local da cirurgia: eritema, edema, secreções, etc.

Tabela 1 Valores médios dos principais parâmetros fisiológicos de mamíferos de laboratório.

Espécie

Peso (Kg)

f

(m/min.)

VC

(mL)

Freq.Card.

(bat/min)

Volume sanguíneo

(ml/Kg)

Temperatura central

o.C

Camundongo

0,03

180

0,15

550-600

75

37,4

Hamster

0,08

80

0,8

350

72

37,4

Gerbil

0,09

90

0,9

260-600

75

39

Rato

0,2

90

1,6

350

58

38

Cobaia

0,5

120

205

155

75

38

Gato

3

26

30

150

85

38,6

Coelho

3

50

20

220

70

38

Primata

10

35

50

150

75

39

Cão

15

25

150

100

80

38,3

Porco

20

18

420

80

70

39

Ovelha

45

20

300

75

60

39,1

Cabra

50

20

325

80

70

39,4

Porco

200

12

3800

65

65

39

f= frequência respiratória; VC= volume corrente; freq.card.= frequência cardiaca

Eutanásia

A eutanásia, sacrifício humanitário com o mínimo de dor, medo e angústia, deve estar prevista no protocolo experimental e realizada ao final do experimento. No entanto, a obrigação legal e moral de salvaguardar o bem-estar do animal e minimizar o desconforto deve ser assegurada por sistema de vigilância, isto é, planilhas de registro de alterações clínicas, com escore de dor, para identificação de problemas e determinar o momento que o animal afetado gravemente deverá ser eutanasiado para evitar sofrimento desnecessário, mesmo antes da data prevista. A avalição deverá ser feita baseada na perda de peso, na deterioração do estado clínico, sintomas específicos relacionados à doença induzida. O bem-estar animal é um pré requisito para resultados experimentais mais realísticos, portanto devem ser usados procedimentos que reduzam o sofrimento dos animais e melhore o seu bem estar.

Os agentes da eutanásia, a classificação, modo de ação, rapidez, facilidade de execução, biossegurança, indicação por espécie, eficácia e comentários foram detalhadamente apresentados pela AVMA GUIDELINES ON EUTHANASIA.

Referências Bibliográficas e Literatura Complementar

ARRAS, et al. Optimization of intraperitoneal injection anesthesia in mice: drugs, dosages, adverse effects, and anesthesia depth. Comparative Medicine.v51,p443-456. 2001

DAMY, S.B. et al. Aspectos fundamentais da experimentação animal- aplicações em cirurgia experimental. Ver. Assoc Med Bras., v56,n1, p103-111.2010.

DIEHL et al. A good practice guide to the administration of substances and removal of blood, including routes and volumes. Journal of Applied Toxicology. V21, n1,15-23.2001.

FISH, R.E.; BROWN, M.J.;DANNEMAN,P.J.;KARAS,A.Z. Anesthesia and analgesia in laboratory animals. Elsevier. 1th edition. 1997.

Flecknell, Paul. Laboratory Animal Anaesthesia. 4th Edition. Elsevier. 321p. 2015

HAU, J.; VAN HOOSIER JR, G.L. Handbook of laboratory animal science. CRC PRESS. 2th edition. 2003.

LEARY, S. et al. AVMA Guidelines for the euthanasia of animals: 2013 edition. American Veterinary Medical Association. 2013.

PARASURAMAN,S.; RAVEENDRAN,R.; KESAVAN,R. Blood sample collection in small laboratory animals. Journal of pharmacology and pharmacotherapeutics. V1,n2,p87-93.2010.